sábado, 27 de março de 2010

Produtos verdes fazem as pessoas melhores?

(Do green products make us better people?)
Nina Mazar e Chen-Bo Zhong
Psychological Science Vol. 21 Noº. 3

As pessoas, na hora de tomarem decisões sobre consumo, não levam em conta apenas preço e qualidade. Ponto (em termos, como argumentarei no final). As pessoas, de uma forma geral, estão se preocupando mais com o impacto ambiental e social dos produtos que consume. Ponto (a maior preocupação é facilmente sentida). O fato de consumir produtos ambiental-social-humana-animalmente responsáveis tornam as pessoas responsáveis. Intuitivamente sim, mas esse artigo põe em dúvida esse último elo.

Os pesquisadores procuraram determinar o impacto da exposição a produtos “verdes” e o consumo desses produtos no comportamento das pessoas. Outros estudos mostram que a exposição a algo que sugira um comportamento (etiqueta, lealdade, criatividade etc.) acaba por induzir as pessoas a um comportamento semelhante, e o mesmo pode acontecer com a exposição a produtos verdes. Porém, a questão pode ser mais complicada se a pessoa deve demonstrar um determinado comportamento e, em seguida, mantém-se coerente com isso (ou seja, agir altruisticamente e continuar agindo assim). Dessa forma, a previsão acerca do altruísmo no consumo verde pode não se concretizar.

O artigo apresenta diversos experimentos. O primeiro é sobre a percepção de altruísmo e comportamento ético de pessoas desconhecidas, 59 estudantes voluntários (ou “voluntários”) que foram separados aleatoriamente em “consumidores conscientes” e “consumidores inconscientes” (perdoe-me o trocadilho). Os consumidores conscientes forma considerados mais cooperativos, mais altruístas e mais éticos do que os do outro grupo, sendo que foram sorteados aleatoriamente de um mesmo grupo. Ou seja, pessoas vêem como moralmente superiores os consumidores conscientes, o que pode levar ao consumo de produtos éticos e conseqüente comportamento ético. A verificar.

O experimento 2 procurou determinar se a exposição a produtos éticos leva a um comportamento ético. 156 estudantes participaram desse estudo, sendo separados em quatro grupos divididos por lojas (verde ou convencional) e ação (mera exposição ou compra). Primeiro os estudantes eram expostos a um tipo de loja virtual e em seguida o grupo de mera exposição avaliava os produtos (ação irrelevante para o estudo) e o grupo de compra comprava produtos da loja (ação também irrelevante em si). Em seguida, os mesmos participantes jogavam um jogo do ditador, etapa importantíssima do estudo. Constatou-se que o grupo que foi exposto aos produtos verdes (mas não comprou) foi mais generoso no jogo, porém, o grupo que comprou produtos verdes mostrou-se menos generoso. Consumo de produtos verdes faz com que as pessoas sejam vistas de forma mais positiva e a exposição a tais produtos faz as pessoas serem mais altruístas, porém, parece que o consumo em si torna as pessoas menos altruístas. Algo a ser verificado no último teste.

O terceiro experimento envolveu 90 estudantes. Na primeira etapa, os estudantes puderam escolher entre comprar da loja “verde” ou da loja “sombria” (perdoe-me o trocadilho de novo). Em seguida, os estudantes participaram de um jogo de percepção visual. Um padrão de pontos aparece em uma tela e os participantes deveriam dizer se havia mais pontos à esquerda ou à direita e receberiam 0,5 ¢ (meio centavo canadense) por cada vez que dissessem que havia mais pontos à esquerda e 5¢ (5 centavos canadenses) para cada vez que dissessem que havia mais pontos à direita, independente de acertar ou errar. Os padrões eram de tal forma que era difícil errar sobre qual lado tinha mais pontos. Para todos, havia mais pontos à direita em 36 do casos (40%), o que faz uma remuneração de C$2,07 para quem respondesse tudo da forma apropriada. Os participantes que compraram da loja convencional disseram que 42,50% das vezes havia mais pontos à direita, média não indistinguível da verdadeira média (40%). Por outro lado, os que compraram da loja verde indicaram mais pontos à direita em 51,4% das ocasiões. No fim, os que compraram na loja verde levaram mais C$ 0,36 do que os demais.

Ainda nesse experimento, os próprios participantes pegavam o dinheiro a que tinham direito de um envelope contendo C$ 5,00. Ou seja, além de mentir no teste, os participantes poderiam roubar pegando mais do que deveriam. Os que consumiram na loja verde roubaram C$ 0,48 mais do que os demais, levando para casa mais C$ 0,83 (sem arredondar os cálculos intermediários) do que os outros levaram.

A explicação dada por esse último resultado é que as pessoas julgam ter provado suficientemente suas boas intenções nas decisões de consumo e se dão o direito de agir de maneira menos ética nas decisões subseqüentes. Ou seja, boas ações parecem dar licença a más ações futuras.

Na opinião de quem não estudou muito a fundo essa questão (a minha opinião), os produtos verdes só serão realmente economicamente viáveis quando ou custarem menos, ou serem de melhor qualidade ou uma combinação dos dois. Como indicado (mas não provado, já que alguns experimentos não podem provar categoricamente coisa alguma) exigir do consumidor um sacrifício para adotar um consumo verde por isso ter uma implicação social positiva (ser melhor visto) pode levar a comportamentos não desejados e não previstos. Para quem os produtos verdes não são um sacrifício (mesmo que mais caros, de melhor qualidade ou, mesmo de pior qualidade, com um preço que compensa, ou mesmo que piores e mais caros, há a qualidade intrínseca de se fazer algo de bom), já há a situação desejável descrita no primeiro parágrafo. O que precisa é aumentar o número de pessoas que sentem (sinceramente) o mesmo.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Não nascemos avessos a risco

(Risk-seeking behavior of preschool children in a gambling task)
(o título do post certamente não pretendia ser uma tradução)
Bruno Moreira, Raul Matsushita e Sergio da Silva
Journal of Economic Psychology. Volume 31. 2010

O ponto de partida mais comum para a análise da tomada de decisão das pessoas supõe aversão a risco, ou seja, tendo que escolher entre duas alternativas de mesmo valor esperado, escolhe-se a alternativa de menor risco e exige-se uma recompensa maior para escolher a alternativa de maior risco. (Não vou tratar agora de teorias alternativas a essa).

Esse artigo de três pesquisadores brasileiros analisa o comportamento de crianças de quatro a seis anos em relação ao risco. A razão de escolher essa idade é que as crianças já possuem alguma independência em relação aos pais (diferente de um recém nascido), já são capazes de lidar com contas e possuem pouca experiência, de forma que não devem ter tomado muitas decisões sujeitas a risco, por mais triviais que sejam. Outras variáveis como gênero, comportamento (analisado pelos professores dos alunos) e a proporção do dedo indicador em relação ao anular (2D:4D ratio) que, segundo estudos, influenciam uma série de comportamentos.

Foram selecionadas 100 crianças que foram submetidas a um experimento em duas etapas. O experimento consiste em oferecer um copo meio cheio de suco ou a possibilidade de receber um copo cheio ou um copo vazio com iguais chances. Pelo exposto no primeiro parágrafo, a escolha deveria ser pelo copo meio cheio recebido sem risco, já que o valor esperado da opção com risco é o mesmo (Copo cheio com 50% de chance ou copo vazio com 50% de chance equivale a um copo meio cheio), mas o risco da primeira opção é menor. A segunda etapa é idêntica, mas espera-se que os resultados mudem para incorporar o efeito do aprendizado no processo.

A metodologia do estudo utilizou a regressão logística para separar o efeito das variáveis na probabilidade da criança escolher a alternativa de risco na segunda etapa. Por conta disso, será dito “chance de” para se referir aos resultados, e não algo como “20% das crianças escolheram a alternativa de risco”. As evidências mostraram que as crianças que tiveram uma experiência negativa (ou seja, copo vazio) mostraram uma chance de apenas 22% de escolherem a alternativa arriscada, enquanto que a chance para as crianças que tiveram uma experiência positiva era de 95%. Ou seja, nota-se um certo aprendizado que muda a relação com o risco. Analisando o comportamento, há a chance de 33% das crianças consideradas calmas independente da experiência anterior escolherem a alternativa de risco nas duas etapas. Diferenças nas proporções dos dedos influenciaram as decisões na primeira etapa, mas não influenciaram os resultados da segunda etapa. Ou seja, crianças com menor relação 2D:4D (ou seja, com anulares maiores em comparação com o indicador) não apresentaram maior chance de escolher a alternativa de maior risco só por conta dessa variável. Mulheres são mais avessas a risco do que homens e meninas também são mais avessas a risco do que meninos, como o estudo constatou.

A conclusão do artigo é que não nascemos avessos a risco, mas aprendemos a ser avessos a risco com más experiências. O mesmo talvez possa ser aplicado para investidores, com os investidores menos experientes demonstrando comportamento de busca a risco e investidores mais experientes (existem artigos que examinam isso, mas ainda não os li). Se for assim, o mais recomendável para os investidores é se deparar com o copo vazio o quanto antes, para diminuir possíveis prejuízos futuros.

quinta-feira, 18 de março de 2010

O Lado Luminoso da teoria

Quatro livros e um artigo sobre a bolha ponto com.

Como a picaretagem conquistou Wall Street
Antes de tratar do lado luminoso, tratarei um pouco do lado sombrio da teoria, também, lado sombrio da prática. Francis Wheen em seu Como a picaretagem conquistou o mundo (How mumbo-jumbo conquered the world) dedicou algumas páginas para a bolha no último capítulo.

A euforia com as empresas de tecnologia tinham como um dos impulsionadores algumas idéias sobre economia que se mostraram erradas. Os comentários do artigo e dos livros abaixo são correções desses erros e começarão com uma citação tirada do livro de Wheen. Às vezes, os comentários revolucionários com as novas tecnologias eram frutos da euforia e da ignorância. Mas, em alguns casos, os comentaristas estavam fazendo comentários desonestos, como o caso de um analista de uma corretora de valores que classificava em particular as empresas que elogiava em público como “papéis sem valor”, “uma porcaria”, “uma b...”. Esse analista foi investigado e processado por Elliot Spitzer, o mesmo Spitzer que viria a ser governador de Nova York e posteriormente renunciaria ao cargo por conta de um escândalo sexual.

O livro ainda relata como essa euforia tomou conta da imprensa que passou a fazer o papel de mídia propriamente dito (há um pouco disso ainda hoje). A Fortune que e 1996 havia questionado sobre se não havia uma loucura no mercado, deparando-se com uma alta no mercado persistente, passou a ser menos questionadora. Tal como ocorreu com a bolha imobiliária, as vozes dissidentes eram tratadas como catastrofistas e antipáticas.

Economia da Estratégia (vulgo Besanko, escrito por David Besanko, David Dranove, Mark Shanley e Scott Schaefer)

“Ao contrário de outras bolhas famosas, a bolha da Internet flutua sobre alicerces sólidos como a rocha, talvez mais sólidos do que qualquer outro já visto pelo mercado. Por baixo das elevações enlouquecidas dos preços encontram-se os alicerces daquelas que podem vir a ser as empresas de maior crescimento do século XXI”. Pg 290

Esse livro trata dos princípios econômicos gerais que explicam o sucesso e o fracasso das empresas. Não é um guia de “como gerenciar” feito para ser de fácil digestão e de simples aplicação. É um livro que mostra como enxergar as atividades das empresas em termos de princípios gerais (economias de escala, de escopo, diferenciação, redução de custos etc.) que são utilizados para analisar qualquer empresa, em qualquer período de tempo e que continuarão a fazê-lo até que novas teorias melhores surjam (o que não ocorreu com as empresas de tecnologia). Na terceira edição, pós-estouro da bolha, não é sem satisfação que os autores tripudiam dos anúncios do advento de nova era feito pelos entusiastas da nova economia, das declarações de que “as regras haviam mudado”. Do prefácio da terceira edição, pós-bolha: “Agora sabemos que as regras não se alteraram em sua essência, e aqueles que pensaram ao contrário sofreram quase sempre consideráveis perdas”, indicando que a nova economia segue as mesmas regras da velha economia.

Estratégia e Internet (Michael Porter)
“Não se tratava de saber se aquilo tinha um bom modelo de negócios, mas de poder ou não passá-lo adiante para um bobo maior, negociando as ações”. Pg 288-289

Autor conceituado de estratégia competitiva, Porter comenta sobre a crença que se criou que a Internet tornou desnecessária a estratégia, argumentando justamente o oposto, que a estratégia é essencial como nunca antes.

Nesse artigo, o autor afirma que as empresas de internet não criavam valor. Receitas, custos e o próprio valor de mercado das empresas não eram sinais confiáveis de prosperidade. E a necessidade de criar novos indicadores de sucesso das empresas – número total de visitas, número de visitas únicas ou número de cliques – apenas indicava que as empresas não estavam criando valor.

A principal tese desse artigo é que as novas empresas podem ser analisadas utilizando antigas ferramentas como as que ele próprio criou – ou seja, análise da indústria, de vantagens competitivas e de cadeia de valor. O autor passa então a examinar pelas lentes dessas teorias bem estabelecidas o efeito da internet na competição entre as empresas, mostrando que não é necessário reinventar a teoria.

Dark Side of Valuation (Aswath Damodaran)
“Toda ela [a Internet] introduziu um admirável mundo novo de metodologias de avaliação, e este é um momento de riscos e retornos [correção minha] especialmente altos a nosso ver” Pg 287

A idéia desse livro é que muitos analistas que se viram incapazes de compreender essa nova economia e, conseqüentemente, analisar as empresas foram “seduzidos” pelo lado sombrio da avaliação e passaram a recorrer a simplificações rasteiras e à criação de novos indicadores em nada relacionados com lucros e muito menos com fluxos de caixa. Um parêntese: a tradução do título da versão brasileira é errônea: o dark side a que se refere o título é o da série Star Wars, não ao dark side of the moon, face oculta da lua (a consulta ao site do livro deixa isso ainda mais explícito).

Porém, não é necessário recorrer ao lado escuro da força para avaliar empresas: as antigas técnicas continuam sendo perfeitamente válidas. O valor da empresa continua vindo dos fluxos de caixa que essa empresa gerará, não no número de visitas que gera/irá gerar. Os princípios econômicos expostos por Besanko e seus colegas e os modelos básicos de avaliação continuam válidos, só que a evolução da tecnologia e da economia impõem constantemente novos desafios práticos e teóricos e recorrer ao “mudança de paradigmas” não é a melhor solução.

Para terminar, outras frases curiosas tiradas do livro de Wheen:
“Temos uma resposta geral para a palavra “valorização” hoje em dia: mercado em alta” Pg. 287

“Se elas cumprirem o prometido, as valorizações se arranjarão sozinhas” Pg 287

“Os preços elevadíssimos de hoje provavelmente se justificarão para muitas empresas, a longo prazo” Pg. 289

“O simples fato de o fenômeno das ações da Internet parecer uma bolha não é uma indicação certeira de que a bolha irá estourar” Pg 290

sexta-feira, 12 de março de 2010

Bolha pontocom: 10 anos

Introdução
Em 10 de março de 2000, o índice Nasdaq Composite das empresas de tecnologia marcou 5.132,52 pontos, seu atual topo histórico. Esse é o marco didático do estouro da bolha ponto com, período no qual as empresas do setor de tecnologia (o que inclui, mas não se restringe a empresas de internet) viviam uma efeverscência que levou o Nasdaq Composite a uma alta rápida e elevada, seguida de uma fulminante queda. Escrevi mais sobre isso em detalhes em outro lugar.

Este texto irá tratar de como essa bolha operou, citando alguns casos exemplares. Uma das características desse momento do mercado foi a crença de que “as regras haviam mudado”. Um texto futuro analisará alguns livros e artigos escritos durante ou após a bolha que afirmavam (corretamente) o contrário, que as regras não haviam mudado. Um outro texto (que talvez não seja escrito) poderá tratar de algumas discussões sobre a bolha, quais os fundamentos que a sustentaram (ou supostamente o fariam) e sobre o que pode ter contribuído para inflar essa bolha. No fim, algumas conclusões em cima desses textos.

Caracterização, início e estatísticas da bolha ponto com

Entende-se como a bolha tecnológica o período no qual as ações de tecnologias listadas na Nasdaq atingiram níveis irreais, muito além da capacidade de geração de resultados futuros. Uma das características desse período foi o mercado “ultra quente” de ofertas iniciais dessas empresas, recém criadas a partir de não mais do que uma vaga idéia que passaram a valer milhões (até bilhões) assim que estreavam na bolsa de valores.

É necessário definir incialmente quando exatamente a bolha das ponto com começou. DeLong e Magin (2006) trataram dessa questão. A IPO da Netscape em Março de 1995 teve as características peculiares da bolha, subindo 108% no primeiro dia, e houve ainda o discurso de Alan Greenspan sugerindo (não afirmando) a existência de uma “exuberância irracional”, porém, esses anos devem ser excluídos da bolha. A IPO da Netscape não foi um evento seguido de muitos outros com resultados tão explosivos. Se alguém tivesse investido no Nasdaq Composite em 1995 ou em 1996 teria ainda hoje um retorno positivo (porém, muitíssimo menor do que era o retorno em 2000). Assim, os autores preferem restringir o período de vida da bolha ponto com a um período menor entre 1999 e final de Março de 2000.

Segundo dados de Jay Ritter, foram 421 ofertas de empresas de internet entre 16/02/1990 e 10/03/2000, sendo 323 entre 1999 e 10/03/2000. Em 1999 e no primeiro trimestre de 2000, 163 ações dobraram de preço no primeiro dia de negociações; para quem gosta de IPO, esse número mostra que as ofertas no Brasil são bem pouco lucrativas no primeiro dia comparado com as ofertas americanas (após 2000, ainda três ofertas dobraram de preço no primeiro dia nos Estados Unidos); para quem não gosta (a turma da “bolha das IPOs brasileiras”) perceba que a valorização no primeiro dia é bem tímida no Brasil. As médias das valorizações no primeiro dia nas ofertas feitas nos Estados Unidos de empresas de tecnologia em 2000 e 2001 foram 57% e 45,6% (ponderado por valor de emissão).

Casos

Cisco Systems
A Cisco Systems, um dos ícones desse período, chegou a ser a maior empresa de capital aberto dos Estados Unidos. Em 27 de Março de 2000, a Cisco ultrapassou pela primeira vez a Microsoft (empresa pré bolha) com US$ 555 bilhões em valor de mercado e P/L de 222,4. Hoje, a empresa vale por volta de US$ 149 bilhões e P/L de 25 e faz parte do Dow Jones Industrial Average.

AOL
Em Janeiro de 2000, a AOL protagonizou o que deveria ser o ápice do sucesso das empresas de tecnologia, a fusão com a Time Warner por um valor de US$ 166 bilhões (em ações). Seria a dominação da nova economia sobre a velha economia. Porém, com o tempo, a velha economia retomou a dominação dentro da AOL Time Warner, com a Time Warner gerando resultados e a AOL gerando prejuízos colossais. A AOL Time Warner passou a ser novamente Time Warner e no ano passado, a empresa fez o spin-off da AOL que passou a ser listada como uma empresa separada.

Amazon
Contrário às duas demais empresas, a Amazon está melhor hoje do que no período da bolha. Seu valor de mercado estava em US$ 23 bilhões em 10/03/10 e hoje está por volta de US$ 59 bilhões. A empresa só foi ter seu primeiro lucro trimestral no quarto trimestre de 2002 e anual em 2003. O P/L de 2003 ao preço do final de 2003 estava acima de 600 e hoje por volta de 65, sendo que o valor de mercado triplicou de lá para cá. Pode-se, apressadamente concluir que as perspectivas para a Amazon eram razoáveis no final do século passado, embora não se possa dizer o mesmo do restante. (e não analisarei agora mais do que isso).

Comentários de O investidor inteligente
Na minha resenha do O investidor inteligente, não tratei dos comentários de Jason Zwig. O primeiro motivo é espaço. O segundo é que, apesar dos comentários serem pertinentes, sempre me desagradou a “voz” desse comentarista nesse livro. Porém, agora esses comentários serão muito úteis.

O comentarista tratou da VA Linux no capítulo 6, uma empresa que chegou a valer quase US$ 13 bilhões e três anos depois virou pó. Trajetória semelhante teve a eToys, analisada no comentário do capítulo 17. Os comentários dos capítulos 17 e 18 analisam diversos outros casos, incluindo Lucent, Yahoo e Cisco. O caso mais curioso (também analisado por DeLong e Magin) foi o da 3Com e da Palm, a primeira sendo dona da segunda. Ao preço da ação da Palm, o valor da participação da 3Com na empresa superava sozinha o seu valor de mercado, fazendo com que o restante da 3Com devesse ter valor negativo, o que não faz sentido algum.

Fontes:
Economática
Google Finance

segunda-feira, 8 de março de 2010

Gerenciando para stakeholders

(Managing for stakeholders, stakeholder utility, and competitive advantage)
Jefferey Harrison, Douglas Bosse e Robert Phillips
Strategic Management Journal. Vo. 31. Ed. 1. 2010

Esse texto tem ideias semelhantes às expostas em um artigo anterior aqui comentado. Mas ao invés de procurar definir o objetivo da empresa focado no cliente, procura definir como algo mais amplo, gerenciar para stakeholders. A tese central do artigo é a de que uma empresa gerenciando para stakeholders investe mais no relacionamento com os stakeholders do que o mínimo necessário para garantir a participação voluntária. Investimento, nesse caso, significa transferência de valor (dinheiro) e de poder de decisão. Isso cria uma relação de confiança com, por exemplo, funcionários e clientes e isso cria oportunidades de criação de valor. O sentido da palavra valor é no sentido exposto anteriormente. Para diferenciar esse sentido do sentido de valor da empresa, o segundo conceito, neste texto, será escrito de forma mais explícita (valor da empresa, valor ao acionista etc.).

Essa maior confiança resulta em maior valor ao permitir que os stakeholders transfiram informações para a empresa sobre suas preferências (suas funções utilidade), o que pode gerar três resultados:

Aumentar a demanda e a eficiência
Aumentar a inovação
Aumentar a habilidade em lidar com mudanças inesperadas no ambiente.

Melhores relacionamentos com stakeholders gerariam vantagens competitivas nessas áreas, o que levaria a maior criação de valor. Uma reputação de confiável, um histórico de distribuição “justa” de valor e uma história de influência dos stakeholders na empresa levariam a essas vantagens competitivas que tenderiam a ser sustentáveis se mantidas essas características. Essas vantagens podem ser sustentáveis já que, para imitá-las, as concorrentes precisariam ter a mesma atitude, tarefa nada trivial.

Os autores não escrevem isso, mas é evidente que todos esses resultados esperados estão em concordância com o objetivo de maximizar valor da empresa. A exemplo do artigo sobre satisfação do cliente, confunde-se estratégia com objetivo. O parágrafo inicial é a descrição de uma estratégia, um conjunto de ações para se alcançar um objetivo. Uma estratégia alternativa seria de oferecer o mínimo de valor para os stakeholders de forma a reter a sua participação voluntária. Adotando a primeira estratégia, definir o quanto investir em relacionamento com stakeholders depende do objetivo da empresa. A estratégia mais desejável, dentro do objetivo de maximizar o valor da empresa, é a que gera mais valor e o que os autores dizem (com propriedade) é que a primeira estratégia pode obter esse resultado.

Um problema em comum com o artigo da satisfação do cliente é atribuir ao objetivo de maximizar o valor da empresa um caráter de curto prazo. Como já escrevi anteriormente, não há essa associação. Pode haver por problemas gerenciais (medo de demissão por parte do presidente, pacotes de remuneração que incentivem resultados de curto prazo etc.), mas essa é uma outra questão. Esse artigo também não lida com a questão de como mensurar se o novo objetivo sugerido está sendo bem gerenciado ou não, apesar dos autores demonstrarem preocupação com isso. Gerenciar significa lidar com decisões que envolvem interesses conflitantes entre os stakeholders e entre stakeholders e os acionistas, e os autores não fornecem um critério para definir como mediar esses conflitos. Os autores sugerem três indicadores de desempenho, crescimento, eficiência e inovação (como se fossem contrários ao valor ao acionista), mas obviamente que não é possível maximizar esses três indicadores. A questão continua mal resolvida.

Há também o erro mais comum, o de considerar o proprietário (acionista) como apenas mais uma parte interessada da posse (a empresa). Isso leva, na prática, à consideração do acionista como um stakeholder do administrador (seria “stakeholder da empresa”, mas o que significa essa expressão senão o sentido que eu lhe atribui?). Nos textos anteriores eu já tratei disso e não vou me repetir. Só digo que essa não é uma questão menor: do jeito que as coisas são colocadas, parece que o principal (acionista) serve ao agente (administrador), fato escondido na expressão indefinida “empresa”. Essa é uma posição extremamente conveniente (para os administradores) que ganham um poder sobre a propriedade alheia que não teriam de outra forma. Além do mais, o texto pede clareza com essa confusão. O que exatamente significa se perguntar “whether firms are better off if they provide the same sort of treatment to all of their primary stakeholders”? Uma empresa não tem interesses próprios que definam o que é melhor ou pior para ela, de forma que esse trecho perde muito em clareza e de significado,

Como no caso do artigo da satisfação do cliente, há conclusões boas a serem tiradas, apesar dos problemas citados. Gerenciar para os stakeholders não deve ser entendido como objetivo, assim me parece, mas como uma estratégia, assim como gerenciar para a satisfação dos clientes. As escolhas que a gerência tomará devem objetivar/tomar como critério criar valor para o acionista (o que, como dito, implica, necessariamente, um pensamento de longo prazo), e aumentar o investimento em relacionamento com stakeholders, como se diz no artigo, além do ponto que se atinge para manter a participação voluntária desses stakeholders, é uma estratégia que pode criar valor. A gerência deveria aumentar o investimento em cada stakeholder até o ponto em que uma unidade adicional de investimento deixa de criar uma unidade adicional de valor da empresa. Perceba que os resultados esperados pelos autores em aumento de relacionamento com stakeholders, aumentar a demanda e eficiência, aumentar a inovação e aumentar a habilidade em lidar com mudanças inesperadas não são desejáveis por serem belas e sublimes, mas por adicionar valor à empresa, além de gerar valor social.

terça-feira, 2 de março de 2010

Valorização da Telebrás

Muito se tem falado da valorização de mais de 3.000% da Telebrás. Entre tantos comentários, o de que isso se deve à especulação e que a empresa nada produz para justificar essa valorização.

O primeiro comentário, comumente acompanhado de adjetivos (obscena, escandalosa etc.) é um tanto vago. Primeiro: precisa saber o que se entende por especulação. Segundo: perguntar se a especulação não faz qualquer ação subir. Mas o mais importante é o segundo comentário.

A lição mais básica de avaliação de empresas é que o valor está em função das expectativas futuras. As perspectivas para a Telebrás há cinco anos atrás eram nulas, a empresa nada produzia (situação que persiste ainda hoje) e estava apenas a espera de ser encerrada. Por isso, valia R$ 0,09. A perspectiva hoje é de que no futuro venha a ter receitas por conta do Plano Nacional da Banda Larga, havendo a incerteza de se esse plano irá sair e qual será o resultado para a Telebrás. Não posso dizer se o preço de hoje está correto, mas certamente vale várias vezes mais do que valia no passado. Por isso, essa valorização de mais de 3.000% tem fundamentos, como gostam de dizer.

O que pode não estar muito bem explicado são os meios que levaram a tal valorização. Existem várias questões nebulosas nessa história: acusações de favorecimentos privados, de vazamento de informações, se o governo deveria investir em banda larga e, em devendo, se caberia à Telebrás fazer isso ou se seria mais eficiente contratar as operadoras que já estão operando. Se a resolução dessas questões levasse ao fim do plano ou à exclusão da Telebrás, o valor da empresa iria para mais próximo de R$ 0,09 do que de R$ 3,00. Mas, havendo tal plano com participação da Telebrás, a valorização é justificada.

Mensais: Índices Internacionais (Fev/10)

Maiores altas (mês)
Bangladesh: 18,33%
Ucrânia: 11,21%
Indonésia: 10,95%
Quênia: 9,78%
Tunísia: 8,84%

Ibovespa: 37º lugar (maior alta – maior baixa)
Altas 51/98

Maiores altas (ano)
Letônia: 28,78%
Ucrânia: 23,06%
Bangladesh: 22,60%
Mongólia: 21,74%
Lituânia: 15,27%

Ibovespa: 66ª (maior alta – maior baixa)
Altas: 79/98

Maiores altas (12 meses)
Ucrânia: 233,38%
Romênia: 180,57%
Cazaquistão: 178,80%
Rússia: 155,29%
Sri Lanka: 124,77%

Ibovespa: 8º (Maior Alta – Maior Baixa)
Altas: 43/97

Maiores altas (Dez/04)
Mongólia: 639,36%
Malawi: 468,46%
Bangladesh: 234,29%
Tunísia: 191,22%
Peru: 191,17%

Ibovespa: 14ª maior alta
Altas: 49/90

Maiores baixas (mês)
Emirados Árabes: -11,84%
Estônia: -11,07%
Eslováquia: -9,30%
Turquia: -9,05%
Bermudas: -7,96%

Maiores baixas (ano)
Espanha: -13,49%
Grécia: -12,89%
Eslováquia: -12,72%
Chipre: -12,49%
Emirados Árabes: -11,68%

Maiores baixas (12 meses)
Bermudas: -32,25%
Eslováquia: -29,79%
Nepal: -28,39%
Moldava: -13,91%
Costa Rica: -12,98%

Maiores baixas (5 anos)
Islândia: -89,58%
Emirados Árabes: -78,13%
Irlanda: -60,98%
Letônia: -54,30%
Palestina: -53,47%

Maiores sequências:
Altas: Moldava e Paquistão (4 meses)
Baixas: Ilhas Fiji (68)

Desvio-padrão (mensal)
S&P 500: 4,56%
Brasil: 7,25%
Rússia: 11,35%
Índia: 8,62%
China: 10,52%

Países da moda (seguindo expressão consagrada por um professor meu)
Algumas estatísticas sobre as bolsas de alguns países que estão aparecendo muito na imprensa:

País; Retorno 5 anos; Retorno 2010; Retorno mês; Desvio-padrão 60 meses
Portugal; -12,29%; -10,69%; -4,64%; 5,70%
Irlanda; -60,98%; -3,41%; -3,45%; 7,15%
Grécia; -47,70%; -12,89%; -6,73%; N/D
Espanha; -7,09%; -13,49%; -5,82%; 5,37%
Chile; 94,83%; 6,87%; 0,49%; 4,77%

Datas importantes e/ou curiosas
10/03: 67 anos do Bradesco
10/03: 10 anos do topo do Nasdaq Composite que marca o estouro da bolha ponto com
21/03: 75 anos da Drogasil
28/03: 50 anos da Coelba
30/03: 10 anos da Bradespar
30/03: 75 anos da Cremer