sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Capitalização da Petrobras

Maior de todas e maior que todas
A oferta da Petrobras é a maior de todos os tempos no mundo. Adicionalmente, é maior do que todas as IPOs realizadas no Brasil de 2004 para cá. A oferta da Petrobras foi de R$ 120 bilhões (R$ 120.360.800.041,25 se você quiser ser exato), enquanto que as IPOs somam R$ 106 bilhões. Essa conta desconsidera Santander e Tam, por motivos já declarados aqui. Considerando essas duas ofertas, mesmo assim a oferta da Petrobras é maior do que as IPOs de verdade mais essas duas, somando R$ 119 bilhões.

Ibovespa sem Petrobras
PETR3 PETR4 constavam da lista das cinco maiores baixas em 12 meses em Agosto e a desvalorização no ano era de 27% para ambas. Como PETR4 era a ação com maior peso no índice até ser ultrapassada pela Vale em Setembro, é de se imaginar como seria o Ibovespa sem a Petrobras.

Reproduzi o Ibovespa com base nas quantidades teóricas de cada revisão quadrimestral (Janeiro/10 e Maio/10) quando da mudança de composição da carteira, calculando qual o valor teórico investido em cada ação. Em seguida, calculei os valores das ações do índice com base na rentabilidade mensal ajustada por dividendos. Por fim, calculei uma carteira do Ibovespa sem PETR3 e PETR4. No final de Agosto, o Ibovespa estaria com uma insignificante alta de 0,04% contra a baixa efetiva do índice de 5,02%. Ou seja, apesar da expressiva desvalorização de 27%, o efeito no índice não é tão grande quanto se poderia imaginar e a Petrobras não está “segurando” o índice, que não teria ido muito mais longe se a Petrobras não existisse no índice.

Quem desejar, pode conferir nesta planilha. O resultado não é totalmente preciso, há alguns erros em minhas estimativas dos valores de cada ação dentro da carteira. Para ser preciso, seria necessário encontrar a quantidade teórica diária e ir utilizando as cotações diariamente para se alcançar um resultado mais preciso sobre o valor do índice. Como o erro é baixo (erro máximo de 0,57% entre o valor calculado e o valor real), não há necessidade de maiores preocupações.

Outra forma de ver isso é analisando uma carteira que tenha comprado o índice (se fosse possível) e vendido a descoberto PETR3 e PETR4 na mesma quantidade que estava no índice. Na pasta “Long Short”, há um hipotético investimento no final de 2009 de $ 100 em uma carteira que comprou inicialmente $ 115,707 de Ibovespa e vendeu $ 3,151 e $ 12,556 de PETR3 e PETR4 respectivamente. Há a revisão em Maio e Setembro para adequar as mudanças na composição da carteira. As rentabilidades são calculadas com base nas rentabilidades mensais ajustadas por dividendos. O resultado seria um ganho de 11,42%.

Diluição
Em todas as discussões e explicações sobre a oferta da Petrobras estava presente algum comentário sobre a diluição que os atuais acionistas sofrerão com a oferta se não comprarem a sua parcela nas ações (34%). A explicação era que com mais ações o dividendo por ação é reduzido e, para evitar isso, compra-se mais ações para manter os mesmos dividendos recebidos e isso evitaria prejuízos para o acionista.

Eu já discuti isso (de maneira geral) em outro texto. Pensando em rentabilidade, não há qualquer necessidade do acionista participar da oferta. Com uma oferta de ações, haverá mais ações para dividir os dividendos totais. A questão é se os dividendos totais aumentarão ou diminuirão, o que depende do uso dos recursos captados na oferta. Se os recursos forem aplicados em projetos rentáveis, os dividendos totais aumentarão, assim como os dividendos por ação, talvez não imediatamente, mas ao longo do tempo. Se os recursos forem mal aplicados, os dividendos totais diminuirão ou não aumentarão de uma forma satisfatória.

Não há como o acionista evitar a diluição. A partir do momento em que há a oferta ou o anúncio da oferta, os preços passam a levar em conta essa consideração: os recursos captados serão utilizados em projetos rentáveis? Grosso modo, se as perspectivas forem boas, os preços sobem; do contrário, caem.

Comprar mais ações para manter a mesma participação é inócuo em termos de rentabilidade. A rentabilidade porcentual futura de 1 ação ou de 1,34 ação é a mesma. Apesar do discurso ser de manutenção, comprar ações para manter a participação é um aumento do investimento realizado para acompanhar o aumento do investimento dos demais acionistas. Ou seja, na hora de decidir entre entrar ou não na oferta, a diluição não tem mais importância alguma em termos de rentabilidade. Se o investidor, por algum motivo, valoriza ter uma determinada participação porcentual na empresa ou deseje manter seu poder de voto nas assembleias, pode vir a participar da oferta para manter a sua participação. Porém, isso não vai afetar sua rentabilidade.

Valor de Mercado
Com a oferta, a Petrobras volta a ter valor de mercado maior do que o da Vale (a Vale tinha passado. Ver aqui). Na verdade, é possível dizer que nunca deixou de ter valor menor, já que as cotações (e a capitalização de mercado, por conseqüência) já estavam levando em conta a oferta de ações.

No final do ano, o valor de mercado da Petrobras era de R$ 347 bilhões. Com a mesma quantidade de ações e o preço igual ao da oferta, o valor de mercado era de R$ 247 bilhões, um pouco inferior ao da Vale (R$ 251 bilhões). Ou seja, houve uma perda de valor de R$ 100 bilhões, muito disso atribuível à forma como a oferta de ações se deu. Após a oferta (aos preços da mesma), o valor de mercado passa a ser de R$ 368 bilhões.

Dos R$ 120 bilhões levantados, R$ 74 bilhões serão utilizados para pagar a cessão onerosa ao governo. Ou seja, só restaram R$ 45 bilhões para serem investidos pela empresa em seu plano de investimentos, que é de R$ 244 bilhões até 2014. Os outros R$ 200 bilhões terão de vir de lucros retidos, aumento na dívida ou novos aumentos de capital.

Como mostrado no texto sobre Diluição, se os projetos de uma empresa não geram valor (VPL=0), o valor de mercado após a oferta é o valor anterior mais o da oferta. No exemplo teórico, se o valor de mercado era de $ 2.625 antes da oferta, há uma captação de $ 500 e o valor presente dos projetos é de $ 389,29, o valor de mercado passa para $ 3.014,29. O preço por ação era de $ 26,25 e passa para $ 25,14. Se o valor presente dos projetos fosse $ 500,00, o valor de mercado seria de $ 3.125 e o preço por ação $ 26,25.

No caso da Petrobras, houve um aumento de R$ 21 bilhões no valor de mercado (368-347) e uma captação de R$ 120 bilhões. Antes da oferta, a perda de valor de mercado era de R$ 100 bilhões (347-247). Desconsiderando outros fatores que poderiam explicar essa variação, se a captação fosse neutra em valor o valor de mercado deveria ter aumentado no mesmo montante da oferta. Pelo discutido acima, pode-se dizer que houve uma interpretação negativa sobre os projetos da empresa. Na verdade, não exatamente sobre os projetos, mais sobre a forma como a capitalização foi feita, tendo a necessidade da cessão onerosa. Pegar como data inicial o final de 2009 é impreciso, já que a capitalização já vinha sendo discutida há muito tempo, mas as conclusões não devem mudar tanto se for mudado a data inicial.

O fato é que todo esse processo destruiu valor. Talvez isso tenha sido exagerado, não deveria estar caindo 27% no ano e talvez venha a subir de volta até alcançar o resto do mercado (como diz a tese falha em comprovação de que a Petrobras está “atrasada” em relação ao mercado). Mas eu não vejo nenhuma necessidade de que isso ocorra.

Siglas (acrescentado em 26/09/10)
Estava otimista quanto ao uso correto da terminologia, mas mostrei-me um completo inocente. No Google, há 3.180 resultados para "IPO da Petrobras" e 65 para "OPA da Petrobras" (resultados que crescerão em 1 por conta de minha contribuição). Alguns resultados são para corrigir o uso da sigla, mas a maioria usa IPO ou OPA como sigla para oferta de ações. O uso correto das terminologias está aqui. A oferta da Petrobras foi uma oferta primária subsequente. Não pode ser IPO porque já tem capital aberto há mais de 40 anos e não pode ser OPA porque não há acionista comprando as ações de outros acionistas possivelmente para fechamento de capital, e sim uma emissão de ações que serão vendidas para capitalizar a empresa.

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