(Capitalism and Freedom)
Milton Friedman. 1962.
O livro “Capitalismo e Liberdade” é resultado de uma série de aulas lecionadas por Milton Friedman em 1956 e foi originalmente publicado em 1962. O contexto era de grande otimismo com o Estado de bem-estar social, a Economia Keynesiana, descrédito do capitalismo e algum otimismo com socialismo e comunismo. O livro é uma defesa do sistema de livre-mercado e secundariamente discute o papel do Estado na sociedade.
Na introdução, Friedman escreve suas opiniões a
respeito do papel do estado, parecidas com as de Ayn
Rand. Segundo Friedman, o governo ao mesmo tempo é necessário para
preservar a liberdade, mas também é sua maior ameaça caso receba poder demais.
O propósito governo seria o de proteger a liberdade contra ameaças internas e
externas, preservar a lei e ordem, fazer cumprir contratos privados e promover
mercados competitivos e o escopo do estado deveria se limitar a esse papel.
Outro princípio advogado por Friedman é que o poder estatal deveria ser o mais
disperso possível, talvez até o nível de uma comunidade local. Na introdução, o
autor não se aprofunda nos motivos, mas aponta que “o governo nunca pode
duplicar a variedade e diversidade da ação individual” e que os maiores
progressos da humanidade se deram pelo setor privado, não pelo público (governo
inventou a internet? It
just ain’t so...).
No primeiro capítulo, o autor fala sobre a relação
entre liberdade política e liberdade econômica. Arranjos econômicos atuam de
duas maneiras na política: primeiro, a própria liberdade econômica (ou seja, a
possibilidade de realizar transação econômicas sem intervenção governamental) é
liberdade e, portanto, um fim em si e em segundo lugar pode servir como um meio
para alcançar liberdade política. Intervencionismo governamental na economia é
uma restrição às liberdades: só para citar um (1) exemplo, impor restrições ao
comércio exterior é limitar através do uso da força a liberdade do consumidor
de escolher o que vai comprar. E a liberdade econômico favorece a liberdade
política através da dispersão do poder ao separar poder político e econômico (e
o “capitalismo de compadrio” reverte tudo isso ao reaproximar os dois tipos),
reduzindo a capacidade de tomar medidas autoritárias pelo governo.
Ainda no primeiro capítulo, Friedman trata das duas
maneiras de coordenar a atividade econômica de uma sociedade: coerção por meio
de planejamento central ou por meio da cooperação voluntária com trocas
livremente acordadas entre as pessoas. Um regime de trocas livres possibilita
que as pessoas tirem melhor proveito da divisão do trabalho e busquem
transações mutuamente benéficas, enquanto que o planejamento central, seja por
problemas informacionais, seja por problemas organizacionais, acabará por criar
vencedores e perderes de forma arbitrária, já que não é possível uma autoridade
central saber o que é melhor para as pessoas. O governo em uma economia livre,
na visão de Friedman, teria o papel de ser fórum para determinar as “regras do
jogo” e fazê-las cumprir.
No segundo capítulo, Friedman desenvolve melhor
seus pontos de vista sobre o papel do governo. Os resultados dos processos de
mercado é a “unanimidade sem conformidade” com “representação proporcional”: é
possível conseguir o que se deseja, desde que haja um fornecedor do outro lado,
sem impor essa decisão a todos os demais. É impossível fazer isso através da
ação estatal exceto se houvesse uma verdadeira unanimidade, onde todos votam
nos mesmos representantes e concordam com tudo que eles decidem. Não é
distribuir proporcionalmente os resultados de muitas ações, como a defesa
pública, e Friedman argumenta que nesses casos seria justificável a ação governamental.
Friedman volta a dizer que o governo é necessário, pois “liberdade absoluta é
impossível”. Novamente, Friedman atribui ao estado o papel de fazer cumprir os
contratos livremente acordados e evitar que um indivíduo exerça coerção sobre o
outro. Atribui também o papel de definir direitos de propriedade e de prover um
arranjo monetário.
Friedman entra na questão das “falhas de mercado”.
Sobre monopólios, reconhece que o governo é o principal causador de monopólio,
mas vê que os “monopólios técnicos” (quando ter um único produtor é mais
eficiente) são sempre ruins, que os monopólios privados são os menores dos
males na maioria dos casos, exceto quando o produto é considerado “essencial”.
Porém, nenhuma lei deveria proibir a competição com monopólios públicos,
devendo apenas existir uma empresa pública que forneça tal produto ou serviço.
Quanto a externalidades e bens públicos, Friedman utiliza o termo “efeito
vizinhança” (hoje chamaríamos de externalidades), onde as ações de uma parte
afetam outras onde não é possível ressarcir a parte afeta involuntariamente,
para justificar a intervenção em alguns casos, porém, mencionando que a
intervenção também causa problemas que podem ou não ser maiores do que o
problema original. Por fim, Friedman admite que em alguns casos, como o de
crianças e loucos, o estado pode atuar de forma mais paternalistas. Há muita
subjetividade em todas as questões nessa parte do livro e Friedman não pretende
fornecer respostas absolutas ao problema, a solução final cabendo à discussão
entre as pessoas. E mesmo com essas concessões, Friedman ainda enfatiza que o
governo deve ter um papel limitado, terminando o segundo capítulo com uma lista
de itens que exemplificam intervenções indevidas do estado.
Nos próximos capítulos, Friedman aplica os
princípios dos dois primeiros capítulos a diversos casos. Começa com o arranjo
monetário, com uma análise da crise de 1929 e do período anterior. Friedman não
mostra muita confiança no padrão ouro, principalmente da forma como foi
aplicado, mas também nota os diversos problemas do banco central na condução da
política monetária na crise. Friedman afirma que “dinheiro é um assunto
importante demais para ser deixado aos banqueiros centrais” e, embora não
defenda abertamente (neste livro) a abolição do Federal Reserve, defenda que
ele tenha muito menos poder do que tinha na época, na mesma linha da
desconcentração de poder dos capítulos anteriores. A proposta de Friedman (que
ele não pretende que seja a solução definitiva e perfeita) é estabelecer uma
regra bem rígida para a autoridade monetária, impondo um crescimento baixo, mas
definido por regra, da base monetária.
No quarto capítulo, o autor analisa o comércio
exterior e a conversibilidade de moedas, continuando também a discussão sobre
arranjo monetário e padrão ouro. Primeiro, analisa o padrão ouro tal como foi implantado
nos Estados Unidos, incluindo o confisco do ouro de posse dos cidadãos, e como
esse arranjo era contrário à economia livre. O padrão ouro poderia ser
implantado em uma economia livre, mas Friedman não considera plausível a
implantação desse arranjo. Esse assunto vem a tona por conta da
conversibilidade de moeda estrangeira em ouro e o autor passa a analisar a
questão das trocas de moedas e as tentativas de equilibrar a balança de
pagamentos e a balança comercial, Friedman detectando uma série de medidas
contrárias à liberdade nessas questões. A proposta de Friedman é uma taxa de
câmbio flutuante com políticas econômicas estáveis para que não haja
instabilidades no câmbio. Quanto ao comércio exterior, a proposta é eliminar as
restrições às trocas internacionais unilateralmente e Friedman trata da falácia
de que um país pode ser mais competitivo em tudo (na linha de Joseph Heath no “Lucro
Sujo”).
No quinto capítulo, Friedman discute a política
fiscal e sua tendência a sempre aumentar de importância, nas crises os gastos
públicos sendo utilizados como remédio, nas recuperações mantidos ou ampliados
para não prejudicar a recuperação e nos períodos de alta utilizados para
estimular o crescimento. Há ainda a ideia de utilizar a política fiscal para
contrabalancear queda no consumo privado com gastos do governo, o problema é
que os gastos não costumam cair quando o consumo privado se recupera. Friedman
sugere que esse uso de balanceamento, se é que o governo deva realizar essa
tarefa, seja feito por impostos, com corte nos impostos durante recessões. A
inércia estaria do lado da liberdade, já que seria impopular aumentar os
impostos quando a economia se recuperar. Mas Friedman não defende o papel
anticíclico do governo e propõe definir os gastos que as pessoas querem
transferir para o governo e a política fiscal seria apenas a execução dessas
aspirações. Por fim, discute a questão do multiplicador keynesiano e os efeitos
dos gastos do governo na demanda.
Educação é o tema do sexto capítulo. Por conta dos
“efeitos vizinhança”, Friedman acha que o governo deveria exigir um nível
mínimo de escolaridade e que forneça subsídios para tal, mas que não deveria ir
além desse ponto. Porém, segundo ele, o governo não deveria se envolver na
administração da educação. No financiamento da educação mínima, Friedman sugere
a distribuição de vouchers que permitam os pais escolherem a instituição de
ensino, o governo apenas fiscalizando a qualidade dessas instituições.
O sétimo capítulo trata da discriminação no
trabalho. Primeiro, nota que discriminação pelo empregador é ineficiente. Em
seguida, ao analisar leis que promovem a “justiça” na contratação ou que impõem
que apenas os filiados a sindicatos podem ser empregados, vê essas iniciativas
como uma interferência à liberdade de empregadores e empregados de firmar
contratos livremente, comparáveis com outras iniciativas como a limitação da
liberdade de expressão. Pode ser que o tipo de contratações efetuadas pela
empresa seja um reflexo das preferências do consumidor, como preferir um tipo
de música a outro, ou ser atendido por uma mulher ao invés de um homem. É uma confusão entre danos “positivos” (uma agressão
direta contra uma pessoa) e um dano “negativo” (que ocorre quando as partes não
conseguem entrar em um acordo e acabam por prejudicar mais uma parte do que a
outra). Na visão de Friedman, o estado deveria se preocupar com o primeiro
tipo, não com o natural e inevitável segundo tipo.
No oitavo capítulo, Friedman retoma a questão dos
monopólios, que podem ocorrer em um setor da economia, no mercado de trabalho
ou por meios do governo. As origens do monopólio podem ser por eficiência
(apesar de o monopólio causar uma perda de bem-estar, pode ser mais eficiente
ter só um fornecedor), seja por patrocínio direto ou indireto do governo (por
meio de tarifas, leis ou impostos) ou por conluio privado (monopólios ou
oligopólios surgidos dessa maneira raramente são sustentáveis por muito tempo).
A proposta de Friedman seria eliminar as formas de criação de monopólios pelo
governo, incluindo a abolição do imposto de renda sobre lucros. Ainda nesse
capítulo, Friedman trata da responsabilidade social da empresa de forma
parecida com outro texto aqui
analisado.
O capítulo nove trata da necessidade de permissão
estatal para o exercício de profissões, um tema bem atual no Brasil com as
tentativas de criar uma nova guilda por semana. Friedman vê essa licença como
uma intervenção no livre uso dos recursos das pessoas da forma como acham
melhor, tendo sempre do outro lado alguém que livremente confia nelas. A justificativa
para a criação de guildas é proteger o “interesse público”, embora o apelo
raramente venha do “público” e os responsáveis por licenciar os profissionais
sejam os próprios profissionais, o que levanta a muito natural hipótese do
licenciamento servir para proteger os já certificados da competição de fora da
guilda. A chancela estatal se dá em três níveis, do menos ao mais restritivo: registro,
certificação e licença. Friedman não defende a ação governamental em nenhum
desses níveis, mas o menos defensável é o último. O resultado das restrições é
poder de monopólio dos fornecedores e consequente prejuízo dos consumidores que
ou pagam mais ou são excluídos. Nem no caso do exercício da medicina, o mais
delicado de todos, Friedman faz concessões.
(Continua...)
Olá, onde encontro o resumo completo?
ResponderExcluirDesde já, obrigada.