Desempenho de fundos

Nessa seção, vou resumir todas as discussões a respeito do desempenho de fundos de investimento de uma maneira organizada e unificada. Ao invés de consultar vários textos sobre o assunto, essa página terá tudo que já escrevi sobre o tema. Alguns dos segmentos abaixo é mera cópia do texto original, com algumas adaptações necessárias.

Introdução

A análise de desempenho de fundos é um subproduto das teorias sobre retornos de ativos e da discussão de mercados eficientes. O primeiro conjunto de teorias criou o referencial necessário para podermos examinar os retornos de uma maneira mais rigorosa. Ao longo do tempo, aprendemos que não basta olhar os retornos brutos e que devemos considerar o risco do investimento e o retorno de aplicações alternativas. O desenvolvimento de modelos de precificação de ativos permitiram controlar os retornos pelo nível de retorno e com o tempo os economistas imaginariam que isso poderia ser aplicado a uma carteira de ativos. A hipótese de mercados eficientes, outro subproduto da teoria de retorno de ativos, gerou o questionamento sobre se os gestores de fundos são capazes de obter retornos superiores.

Desempenho de fundos e CAPM

Em 1968, Michael Jensen publicaria o principal trabalho a respeito de desempenho de fundos com base nos modelos de precificação de ativos (Jensen (1968)). No começo do artigo, anunciaria que a análise era difícil no passado pela falta de um modelo que trabalhasse com a relação entre o risco e o retorno, o que seria resolvido com o advento do CAPM poucos anos antes. Segundo Jensen, trabalhos anteriores buscavam determinar o desempenho de um fundo em relação a outro, mas o que era necessário é a análise do retorno absoluto.

Jensen partiria do CAPM, mas não seria uma abordagem sem uma dose de originalidade. A medida do desempenho relevante seria o alfa da regressão do CAPM, que depois seria conhecido como Alfa de Jensen. Analisando 115 fundos entre 1945 e 1964, Jensen encontrou um alfa médio de -1,1% a.a., com 76 fundos com alfa negativo e 39 positivo sem considerar a significância estatística. Se formos considerar a significância estatística, apenas 3 fundos mostraram alfa positivo, quando seria de se esperar que entre 5 e 6 fundos mostrassem alfa significativamente positivo pelo acaso.

A conclusão de Jensen é que não há evidências de habilidades de seleção de ativos por parte dos gestores de fundos nem na média nem individualmente.

Contra-argumento de Ippolito

Mais de duas décadas após o trabalho de Jensen, Ippolito (1989) replicaria a análise de Jensen para o período 1965-1984, com resultados diferentes. Dos 143 fundos analisados e utilizando retornos líquidos de despesas (exceto taxa de carregamento), os alfas foram nulos para 127, positivos para 12 e negativos apenas para 4 (levando-se em conta a significância estatística), com alfa médio de +0,81. Há mais fundos com alfa positivo do que deveria ter por mera chance (que seriam 7 ou 8) e o alfa médio agora é positivo (0,81), indicando que os gestores teriam habilidades de seleção na média.

Retomando ideias de Grossman e Stiglitz (1980), o autor analisou se fundos mais caros (com taxas de carregamento, de administração e despesas maiores) e que giram mais a carteira obtém retornos superiores (ajustados pelo risco), o que deveria ocorrer se Grossman e Stiglitz estiverem certos. Isso é testado por meio de uma regressão linear com uma equação parecida com a do alfa de Jensen, sem o alfa e com variáveis para estudar cada uma das variáveis mencionadas no começo do parágrafo. O efeito das despesas e do giro no retorno em excesso é nulo, o que acaba indicando que os gestores dos fundos conseguem retornos que pelo menos compensam os custos do fundo e que o giro da carteira pode não melhorar o desempenho, mas também não piora. O único fator que teve um efeito positivo nos retornos foi a taxa de carregamento que, pelas contas do autor, são compensadas por maiores retornos no período de 5 ou 6 anos. Isso corroboraria a visão de Grossman e Stiglitz sobre eficiência de mercado ao mostrar que o custo de se obter informações é compensado por retornos superiores de forma que ao menos compensem os custos.

Análise multifatores

Porém, na discussão sobre mercados eficientes, há a questão da hipótese conjunta entre o modelo de precificação de ativos e a eficiência de mercado. Então, pode ser que os gestores realmente consigam retornos superiores, ou que o modelo de análise utilizado estava errado.

Elton et. al. (1993) reexaminaria os resultados obtidos por Hipólito, fazendo correções que achavam necessárias.  O principal erro foi não considerar o efeito de ações que não fazem parte do S&P 500 ou títulos de renda fixa. Se a comparação for feita com o S&P 500, um fundo poderia obter retornos superiores investindo em ações que não fazem parte do índice, empresas de menor tamanho em geral, sem ter nenhuma habilidade superior. O risco dessas outras ações não seria captado pela regressão com o S&P 500, dando a entender que a relação risco-retorno foi boa. Analisando todas as ações listadas na NYSE (com a base de dados CRSP), dividindo por tamanho, as ações de empresas menores teriam retorno maior no período 1965-1984. Ou seja, mesmo sem qualquer habilidade superior de seleção de ações, alguém que só investisse em ações de pequeno porte ou que não fizessem parte do S&P 500 teria um desempenho superior nesse período. Como o objetivo é analisar as habilidades superiores dos gestores por meio do alfa, fica claro ser necessário um ajuste para ativos que não fazem parte do S&P 500.

Para resolver esse problema, os autores fizeram um modelo de três índices. A análise é feita imaginando que um fundo é como se fosse composto por três carteiras: uma composta por ações do S&P 500, outra por ações fora desse índice e uma terceira com títulos de renda fixa. Cada “subcarteira” é comparada com o índice passivo relevante por meio de análises de regressões múltiplas. Se o fundo tem desempenho superior, o alfa da regressão deve ser positivo (e estatisticamente significativo). O índice para ações do S&P 500 é o próprio índice, para as outras ações são utilizados dois índices (índice de small-caps e índice com todas as ações da NYSE menos as que estão no S&P 500) e para renda fixa foi utilizado um índice composto por 80% de títulos governamentais e 20% de títulos corporativos de longo-prazo (deveria ter sido utilizado o índice Shearson Lehman, porém, o histórico não cobria anos anteriores a 1973).

A análise de 143 fundos nos Estados Unidos mostrou que o alfa médio é negativo e que por volta de 2/3 dos fundos possui alfa negativo (-0,88%), havendo apenas um fundo com alfa positivo ao nível de significância de 5%. Fazendo separações em termos do Beta em relação ao S&P 500, pela porcentagem de ações na carteira e por estilos, o alfa negativo persiste em todas essas classificações.

Separando os fundos pelos graus de despesas e de giro das carteiras, e usando o mesmo modelo, o alfa médio não só é negativo como é mais negativo para os fundos que mais giram e têm maiores despesas. Ou seja, os resultados não indicam tal recompensa pela busca por informação prevista por Grossman e Stiglitz. Fundos que cobram taxa de carregamento não só não geram alfa positivo que cubra o carregamento como geram alfas mais negativos do que os fundos que não cobram. Não há evidências de que fundos cobram mais por desempenho passado já que a maior mudança porcentual positiva nas despesas se dá entre os fundos de pior desempenho.

Modelo de Três Fatores

Elton et.al. (1993) utilizariam uma abordagem semelhante ao modelo de três fatores apresentado em Fama e French (1993), mas desenvolvido independentemente. Após a publicação do artigo sobre o modelo em 1993 e a sua disseminação entre os economistas financeiros, o modelo se tornaria padrão para a análise de retornos e poderia facilmente ser utilizado para analisar o desempenho de fundos.

Carhart (1997) estudou a persistência de desempenho dos fundos (se antigos vencedores continuam vencedores). Carhart acrescentou um novo fator ao modelo de Fama e French (PR1YR, carteira formada pelas ações de melhor desempenho nos últimos 12 meses menos as ações de pior desempenho), separou os fundos em decis em relação ao seu desempenho passado e encontrou alfas negativos (ou não distinguíveis de zero) em todos os decis. Maiores despesas e taxas, giro e taxas de carregamento pioram os resultados dos fundos.

Fama e French (2010) analisaram o desempenho de fundos no período 1984-2006. Em regressões utilizando o CAPM, o modelo de três fatores e o de quatro fatores (o mesmo usado por Carhart), calculando os retornos médios dos fundos com média simples ou ponderada por valor, o alfa dessas seis análises é negativo e estatisticamente significativo e o r-quadrado variando entre 96% e 99%.

Aritmética da Gestão Ativa

Em 1991, William Sharpe publicaria um artigo com um argumento bem simples, mas bastante revelador. Através de raciocínio matemático básico, sendo necessário apenas conhecer as quatro operações, o autor argumenta em Sharpe (1991) que:

1) Antes de custos, gestão passiva e gestão ativa produzem em média o mesmo retorno
2) Depois de custos, a gestão ativa perde para a gestão passiva

Na média, os investidores que utilizam gestão ativa conseguirão retornos médios antes de custos. Se assim for, então, consequentemente os investidores ativos irão obter retornos médios também. Porém, os custos da gestão ativa são maiores, de forma que, depois dos custos, o retorno médio da gestão ativa é inferior.

O autor faz algumas observações sobre esse raciocínio e sobre os retornos serem “devidamente calculados”. A primeira é que nem todos os fundos indexados são verdadeiramente passivos, podendo tentar utilizar uma amostra do mercado ao invés de comprar todos os ativos (segundo o autor, o fundo só seria realmente indexado se possuísse todos os ativos em seus respectivos pesos, o que não é muito factível). As análises geralmente só levam em conta os investidores institucionais e os fundos possuem sempre outros ativos em carteira além de ações (principalmente caixa para fazer frente aos resgates). Por fim, alguns cálculos de média deixam de considerar o tamanho de cada fundo e as comparações de retornos de fundos ativos deveriam ser feitas com base em fundos passivos, não em outros fundos ativos.

Dessa forma, não é de se estranhar que pesquisas, como as mencionadas anteriormente, mostrem que o retorno dos fundos ativos seja inferior. O autor não mostra nenhuma evidência de que isso ocorra, mas é uma expectativa bastante intuitiva. Porém, o autor não descarta que alguns investidores ou mesmo tipo de investidores (fundos de pensão, no exemplo do autor) possam obter um retorno superior, mas nota que esses devem ser uma minoria.  Assim, nesse simples artigo o autor não fala que o desempenho considerando-se o risco dos fundos ativos será inferior (o autor nada fala de seu famoso índice de retorno por variabilidade ou “Índice de Sharpe”) e nem que seria possível vencer o mercado de forma persistente escolhendo o melhor gestor (ou sendo o melhor gestor). Mas, em termos de retornos médios, o raciocínio faz todo sentido.

Dessa forma, o apelo em favor dos fundos de gestão passiva e a inabilidade dos gestores ativos em selecionar ativos subavaliados independem da Hipótese de Mercados Eficientes. O raciocínio de Sharpe não precisa em momento algum que o mercado seja eficiente para ser considerado válido. John Bogle enunciaria a Hipótese de que Custos Importam, apontando como um dos problemas para a rentabilidade ao investidor os custos incorridos pelos fundos e repassados aos investidores.

Custos e desempenho de fundos

Em dois artigos, John Bogle trata da relação entre os custos dos fundos de investimento e seu desempenho. Em Bogle (1998), analisa os fundos com base na classificação da Morningstar em uma matriz 3 x 3 com estilos na coluna (valor, crescimento e misto) e tamanho (das empresas) nas linhas no que faz Bogle lembrar do jogo da velha (Tic-Tac-Toe). O período de análise é curto, cinco anos entre 1992 e 1996.

Inicialmente, o autor descreve o retorno (sempre líquido de custos e impostos), o risco e o índice de Sharpe típico em cada uma das células da matriz. Analisando individualmente cada grupo classificando os fundos em quartis de acordo com seu retorno, o risco não varia muito dentro de cada quartil, de forma que o índice de Sharpe é determinado especialmente pelo retorno. Seria desejável, então, tentar estimar o que levaria a um maior retorno e a hipótese do autor é que os custos do fundo possam jogar alguma luz na questão.

Analisando cada categoria individualmente, agora classificando em quartis de custos, os retornos são maiores para os fundos de menor risco, o risco é praticamente constante em cada quartil e, com isso, o índice de Sharpe é maior para os fundos de menor custo. Esses resultados são confirmados em regressões simples entre o retorno (variável dependente) e o custo. Analisando as categorias na matriz 3 x 3, os fundos de menor custo tiveram retornos acima da média enquanto os fundos de maior custo tiveram retornos abaixo da média em quase todos os grupos. A conclusão é: para desempenho de fundos, custo importa e, como o autor viria a afirmar em um livro escrito anos depois, o Dose Certa, os investidores pagam por aquilo que não recebem.

Fundos indexados são de baixo custo, e o autor passa a analisar o desempenho desses fundos em comparação com os demais. Na matriz, fundos passivos de seis grupos possuem retornos superiores, dois muito próximos da média (pouco a mais, ou pouco a menos) e apenas um (small cap-growth) gera retornos inferiores. Porém, em todas as nove categorias o risco dos fundos passivos é menor, de forma que apenas o grupo de pior desempenho citado anteriormente possui índice de Sharpe pior. Isso também serve para mostrar que a indexação funciona para outros tipos de ações além daquelas de grandes empresas. O autor termina com uma comparação entre o jogo da velha e a gestão ativa, os dois sendo uma competição que praticamente independe da habilidade.

Minor (2001) faria algumas observações a respeito desse artigo, se propondo a contar “o resto da história”. O autor refaz a análise com outra janela de tempo (1990-1994), chegando aos resultados opostos. A conclusão é a de que os resultados são sensíveis à janela de tempo escolhida e que não é possível fazer uma generalização tão forte quanto a que Bogle fez.

Em resposta, Bogle publicou outro artigo (Bogle (2002)) publicado na mesma revista. O nome do artigo de Minor era Beware of índex fund fundamentalists e Bogle aparentemente gostou da alcunha, seu artigo se chamando An índex fund fundamentalist e viria a se reafirmar como fundamentalista da indexação em seu livro. O período de tempo foi aumentado para 10 anos terminados em junho de 2001. Nessa nova janela, os resultados se mantém parecidos, o retorno sendo maior para os fundos de menor custo, mas com o risco sendo também menor (e não parecido) e consequentemente o retorno ajustado ao risco maior. Analisando os fundos indexados, a vantagem ainda existe, mas diminui em relação ao período anterior, se tornando quase nula comparando com os fundos de baixo custo, mas não indexados.

O que o autor não havia mencionado anteriormente é que os retornos de fundos ativos são superestimados. Sem procurar quantificar a questão, ele cita o viés de sobrevivência (apenas os fundos que sobrevivem, aqueles de melhor desempenho, entram nas contas), o retorno inicial de IPOs que não são recorrentes e impactam especialmente os fundos menores e custos de vendas (taxa de carregamento, imagino). Após levar em conta esses fatores, é possível que a vantagem mencionada seja ainda maior em favor dos fundos passivos.

Bogle é o fundador da Vanguard, que introduziu os fundos indexados no mercado. As conclusões são bastante convenientes para ele, mas os resultados só deveriam ser desconsiderados se for provado que os números estão incorretos. Porém, não é difícil argumentar que os custos importam e que, seguindo a simples aritmética, como visto anteriormente, fundos indexados irão ter desempenho melhor após os custos do que fundos ativos. O investidor, então, deveria procurar focar em minimizar os custos dos seus investimentos, não só em fundos, mas em aplicações diretas também. No mercado financeiro, frequentemente paga-se por aquilo que não se recebe.

Aritmética do “Tudo Incluso”

Três artigos publicados na Financial Analysts Journal discutem a relação entre custos e desempenho de fundos. O primeiro é um editorial da revista escrito por Charles Ellis, publicado na edição de 2012 (maio/junho). Ellis (2012) analisa a opinião geral de que os custos são baixos. De fato, observando-se a forma como é expressa, uma modesta porcentagem de 1% ao ano ou até menos, pode parecer baixa. Porém, é necessário observar que essa porcentagem incide sobre todo o principal, não sobre o lucro. Calculando a taxa de administração sobre o lucro, e não sobre o ativo, pode fazer com que esse custo pareça maior, como de fato é. Em uma conta simples (e imprecisa), se o retorno é de 10% e a taxa de administração é de 1%, o investidor pagou 10% de seu lucro em taxa de administração, o que já não parece mais tão baixo. Para fundos de gestão ativa, com taxas de administração maiores, seria necessário calcular a taxa como um acréscimo em relação a fundos de gestão passiva (que, segundo Ellis, podem chegar a cobrar taxas de 0,20% para investidores pessoa física, o que nem fundos DI cobram do público geral no Brasil). Nessa perspectiva, Ellis estima que os custos incrementais podem representar até 50% dos ganhos incrementais. Pior, ganhos acima do mercado são raros. Agora o custo dos fundos definitivamente não parece baixo.

Partindo desse editorial, Sharpe (2013) estende o artigo clássico do autor sobre a aritmética da gestão ativa procurando calcular de maneira mais exata os seus argumentos. Mais especificamente, calcula a diferença do patrimônio final entre fundos com custos menores e maiores (TWR). Considerando que o retorno bruto dos dois fundos seja o mesmo, essa razão depende da diferença entre os custos e o horizonte de tempo. Comparando um investimento único em um fundo de ações com taxa de 0,06% (um fundo da Vanguard) e outro de 1,12% (que é a taxa média), em 10 anos essa razão é de 1,1125, ou seja, o investidor de baixo custo obteve 11,25% a mais do que o de alto custo. Em 30 anos, a diferença é de 38%. Note que esse cálculo independente de estarmos utilizando retornos reais ou nominais e independe da inflação.

O cálculo muda se formos considerar vários aportes ao invés de um único no começo do período e agora o ideal é utilizar fluxos de caixa e taxas de retorno reais. Nessa situação, quanto maior a taxa de retorno, maior será a TWR, porque quanto maior a taxa de retorno, maior a contribuição dos primeiros aportes com menores taxas de despesas. Comparando o investimento único com múltiplos aportes, o TWR será menor para o segundo caso, tudo o mais constante. Para 30 anos e as mesmas taxas, a TWR varia de 1,175 e 1,26 dependendo do retorno real.

Para adicionar realismo, o autor realiza simulações de Monte Carlo baseada em parâmetros históricos. O retorno do fundo de maior taxa é igual ao retorno do fundo de menor taxa mais um erro com valor médio igual a zero e um desvio-padrão que depende do grau de risco do fundo (para fins de simulação, serão utilizados vários valores para o desvio-padrão). Para um investimento único, o TWR será maior do que 1 em 99% dos casos com desvio-padrão de 0,025 para o erro e em 90% para desvio de 0,05. Em todos os casos, a chance do TWR ser superior a 1,38 é de 50%. Os resultados são semelhantes para o caso de múltiplos investimentos.

John Bogle recria o argumento incluindo agora todos os fatores que afetam a rentabilidade do fundo além dos custos. Em Bogle (2014), considerando esses fatores, os resultados do artigo de Sharpe subestimam o impacto dos custos totais. Essas outras despesas incluem a corretagem paga pelos fundos, taxas de carregamento, custo de oportunidade de investimento em caixa e impostos. Ou seja, giro da carteira, posições em caixa e impostos podem impor ainda mais penalidades para o investidor além da taxa de administração.

Essas questões não foram muito analisadas anteriormente e não é à toa, devido à dificuldade em estimar esses fatores com precisão. Reconhecendo a imprecisão, Bogle faz as suas estimativas, tentando ser o mais conservador possível. Para fundos ativos, os custos de transação foram estimados em 50 pontos-base e para fundos indexados zero. Para a parcela deixada em caixa, usando a estimativa de 5% de caixa e prêmio de risco de 6%, Bogle estimou o custo em 30 pontos-base para fundos ativos, cortando pela metade para levar em conta possíveis posições em futuros que possam ser utilizadas para aplicar esse caixa. Para taxa de carregamento, o autor estimou um custo médio de 50 pontos-base para fundos ativos.

Colocando tudo junto, o fundo de 1,12% de taxa de administração passa a ter 2,27% de custos totais, contra 0,06% de um fundo indexado. No primeiro caso, os custos consomem um terço dos retornos, enquanto no segundo apenas 1%. Isso significa que em 30 anos, usando os mesmos dados de Sharpe, a diferença entre os dois fundos será de 44% e de 65% em 40 anos. Considerando os impostos, fundos ativos mais caros sendo mais tributados do que fundos passivos baratos, essa diferença pode chegar a 175%. Considerando a inflação, a diferença do valor terminal é de 177%. Se o viés de sobrevivência dos dados relativos a retornos for considerado, esse cenário fica ainda pior.

Esses resultados são impressionantes e, apesar de talvez serem imprecisos, mostra uma realidade: os custos dos investimentos importam, e muito.

Custo da Gestão Ativa
Em French (2008), Kenneth French procurou calcular qual é o custo financeiro da gestão ativa em relação ao valor de mercado das ações. Trata-se de uma estimativa dos custos incorridos pelos investidores subtraindo-se os custos que existiriam caso todos os investidores praticassem a gestão passiva. O estudo é feito nos Estados Unidos com dados do período entre 1980 e 2006 (algumas estatísticas incluem 2007).

O autor começa com estatísticas descritivas sobre a participação de cada tipo de investidor do valor total das ações. A participação direta dos investidores pessoa física cai de 47,9% para 21,5%, enquanto que a de fundos abertos sobe de 4,6% para 32,4%. Segundo os autores, essa não é uma mudança negativa, tendo em vista que investidores pessoa física são pouco diversificados e que são “confiável fonte de ganhos” para outros tipos de investidores, talvez por serem mais propensos a vieses comportamentais.

O custo dos investidores pessoa física é apenas o custo de transação, não sendo incluídas outras despesas como o tempo gasto no gerenciamento de carteiras ou o gasto com busca por informações. Para ações recebidas como forma de remuneração, assume-se que não há custos. Para fundos, o autor utiliza o relatório das próprias instituições, que divulgam a razão de despesas em relação ao patrimônio e a taxa de carregamento. O total das despesas cai de 215 pontos base para apenas 100, basicamente a quase extinção da taxa de carregamento (de 149 pontos em 1980 para apenas 15 em 2006). Essa redução provavelmente se dá com a competição com fundos passivos e ETFs (que, em sua maioria, são passivos).

Os próximos são os investidores institucionais, como fundos de pensão e outras fundações. O padrão é parecido com aquele observado para fundos de investimento, com os custos caindo e a participação da gestão ativa subindo. Com os dados é possível analisar os custos da gestão passiva e ativa, mas apenas para instituições que oferecem planos de benefício definido e entre 1991 e 2006. Os custos em ambos caíram, mas indo de 40 pontos base para 36 no caso da gestão ativa e de 7,9 para 2,9 para a gestão passiva. Em seguida, são analisados os hedge funds, o que não é tão simples pela baixa transparência desses fundos e pela grande heterogeneidade. As estimativas do autor levando em conta apenas as taxas cobradas é de 4,26% (426 pontos base) para o período 1996-2007. É mais difícil analisar se as taxas caíram ou subiram porque a taxa de desempenho é uma grande parcela do total e varia muito com o mercado.

Por fim, é estimado o custo de transação que estava ausente nos dados anteriores. Esse custo é subestimado, já que gastos com juros em contas margem não está presente na base de dados utilizada pelo autor e poucas corretoras oferecem essa informação diretamente. Primeiro, o autor analisa o giro das ações e corrobora os resultados obtidos por Griffin et. al. (2007).

O interessante desse gráfico é mostrar como o giro despenca com a crise de 1929, chegando a ficar abaixo de 20% em 1938. Hoje em dia, está em 215%, o que significa que cada ação em circulação troca de mãos mais de duas vezes por ano em média. Esse número aumenta para 284% se forem incluídos os ETFs. Os custos de transação considerando-se o volume cai de 146 pontos base em 1980 para 11 pontos em 2006. O custo total até sobe no período, mas caiu entre o topo em 2000 (50,7 bilhões) para 32,1 bilhões.

Note-se que a queda nos custos observada em várias das estatísticas fornecidas não significa que o custo da gestão ativa caiu, já que reflete o custo tanto da gestão passiva quanto da ativa e um dos motivos da queda pode se dar pelo maior papel da gestão passiva (conforme também foi visto nas estatísticas anteriores). O primeiro passo é somar os custos e verificar quanto eles representam em relação ao valor de mercado das ações. Somando todos os custos analisados, há uma queda indo de 82 pontos base em 1980 para 75 em 2006 com média de 79 pontos base em relação ao valor de mercado das ações. Ou seja, os investidores gastaram por volta de 0,79% do patrimônio investido em ações em custos. Um elemento da queda é a redução nos custos de transação, que é contrabalanceada pelo aumento nos custos pelos fundos já que, apesar de terem reduzido suas despesas, aumentaram a sua participação de mercado. Hedge funds, apesar de representarem pouco do mercado (2,2% em 2006), representam 17% dos custos segundo a análise do autor. O custo desses investidores e seus menos de US$ 500 bilhões em gestão é equivalente ao gasto do resto do mercado para US$ 6,18 trilhões (em 2006, a capitalização do mercado era de US$ 15 trilhões).

O segundo passo é calcular o custo caso todos seguissem estratégias passivas. Para fundos, o autor usa a maior razão de despesas da família “Vanguard Total Stock Market Index Fund Investor Shares”. Como o primeiro fundo dessa família foi criado em 1992, é utilizado a razão desse ano para os anteriores. A base para os investidores institucionais é o custo de gestão passiva dos planos de Benefício Definido, controlando-se pelas diferenças com os outros investidores institucionais. Os hedge funds são abolidos e seus investimentos distribuídos igualmente entre participação direta, fundos e investidores institucionais. Por fim, o giro de ações é definido em 10% ao ano. O custo nessas estimativas vai de 18 pontos base no começo do período para 8,9 em 2006 caso todos os investidores seguissem estratégias passivas. Dessa forma, o custo da gestão passiva é estimado em 67 pontos base em média. O custo é estável no tempo, variando entre 61 e 74 pontos base na maior parte do tempo. Em valores monetários, isso significa mais de US$ 100 bilhões em 2006, US$ 330 per capita.

Supondo que os investidores continuem gastando esse valor e assumindo retorno real de 6,7% a.a., o custo capitalizado da gestão ativa é de 10% do valor de mercado atual. Como talvez o retorno real seja até inferior a isso (6,7% é conveniente para ser utilizado junto com 67 pontos base) e como o custo vai aumentar junto com a capitalização de mercado, 10% é uma estimativa bastante conservadora.

Por fim, o autor discute uma premissa fundamental nessas análises, que é a suposição de que não há transferência de riqueza dos investidores passivos para os investidores ativos e que o desempenho daqueles é o retorno de mercado subtraído dos custos de administração. Analisando fundos passivos da Vanguard e da Fidelity, considerando as despesas, o caixa e receitas com empréstimo de ativos, o autor chega à conclusão de que os fundos passivos possuem retornos muito próximos ao esperado, indicando que a premissa é válida e que os investidores aumentariam seus retornos em média em 67 pontos base trocando de estratégia.

Essas estimativas estão em linha com o que Sharpe e Bogle escreveram anteriormente. Juntando todas essas ideias, o mais sensato é se preocupar menos com a busca pelo Graal do retorno superior e aceitar os retornos de mercado mesmo, alocando uma porcentagem do patrimônio em ações de acordo com a disposição a correr riscos. Custa menos, é mais fácil e bastante eficaz.

Conclusão – O caso a favor da gestão passiva

Do que foi mostrado até agora, a conclusão óbvia é a favor da gestão passiva de investimentos, dada a incapacidade teórica e empírica dos gestores ativos obterem retornos anormais, ou seja, alfa positivo.

A questão não se encerra ai e há uma série de outras considerações a serem feitas para o processo de investimento e não quer dizer que fundos não sejam úteis. Ao contrário, podem fornecer um grau de diversificação que os investidores pessoa física teriam dificuldade de obter e o fariam a um custo mais elevado. Mas saber que a gestão passiva é melhor é insuficiente para aprender a investir melhor.

Na seção abaixo, outros comentários sobre fundos de investimento fora da linha principal de raciocínio desenvolvida até agora. Por enquanto, ficam apenas os links.


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