Smart Beta é um tema que foi abordado em um texto anterior do blog, mas de maneira insatisfatória. Nesse texto, aprofundo a discussão com um artigo de Burton Malkiel publicado no Journal of Portfolio Management.
Primeiro de tudo, uma tentativa de definição de
Smart Beta, não havendo uma conceituação consensual. Smart Beta é uma
estratégia que procura combinar gestão passiva com gestão ativa. Assim como a
gestão passiva e diferente da ativa, procura manter uma carteira bem
diversificada. Porém, não procura replicar o desempenho do mercado, e sim
enviesar (tilt) a carteira para algum
fator, como Valor, Tamanho, Momento ou outro, baseado em estudos a respeito do
desempenho desses fatores. Assim, é uma estratégia que busca retornos beta, mas
não meramente seguindo o mercado, procurando na verdade superá-lo, assim como a
gestão ativa, mas sem adotar uma carteira concentrada.
As bases teóricas são os diversos estudos apontando
“anomalias” de mercado, que na verdade são anomalias do CAPM,
como as apontadas no parágrafo anterior. Um argumento muito utilizado é que uma
carteira ponderada por valor de mercado irá muito frequentemente estar comprada
em ações caras, na medida em que essas ações podem ter subido de preço, se
tornado caras e ganharam mais participação na carteira de mercado. Malkiel
rejeita o argumento de que com isso a estratégia Smart Beta ganharia à custa da
gestão passiva. Como nos mostra a Aritmética
da Gestão Ativa, a gestão passiva recebe os ganhos de mercado. Se alguém
obtém retornos superiores, é à custa de outro gestor ativo, não daqueles que
indexam as suas carteiras.
Estratégias que balizam uma carteira Smart Beta
parecem atraentes se você segue um modelo como o CAPM, ao invés do Modelo
de Três Fatores. Essas estratégias parecem que superam o mercado analisando
apenas o risco como a covariância com os retornos do mercado, mas quando você
considera outros fatores de risco essa vantagem pode desaparecer. Todo
entusiasta do Smart Beta deveria se perguntar se esse fator é realmente uma
anomalia ou se simplesmente corre mais de um risco que é precificado pelo
mercado e que, portanto, não garante retorno anormal (ou alfa).
Dessa forma, carteiras Smart Beta podem estar
assumindo mais risco sem saberem disso. Outro ponto a ser levantado é que essas
carteiras podem necessitar de muito rebalanceamento. De um trimestre para
outro, uma ação pode deixar os decis inferiores de valor (relação Valor
Patrimonial/Preço) ou momento e deixar de serem elegíveis para a estratégia, o
que exige a venda dessas ações e a compra de outras. Seguir uma estratégia
Tamanho é cara, pois há mais custos de transações implícitos envolvendo ações
de baixa capitalização. Outro problema é que a própria popularização dos fundos
Smart Beta podem resultar na perda de sua eficácia, na medida em que muitos
investidores explorando uma anomalia fazem com que ela desapareça (se é que ela
existiu para começar).
E o desempenho histórico, apesar da pequena janela
de tempo, não é muito favorável. Malkiel não mostrou tantos dados a esse
respeito, mas cita diversos casos em que o fundo Smart Beta não superou o
mercado, ou superou por apenas algum tempo, ou assumiu enormes riscos (como ter
15% da carteira em Citigroup e Bank of America em 2009). Malkiel afirma (mas não
comprova) que o maior fundo Smart Beta (RAFI Fundamental Index) superou o
mercado (por conta de ter investido nos bancos em 2009), mas analisando os
retornos com o modelo Fama-French o alfa é nulo.
Malkiel conclui afirmando que, por enquanto, Smart
Beta é muito marketing e pouco resultado. Alguns fundos obtiveram bons
resultados, que podem ser apenas compensação por assumir mais risco. De fato,
muitos fundos são mais arriscados do que o mercado, apesar de promessas em
contrário, de forma que não passam no teste de segurança.
Malkiel mantém a sugestão que vem fornecendo desde
sempre, a de investir em uma carteira bem diversificada, de baixo custo e que
siga o mercado. O mercado pode cometer erros, mas continua sendo muito difícil
superá-lo e estratégias Smart Beta não mudam isso.
A minha opinião é a de que Smart Beta deveria ser
usado muito menos para superar o mercado, e sim para adaptar a sua carteira de
investimentos ao seu perfil de investidor. No artigo, Malkiel compara Smart
Beta com um prato de comida, com diversos sabores (fatores) que podem ser
adicionados. Eu comparo com um sorvete. Temos o sabor baunilha, que são os
fundos indexados (aliás, em inglês usa-se o termo vanilla para produtos padronizados desse tipo). Você pode adicionar
outros sabores ou mesmo toppings ao
seu sorvete para adequá-lo ao seu gosto, e essas adições podem ser fundos Smart
Beta.
O que ainda resta ser feito em Finanças é
determinar com mais clareza quais riscos estão envolvidos em empresas de valor
ou de baixa capitalização de mercado. Um fundo que procurasse investir em ações
pouco líquidas está correndo risco de liquidez, se beneficiando quando a
liquidez é alta, perdendo quando a liquidez é alta. O risco de crédito funciona
de maneira parecida, sendo ótimo quando a situação econômica está calma, mas péssimo
para a carteira em crises. Acho que é por isso que muitos ativos parecem ser
pouco correlacionados em geral, mas caem todos juntos durante crises. Esses
ativos se beneficiam de modos diferentes da calmaria, mas todos são afetados
pela crise, quando a liquidez seca, a economia vai mal e o risco de crédito
aumenta.
Enfim, se pudéssemos saber melhor como cada fator
de risco se comporta, seria possível correr mais riscos que o investidor queira
correr para tentar aumentar os riscos de sua carteira. A ideia aqui não é
superar o mercado, gerar alfa, e sim assumir riscos diferentes que o investidor
esteja disposto a assumir. Essa, na minha opinião, deveria ser a filosofia do
Smart Beta.
Is Smart Beta Really Smart?
Burton Malkiel.
Journal of Portfolio Management. JPM 40. 2014
Is Smart Beta Really Smart?
Burton Malkiel.
Journal of Portfolio Management. JPM 40. 2014
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