segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Empresa boa = Investimento bom?

Uma recomendação de investimento comum é a de investir em “boas” empresas (geralmente, não é explicitado o que isso vem a ser) com a suposição de que a qualidade superior as torna investimentos superiores. Algo a se verificar.

Uma série de artigos procura analisar a relação entre a “qualidade” da empresa e os retornos. Está implícito na recomendação acima que as empresas “boas” devem ter um retorno ajustado ao risco superior ao das “ruins” ou mesmo das “não tão boas”. Uma dificuldade é definir o que é uma empresa boa e o que é uma ruim. Dois critérios foram utilizados nos artigos abaixo: a lista das mais admiradas da Fortune e o livro “Em busca da excelência” de Tom Peters e Robert Waterman.

A lista anual da Fortune é publicada no primeiro trimestre de cada ano e baseia-se em entrevistas com executivos e analistas sobre uma série de empresas que atuem no setor das empresas dirigidas ou analisadas por eles. É pedido para que os entrevistados deem uma nota de 0 a 10 em oito aspectos: Qualidade da administração, Qualidade dos produtos e serviços, inovação, valor dos investimentos a longo prazo, solidez financeira, habilidade de atrair e reter talentos, responsabilidade com o ambiente e com a comunidade e correto uso dos ativos da empresa. Isso cria uma lista (de tamanho variável) ordenada pelas médias das notas recebidas pela empresa. As mais admiradas estão no topo e no fundo o que se chamará de “desprezadas”.

O artigo mais recente sobre a lista da Forbes é de Anginer e Statman (2010) e também é o mais completo. Os autores analisaram carteiras que estão compradas nas empresas desprezadas (que vão mal no ranking da Fortune) e vendidas nas empresas admiradas. A primeira análise é dos retornos das ações, com uma vantagem de 2 pontos percentuais para as empresas desprezadas. Utilizando o CAPM, os autores determinaram um alfa de Jensen positivo para essa carteira, indicando um desempenho ajustado ao risco superior. Há evidências mistas quando se utiliza o modelo de quatro fatores, mas os resultados não são estatisticamente significativos.

Outra análise é sobre a mudança nas percepções de qualidade. As empresas que tiveram uma piora na percepção tiveram retornos superiores às empresas que tiveram uma melhora na percepção. Ajustando ao risco pelo CAPM e pelo modelo de quatro fatores, encontra-se um alfa positivo para uma carteira comprada nas que pioraram e vendida nas que melhoraram.

Análises adicionais mostraram que a variação dos retornos é maior para as empresas desprezadas. Para essas empresas, o retorno médio é maior, mas a mediana é um pouco menor e a obliquidade para a direita também é maior. O retorno das ações que vão pior entre as empresas desprezas é menor (ou mais negativo) do que as ações de pior desempenho dentre as ações admiradas. Logo, quem desejar investir nas desprezadas, precisará diversificar bastante ou poderá pegar as de pior desempenho entre as piores. Por fim, os autores compararam as dez melhores com as dez piores, as 11-20 melhores contra as 11-20 piores e por ai em diante. As melhores ganham das piores até a classificação de 21-30, a partir desse ponto as desprezadas superando as admiradas. Ou seja, valeria a pena investir na elite da elite e desprezar as piores dentre as ruins.

Essa última parte do estudo teve inspiração no artigo de Anderson e Smith (2006). Os autores analisaram o top 10 do ranking da Fortune e encontraram retorno superior ao S&P 500 antes e depois de controlar pelo risco, mesmo após ter se passado alguns dias após a publicação da lista. A diferença sem ajuste de risco é de 4,7 pontos percentuais por ano. O alfa quando se ajusta pelo risco implica um ganho de 6,5 pontos percentuais sobre o S&P 500. Os autores sugerem que talvez os investidores não estejam prestando tanta atenção a esse fator.

Há algumas hipóteses que podem ser feitas para explicar esses resultados. O retorno anormal de uma dessas dez empresas que vão se revezando pode explicar boa parte desse retorno superior (como são apenas dez ações, uma alta expressiva produz um resultado maior do que em uma carteira de 500 ações). E talvez o ganho dessas ações se deva a um fator que os entrevistados pela Fortune simplesmente não teriam como prever (algum projeto novo ou um mero golpe de sorte, por exemplo). De todo modo, é um alento para quem deseje ou ter uma carteira pouco diversificada ou seguir a lista da Fortune (restringindo-se às melhores). Antunovich et al. (2000) fizeram um estudo similar analisando as 10% melhores e 10% piores, encontrando retornos superiores das melhores sobre as piores.
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Já no que se refere ao livro de Peters e Waterman, Kolodny et al. (1989) analisaram as empresas classificadas como excelentes por Peters e Waterman. Uma das falhas do livro, segundo os autores, era ter ignorado o retorno para os acionistas, sugerindo que isso seria uma consequência natural do melhor desempenho corporativo das empresas. Nas análises do artigo, o número de períodos de um ano onde as empresas excelentes superaram o desempenho do mercado foi menor do que 50% (com a consequente conclusão de que em mais de metade das ocasiões essas empresas tiveram desempenho abaixo). Também é maior o número de períodos onde mais de 50% das empresas excelentes tiveram desempenho abaixo do mercado. Analisando períodos de 5 anos, houve um período nos cinco primeiros anos pesquisados onde as empresas excelentes tiveram desempenho superior. Depois, essas empresas tiveram mais períodos de desempenho inferior do que superior, o mesmo valendo para períodos de 10 e 25 anos.

Michelle Clayman escreveu dois artigos para a Financial Analysts Journal sobre o assunto, cobrindo dois períodos: 1981-1985 no primeiro e 1988-1992 no segundo. No primeiro, o alfa da carteira das empresas excelentes foi de 0,2% e das empresas não excelentes foi de 1%. No segundo, os alfas foram 0,38% e -0,07% respectivamente. Mesmo que no primeiro período o alfa das empresas excelentes não tenha sido maior do que das outras, é uma boa notícia alfas positivos nos dois períodos.

Uma possível explicação para as evidências de retornos superiores para ações desprezadas na comparação com as ações admiradas/excelentes é que os investidores reagem em excesso tanto para a excelência quanto para o mau desempenho, o primeiro caso muito para cima, o segundo muito para baixo. Isso levaria as ações consideradas boas a ficarem caras e as ruins baratas, caro e barato em relação ao que as empresas valem. Mesmo considerando a reação excessiva, foram encontrados casos onde as empresas admiradas tiveram um desempenho superior. Talvez essas empresas estivessem caras originalmente, mas novas informações mudaram elevaram o valor dessas empresas de uma forma que não era previsível anteriormente. Uma conclusão geral é que um bom investimento é aquele que está sendo negociado abaixo de seu valor, o que é a base do investimento em valor.

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