quinta-feira, 12 de julho de 2012

Relações com investidores e preço das ações

(Selective Publicity and Stock Prices)
David H. Solomon
Journal of Finance. Volume 67. Nº 2. 2012.

O artigo de Solomon estuda a relação entre a publicidade da empresa e o comportamento de suas ações, com foco em como empresas de relações com investidores (RI) podem influenciar a cobertura da imprensa. Diversos estudos anteriores examinaram a relação entre aparições na imprensa e retornos, porém, há um problema de endogeneidade (ao invés de ações com mais cobertura subirem mais, pode ocorrer de ações que sobem mais receberem mais cobertura, por exemplo). Incluir como variável de estudo o fato da empresa utilizar ou não serviços de RI ajuda a distinguir melhor causa e efeito nessa questão. O artigo, então, está relacionado com três questões: papel das empresas de RI, efeito da cobertura da imprensa e o impacto da atenção do investidor.

A hipótese do autor é a de que as empresas de RI podem influenciar a maneira como a cobertura da imprensa é feita, distribuindo mais notícias positivas do que as negativas. Isso só seria possível com divulgação de notícias que não sejam divulgação de resultados, já que essa é uma informação obrigatória (pela legislação e, mesmo que não fosse, pelos investidores) e que nem o melhor trabalho de RI poderia “maquiar” (não há como apresentar resultados negativos como positivos). A ideia é que as empresas de RI aumentem a divulgação da empresa cliente com mais notícias positivas, o que, devido à atenção limitada do investidor, poderia influenciar os retornos. Porém, há um limite para esse ganho, na medida em que as más notícias (ou as nem tão boas) uma hora ou outra aparecerão e as expectativas infladas dos investidores podem levar a retornos menores em algum momento.

O período de análise do estudo foi entre 2002 e 2007. As principais fonte de dados foram a O’Dwyer’s sobre as empresas de RI, Factivia para as notícias e CRSP para preços de ações e outras informações das empresas. Foram excluídas ações estrangeiras, do setor financeiro, de utilidades públicas e as 100 que mais geraram notícias (porque, a certo ponto da coleta de dados, o processo teve que ser feito manualmente).

Na parte de estatísticas descritivas, as empresas que utilizam serviços de RI são 15,4% da amostra, são na média maiores, mais cobertas por analistas e pela imprensa, possuem maior participação de investidores institucionais e maior giro das ações.

Nas análises multivariadas, o autor analisa a quantidade de notícias na imprensa em função de diversas variáveis, a principal sendo uma dummy que indica se a empresa utiliza ou não serviços de RI. Sem ainda analisar se há um viés para notícias positivas, o autor constata que há um aumento na cobertura de imprensa com a contratação de uma empresa de RI na ordem de 25,5% a mais de notícias relacionadas com a empresa contratante. Em seguida, o autor considera o tom das notícias em função do número de palavras negativas contidas na notícia. Considerando a variável que mede o tom das notícias e a interação da dummy que indica o uso de serviços de RI com o tom, é possível examinar melhor a questão. O que se constata é que a firma de RI ajuda principalmente na veiculação de notícias positivas, enquanto que contribui para diminuir o número de notícias negativas, embora essas notícias continuem saindo independente da ação do RI. A contribuição da empresa de RI é da ordem de 27,7% diminuindo 3,9% com o aumento em um desvio-padrão na quantidade de palavras negativas nas notícias. Considerando especificamente as notícias relacionadas a divulgação de resultados, as empresas de RI não conseguem diminuir o número de notícias negativas.

Na sequencia, o autor analisa como esse viés nas notícias pode afetar o retorno das ações. Primeiro, examinam as notícias não relacionadas com divulgação de resultados. Em uma janela de três dias, começando um dia antes da notícia e terminando um dia após, é calculado o retorno ajustado na comparação com empresas similares (seguindo Daniel e. al. (1997)). Há um efeito positivo de por volta 11,2 pontos básicos por conta do uso de empresas de RI e esse efeito está concentrado nas notícias positivas, o efeito do uso de RI se reduzindo conforme o tom negativo das divulgações aumenta.

O autor passa a analisar os retornos durante anúncios de resultados (um dia antes até um dia depois), incluindo outras variáveis como surpresas no lucro (conforme definido por Shanthikumar (2004)) separada em surpresas positivas e negativas, para o caso de haver um efeito assimétrico. Empresas que utilizam serviços de RI produzem retornos inferiores nesses períodos, mas o efeito é exclusivo para quando há surpresas negativas no lucro, o impacto não sendo distinguível de nulo para surpresas positivas. Isso indica que os investidores ficam desapontados com as expectativas que acabaram sendo criadas pelo maior número de notícias, com viés para notícias positivas, o que leva a retornos mais negativos mesmo já considerando a quebra negativa das expectativas (ou seja, as ações de empresas com serviços de RI caem mais do que as que não usam quando há surpresas negativas nos lucros). Essa hipótese é corroborada com a evidência de que os retornos de ações que mais subiram e as que mais tiveram notícias veiculadas são as que mais caem durante anúncios de resultados.

Ainda não é de se descartar que alguma variável omitida explique os resultados ou que haja causalidade reversa, que empresas que recebem maior cobertura da imprensa contratem empresas de RI. O primeiro teste para dar maior validade aos resultados é verificar se maior cobertura se dá com mais notícias saindo em veículos do mesmo estado em que a empresa de RI está sediada. Essa proximidade geográfica favorece o trabalho da empresa de RI de conseguir emplacar mais notícias, principalmente as que mais interessam a seus clientes, na imprensa. O autor analisa essa situação procurando determinar como a quantidade de notícias positivas sobre a empresa está relacionada conjuntamente com o uso de serviços de RI e a sede da empresa ou da prestadora de serviços de RI ser no mesmo estado do veículo de imprensa, além de outros controles como a porcentagem de acionistas no capital da empresa que estejam localizados no mesmo estado da empresa de RI ou de seu cliente. Mesmo considerando todos esses controles, nota-se uma influência positiva da localização da empresa de RI no mesmo estado do veículo de imprensa no número de notícias positivas. O efeito econômico é significativo, havendo uma influência maior no número de notícias em veículos no mesmo estado da empresa de RI do que nos veículos de fora do estado.

Outro fator que reforçaria os resultados é a conexão entre os repórteres dos veículos e as empresas de RI. Um repórter é considerado conectado se escreveu sobre mais de duas empresas que são assessoradas pela mesma empresa de RI, desde que tenham escrito um número mínimo de artigos. Os resultados encontrados até aqui devem ser mais fortes para o caso de haver repórteres conectados e haverá um efeito adverso caso esses profissionais deixem de ser conectados com a empresa de RI, fato que não se espera que esteja ao controle da empresa de RI. O autor analisa como essa questão afeta os retornos seguindo o padrão observado até aqui. Os resultados mostram que os retornos em períodos fora da divulgação de resultados são influenciados positivamente pela presença de ao menos um repórter conectado na empresa de RI, enquanto que os retornos durante anúncios de resultados são negativamente afetados, coerente com o que se observou anteriormente. O fato de haver repórteres conectados suplanta o efeito de meramente ter os serviços de uma empresa de RI, indicando que o importante não é o serviço em si, mas as conexões que a empresa de RI possui. Por outro lado, há uma relação negativa entre os retornos sobre notícias não relacionadas com divulgações de lucros (e positiva durante esses eventos) e a saída de repórteres conectados, indicando que menor influência da empresa de RI sobre a imprensa reduz o impacto de seu trabalho nos retornos das ações das empresas para os quais trabalham, antes e depois da divulgação de resultados. A redução no número de repórteres que cobrem a empresa não afetam os retornos da mesma. Ou seja, o trabalho da empresa de RI é relevante, mas essa importância vem de suas conexões com a imprensa, não apenas pelo fato de estar prestando o serviço.

Os gastos externos com RI poderiam estar diretamente relacionados com gastos internos de RI, que produziriam os resultados até agora observados. Embora o gasto interno não seja diretamente observável, o autor faz uma aproximação com o número de pessoas listadas como contato nas divulgações à imprensa, o número de categorias de contatos (imprensa, investidores, analistas etc.) e o número de métodos de contato (e-mail, telefone etc.), nenhum desses fatores parecendo ter influência nos retornos ou desfazer o efeito do uso de serviços de RI nos retornos. Por fim, poderia acontecer da empresa de RI aconselhar seu cliente a divulgar mais comunicados à imprensa positivos e omitir os negativos o máximo possível. A análise do autor mostra, no entanto, que há a tendência das empresas assessoradas divulgarem menos comunicados positivos, de modo que isso não explica os resultados até aqui encontrados.

Na última parte do artigo, a questão passa a ser se o uso de serviços de RI para influenciar as notícias na imprensa podem estar relacionadas com práticas duvidosas e com má governança. De fato, o que o autor observa é que o uso de serviços externos de RI está associado com maiores índices de governança (conforme Gompers et. al. (2003), quanto maior o índice, pior a governança), com a ocorrência de republicações de resultados, com cortes em P&D e uso de “accruals” (sinais de “administração de lucros”).

Por fim, o autor analisa as consequências do padrão de retornos observado. Divulgações que não sejam de resultados não criam estratégias de investimento executáveis, já que ocorrem sem aviso prévio, diferente das divulgações de resultados. Criando carteiras que vendem no dia anterior as ações de empresas que utilizam serviços de RI e compram ações de empresas que não utilizam na véspera da divulgação dos balanços, desfazendo em prazo entre 1 e 20 dias. Utilizando o modelo de quatro fatores, o autor encontra alfas positivos para essa carteira, estatística e economicamente significativos. O autor não entra muito na questão de eficiência de mercado, apenas notando que o uso de serviços de RI por parte de algumas empresas é uma informação que não parece ser levada em conta pelos investidores. Outras questões como custos de transação e a sustentabilidade da estratégia deveriam entrar na discussão sobre eficiência de mercado, o que não foi feito e não será aqui: deixemos um ponto de interrogação nessa questão. Analisando os retornos em geral, não apenas ao redor de divulgações de notícias, empresas que utilizam serviços de RI não têm retornos diferentes das que não usam, as que passam a utilizar têm retornos até inferiores no curto prazo e não diferente das que já utilizavam no longo prazo. Esses dois últimos resultados são inconsistentes com a hipótese de que o RI externo poderia aumentar a visibilidade da empresa e que isso levaria a um menor custo de capital, aumentando o valor da empresa, mas reduzindo os retornos no longo prazo. Como se viu no começo, a visibilidade aumenta, mas essas consequências esperadas não se concretizaram.

Resumindo, as empresas podem influenciar a divulgação de notícias sobre a organização através de serviços de RI, afetando as expectativas sobre os resultados futuros, resultando em algum ganhos no curto prazo, mas em perdas quando a realidade se mostra em lucros não tão bons quanto os esperados. Embora não seja o foco do artigo, o autor mostra que parece não haver influência dessa maior divulgação de notícias por meio de serviços de RI no custo de capital, mas administradores querendo fazer o jogo das expectativas podem acabar por se aproveitar disso para extrair benefícios privados.

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