Há uma lenda de mercado relacionada ao Super Bowl, a decisão da liga da NFL (Liga de Nacional Futebol Americano). Se um time da Conferência Nacional (NFC) vencer o Super Bowl, o mercado acionário americano irá subir nesse ano. Por outro lado, se um time da Conferência Americana (AFC) vencer, então o mercado será de baixa. Dois times que hoje representam a AFC, mas que eram pertencentes à antiga NFL, contam como representantes da NFC para esse “indicador”, o Pittsburgh Steelers e o Indianapolis Colts (antigo Baltimore Colts).
O Super Bowl desse ano, a ser realizado no dia 1º de Fevereiro, em Tampa Bay, será entre Arizona Cardinals e Pittsburgh Steelers, ou seja, dois times que contam como da NFC e, por consequência, a previsão seria de alta para 2009.
Não faço idéia de quando começou informalmente essa estória. O primeiro escrito que conheço sobre isso data 1989, um artigo de Robert Stovall chamado “The Super Bowl predictor” para o “Financial World”. Outro artigo é o “An examination of the Super Bowl Stock Market Predictor”, escrito por Thomas Krueger e William Kennedy em 1990 para o “Journal of Finance”.
Esse segundo artigo (o primeiro não li) mostra os impressionantes resultados desse indicador (precisão de 91% na época), mostra que esse indicador é estatisticamente significativo e mostra também que o retorno médio dos anos em que um time da NFC vence é positivo e é negativo caso um time da AFC vença. Por fim, os autores fazem uma simulação supondo que um investidor aplicasse no mercado acionário nos anos em que um time da NFC vencesse e aplicasse em renda fixa (taxa média dos commercial papers) caso um time da NFC fosse o campeão. Os resultados eram comparados com uma situação em que o investidor aplicasse no mercado acionário e mantivesse essa carteira. O resultado foi um retorno de 2,74 pontos percentuais acima do retorno da carteira de ações (após impostos) e 2,56 pontos percentuais a mais levando em conta os custos de transação. O risco dessa carteira SB SMP (do título desse post) é bem menor, o que seria de se esperar, já que essa carteira alterna momentos em que fica exposta ao risco com momentos em que fica com risco zero.
Um outro artigo de Thomas Krueger e John Sheppard com quase o mesmo nome do que o anterior, lançado em 2003, (disponível aqui) atualiza os estudos e confirma as conclusões anteriores (só não refez a simulação das duas carteiras).
Eu atualizei até 2008 o resultado do Super Bowl e se o indicador acertou ou não. A precisão do SB SMP está decrescente e hoje está em 73,81%. Parece impressionante, mas o S&P 500 (índice que eu usei, mas os autores usaram outros 4 índices) subiu em 76,19% dos anos (desde 1967, ano do primeiro Super Bowl). Ou seja, o indicador tem um resultado pior do que se o investidor chutasse que em todos os anos a bolsa subiria (o que não ocorria nos dois artigos citados). Sinal que a aparente validade do indicador está com os dias contados. Não refiz os testes estatísticos, mas presumo que os resultados devem apontar para o descrédito do SB SMP.
O que não quer dizer que só agora esse indicador não é confiável. Não me parece sensato se fiar em indicadores não econômicos e que não tenham absolutamente nada a ver com o mercado acionário. E a lista é extensa: astrologia (“se as fases da lua afetam as marés, por que não afetaria o mercado?”), clima, o comprimento da saia das mulheres (quanto mais curtas, mais o mercado sobe, sem segundas intenções), as conversas de churrasco (“se muitas pessoas estiverem falando de mercado, é hora de sair da Bolsa”), a tal estória do pai do John Kennedy e de seu engraxate, a cobertura da imprensa sobre ações (quando estiverem falando muito disso, hora de sair), entre outros indicadores não financeiros. Tirei alguns desses exemplos do livro Investment Fables do Aswath Damodaran. Tiro deste mesmo livro uma conclusão geral para esses “indicadores”: são muito bons para ficar contando estórias em um coquetel, mas podem ser desastrosos para a gestão de carteiras. Não só para isso: vi em muitos recantos da internet pessoas negando a atual crise apontando para o alto trânsito para o litoral, a fila nos restaurantes chiques, os shopping centers cheios e o movimento na rua 25 de Março (centro de comércio popular na cidade de São Paulo, para quem não conhece) como se nada disso fosse normal na época de fim de ano e como se as pessoas ficassem escondidas em casa em épocas de crises econômicas. É possível argumentar ou que o Brasil ainda não sentiu os efeitos da crise ou que os efeitos serão modestos, mas não dessa forma.
Mas e os 77,78% de precisão na data do artigo de 2003? Será só coincidência? Sim, pode ser só coincidência. É o que chamo de viés de data mining (apelidado por um amigo meu de picaretagem de dados): com tantos dados disponíveis e com ferramentas computacionais cada vez mais desenvolvidas, é possível testar um sem número de relações entre variáveis dos mais diversos tipos e o mercado acionário. Desses zilhões de testes, qual não é chance de algum desses resultarem em uma correlação forte, com significância estatística e tudo? A chance é bem grande. Nem por isso o indicador gerado deve ser levado a sério.
O Super Bowl desse ano, a ser realizado no dia 1º de Fevereiro, em Tampa Bay, será entre Arizona Cardinals e Pittsburgh Steelers, ou seja, dois times que contam como da NFC e, por consequência, a previsão seria de alta para 2009.
Não faço idéia de quando começou informalmente essa estória. O primeiro escrito que conheço sobre isso data 1989, um artigo de Robert Stovall chamado “The Super Bowl predictor” para o “Financial World”. Outro artigo é o “An examination of the Super Bowl Stock Market Predictor”, escrito por Thomas Krueger e William Kennedy em 1990 para o “Journal of Finance”.
Esse segundo artigo (o primeiro não li) mostra os impressionantes resultados desse indicador (precisão de 91% na época), mostra que esse indicador é estatisticamente significativo e mostra também que o retorno médio dos anos em que um time da NFC vence é positivo e é negativo caso um time da AFC vença. Por fim, os autores fazem uma simulação supondo que um investidor aplicasse no mercado acionário nos anos em que um time da NFC vencesse e aplicasse em renda fixa (taxa média dos commercial papers) caso um time da NFC fosse o campeão. Os resultados eram comparados com uma situação em que o investidor aplicasse no mercado acionário e mantivesse essa carteira. O resultado foi um retorno de 2,74 pontos percentuais acima do retorno da carteira de ações (após impostos) e 2,56 pontos percentuais a mais levando em conta os custos de transação. O risco dessa carteira SB SMP (do título desse post) é bem menor, o que seria de se esperar, já que essa carteira alterna momentos em que fica exposta ao risco com momentos em que fica com risco zero.
Um outro artigo de Thomas Krueger e John Sheppard com quase o mesmo nome do que o anterior, lançado em 2003, (disponível aqui) atualiza os estudos e confirma as conclusões anteriores (só não refez a simulação das duas carteiras).
Eu atualizei até 2008 o resultado do Super Bowl e se o indicador acertou ou não. A precisão do SB SMP está decrescente e hoje está em 73,81%. Parece impressionante, mas o S&P 500 (índice que eu usei, mas os autores usaram outros 4 índices) subiu em 76,19% dos anos (desde 1967, ano do primeiro Super Bowl). Ou seja, o indicador tem um resultado pior do que se o investidor chutasse que em todos os anos a bolsa subiria (o que não ocorria nos dois artigos citados). Sinal que a aparente validade do indicador está com os dias contados. Não refiz os testes estatísticos, mas presumo que os resultados devem apontar para o descrédito do SB SMP.
O que não quer dizer que só agora esse indicador não é confiável. Não me parece sensato se fiar em indicadores não econômicos e que não tenham absolutamente nada a ver com o mercado acionário. E a lista é extensa: astrologia (“se as fases da lua afetam as marés, por que não afetaria o mercado?”), clima, o comprimento da saia das mulheres (quanto mais curtas, mais o mercado sobe, sem segundas intenções), as conversas de churrasco (“se muitas pessoas estiverem falando de mercado, é hora de sair da Bolsa”), a tal estória do pai do John Kennedy e de seu engraxate, a cobertura da imprensa sobre ações (quando estiverem falando muito disso, hora de sair), entre outros indicadores não financeiros. Tirei alguns desses exemplos do livro Investment Fables do Aswath Damodaran. Tiro deste mesmo livro uma conclusão geral para esses “indicadores”: são muito bons para ficar contando estórias em um coquetel, mas podem ser desastrosos para a gestão de carteiras. Não só para isso: vi em muitos recantos da internet pessoas negando a atual crise apontando para o alto trânsito para o litoral, a fila nos restaurantes chiques, os shopping centers cheios e o movimento na rua 25 de Março (centro de comércio popular na cidade de São Paulo, para quem não conhece) como se nada disso fosse normal na época de fim de ano e como se as pessoas ficassem escondidas em casa em épocas de crises econômicas. É possível argumentar ou que o Brasil ainda não sentiu os efeitos da crise ou que os efeitos serão modestos, mas não dessa forma.
Mas e os 77,78% de precisão na data do artigo de 2003? Será só coincidência? Sim, pode ser só coincidência. É o que chamo de viés de data mining (apelidado por um amigo meu de picaretagem de dados): com tantos dados disponíveis e com ferramentas computacionais cada vez mais desenvolvidas, é possível testar um sem número de relações entre variáveis dos mais diversos tipos e o mercado acionário. Desses zilhões de testes, qual não é chance de algum desses resultarem em uma correlação forte, com significância estatística e tudo? A chance é bem grande. Nem por isso o indicador gerado deve ser levado a sério.
Nenhum comentário:
Postar um comentário