Nessa segunda parte da resenha, vou resumir as seis falácias da esquerda apontadas pelo autor do livro. Mostram que boas intenções não são suficientes para resolver problemas.
Seis falácias da esquerda:
Preço Justo: “A função dos preços numa economia de mercado é racionar os bens para que haja equilíbrio entre oferta e demanda”, escreve o autor. Preços refletem a escassez relativa dos bens e enviam mensagens ao mercado/às pessoas (as duas formas de escrever são equivalentes, mas soa “reacionário” adotar a primeira). Um bem vale mais do que outro porque é mais escasso comparado à utilidade que confere; para produtores, um preço que se eleva torna mais atraente a sua produção e um que se reduz torna menos atraente; para consumidores, há um incentivo ao consumo por conta de um preço menor e incentivo para reduzir o consumo ou procurar alternativas quando o preço se eleva. Também, os preços refletem os custos sociais incorridos em sua produção na forma de mão de obra, capital e insumos. Os fatores de produção poderiam ser utilizados de uma outra maneira para produzir outro bem ou serviço e o preço compensa os fatores por terem sido empregados da maneira que foram. Preços maiores ou menores refletem custos maiores ou menores.
Quando se tenta manipular os preços para que esses se tornem mais “justos” sempre há uma perda de eficiência. Estabelecer preços mínimos para a energia elétrica, por exemplo, aumenta o consumo de energia (quando se discute como reduzir) e desvia recursos da sociedade que poderiam ser melhor empregados de outra forma. O argumento em favor de preços artificialmente menores é que isso favorece os pobres. Porém, favorece também os ricos, e favorece mais, já que os ricos gastam mais, em valores monetários, com energia do que os pobres (essa é uma maneira eficiente de um político posar de pai dos pobres e ter ganhos econômicos simultaneamente). Melhor seria oferecer algum complemento de renda, dependendo do caso.
Também há a tentação de pagar preços acima dos preços de mercado para ajudar os produtores pobres (ou de países pobres) em uma espécie de precificação caritativa. Um exemplo analisado no livro é o do Fair Trade Coffee, onde as empresas compravam café diretamente dos consumidores a preços maiores. Como é possível imaginar, isso levou a um excesso de produção. Foi enviada uma mensagem ao mercado/aos produtores de que havia demanda e simplesmente não havia, resultando em toneladas de café sem consumidores e que acabaram sendo destruídas. Isso poderia parecer inconseqüente não fosse o fato de isso desviar terra e trabalho da produção de outras culturas que poderiam ser cultivadas para melhor proveito das pessoas.
A busca psicopata pelo lucro: Comentarei em maiores detalhes esse capítulo em outro texto, sob o marcador “Objetivo das Empresas”.
O capitalismo está condenado: O fim do capitalismo está próximo. Os sinais são visíveis e estão em toda a parte. As pessoas sequer terão que sujar as mãos para se livrar do sistema: o capitalismo irá se implodir. Pelo menos, é o que alguns imaginam. Porém, a verdade não é bem essa. A crise financeira iniciada em 2007 não foi a primeira e nem será a última crise econômica, capitalista ou não. As crises são freqüentes, mas estão ocorrendo menos freqüentemente comparado a tempos passados.
Mas o que é uma crise, quais as suas causas e como resolvê-las? Keynes é uma parte importante para a resposta a essas três perguntas e esse capítulo é praticamente dedicada a Keynes. A terceira pergunta é mais associada a Keynes (aumentar gasto público) e a mais lembrada pelos governantes. Isso é apenas uma parte da teoria da preferência por liquidez.
A teoria de que as crises (1929 em especial) são causadas por falta de demanda ou por excesso de produção é uma falácia. A economia não pára porque há excesso de produtos. Se fosse esse o único problema, preços menores resolveriam isso de forma simples. O excesso de poupança também não é necessariamente problemático, já que parte do que uma pessoa poupa depositando no banco pode ser emprestado para que outra pessoa ou uma empresa gaste.
O ponto principal da teoria da preferência por liquidez é que a demanda excessiva por um certo produto chamado dinheiro, menos por seu valor de troca, mais por ser reserva de valor. O problema não é que os produtos estejam caros: as pessoas simplesmente não querem abrir mão do dinheiro por outra coisa.
A primeira solução para isso é baixar a taxa de juros e fornecer (por meio de venda de títulos) o dinheiro que as pessoas desejem. A solução de política monetária tem limites (armadilha de liquidez) e pode ser necessário contar com a política fiscal para resolver o problema, ou seja, aumentando gastos (a parte favorita de muita gente). Com o que se gasta esse dinheiro é o de menos.
Igualdade Salarial: Muita da discussão remete à primeira falácia da esquerda, já que salário nada mais é do que o preço do trabalho. Os salários não são definidos pelo “reconhecimento social” de uma profissão, pela utilidade do trabalho, pelo grau de esforço requerido ou por um senso de “justiça” social ou econômica. A produtividade do trabalhador e o crescimento da economia também não são suficientes para explicar as diferenças salariais. O principal determinante do salário é a facilidade com que um empregado pode ser substituído ou com que um empregado pode trocar de emprego. Quanto mais substituível for o empregado, menos deveria ganhar; quanto mais fácil for o empregado trocar de emprego, maior deve ser o salário para mantê-lo. A escassez relativa de trabalhadores e os custos de troca entre profissões determinam essa facilidade maior ou menor.
Isso explica uma série de fatos. Profissionais de serviços pessoais (diaristas e eletricistas, por exemplo) ganham muito mais, em termos relativos, em países ricos do que em países pobres. Não houve um significativo aumento de produtividade no setor de serviços (ao menos, para os dois serviços citados acima). Mas, mesmo assim, há uma transferência de ganhos de produtividade da indústria para os serviços já que há uma grande mobilidade entre as profissões (o eletricista poderia ter outra profissão, por isso deve receber um salário relativamente alto para continuar a ser eletricista). Pela mesma lógica, músicos de orquestras fazem o mesmo trabalho há séculos, mas nem por isso recebem o mesmo salário que receberiam séculos atrás porque poderiam estar fazendo outra coisa. Chineses ganham menos do que americanos ou canadenses porque a China tem um PIB per capita muito menor do que esses países; é mais fácil convencer um chinês a fazer qualquer coisa do que convencer trabalhadores de outros países.
Repartindo a riqueza: Um dos grandes problemas da distribuição de renda no sistema capitalista não é o capitalismo em si, mas o fato de tão poucas pessoas desejarem ser capitalistas. Isso envolve, necessariamente, abrir mão de consumo presente para gerar mais consumo futuro, seja poupando seja investindo (dois conceitos ligeiramente diferentes). Um dos motivos que leva as pessoas a continuarem pobres (ou se tornarem) é o desconto hiperbólico, ou seja, valorizar muito mais o consumo presente do que o consumo futuro, gastando toda a renda (ou quase toda) e ainda trazendo consumo futuro para o presente (se endividando).
Que as pessoas sejam naturalmente assim é um problema sem solução fácil. Educação é uma sugestão (aliás, sugestão para tudo), porém, educação faz parte da mesma lógica: para se educarem, as pessoas precisam renunciar a fazer algo mais agradável no presente para obter benefícios futuros. Também, simplesmente dar dinheiro às pessoas pode redundar, em muitos casos, em um imenso gasto presente sem nenhuma poupança ou investimento futuro e a pessoa continuaria na mesma situação.
Nivelando por baixo: Por fim, é discutida a questão da igualdade e da eficiência, encarada muitas vezes como um conflito, embora não seja necessário abrir mão de um para obter o outro. Arranjos econômicos que melhorem o bem-estar de uma pessoa sem prejudicar o de outra são possíveis, nem sempre fáceis de serem planejados e executados. O governo pode ajudar nessa área. O autor fala de boa distribuição e má distribuição. A má distribuição apenas tira dinheiro de uma pessoa para a outra (como um professor meu ilustrou: tira dinheiro de um bolso da calça para colocar no outro). O resultado é uma perda de eficiência, já que há custos envolvidos na coleta de tributos, que financiam essa distribuição.
Mas há a boa distribuição. O governo pode melhora a eficiência da sociedade gastando os impostos em bens públicos destinados a corrigir falhas de mercado. Gastar em “seguros sociais” também podem melhorar a situação da sociedade, como exposto na sexta falácia da direita (“Responsabilidade Pessoal”). Os impostos de Pigou sobre produtos ou serviços que geram alguma externalidade negativa podem melhorar a eficiência justamente tornando esses mercados ineficientes (exemplos: combustíveis, bebidas, cigarros etc.). Uma vez gerados esses impostos, o gasto em qualquer coisa que não distorça os incentivos, pelos argumentos expostos na falácia “O capitalismo está condenado”, também podem aumentar a eficiência.
Seis falácias da esquerda:
Preço Justo: “A função dos preços numa economia de mercado é racionar os bens para que haja equilíbrio entre oferta e demanda”, escreve o autor. Preços refletem a escassez relativa dos bens e enviam mensagens ao mercado/às pessoas (as duas formas de escrever são equivalentes, mas soa “reacionário” adotar a primeira). Um bem vale mais do que outro porque é mais escasso comparado à utilidade que confere; para produtores, um preço que se eleva torna mais atraente a sua produção e um que se reduz torna menos atraente; para consumidores, há um incentivo ao consumo por conta de um preço menor e incentivo para reduzir o consumo ou procurar alternativas quando o preço se eleva. Também, os preços refletem os custos sociais incorridos em sua produção na forma de mão de obra, capital e insumos. Os fatores de produção poderiam ser utilizados de uma outra maneira para produzir outro bem ou serviço e o preço compensa os fatores por terem sido empregados da maneira que foram. Preços maiores ou menores refletem custos maiores ou menores.
Quando se tenta manipular os preços para que esses se tornem mais “justos” sempre há uma perda de eficiência. Estabelecer preços mínimos para a energia elétrica, por exemplo, aumenta o consumo de energia (quando se discute como reduzir) e desvia recursos da sociedade que poderiam ser melhor empregados de outra forma. O argumento em favor de preços artificialmente menores é que isso favorece os pobres. Porém, favorece também os ricos, e favorece mais, já que os ricos gastam mais, em valores monetários, com energia do que os pobres (essa é uma maneira eficiente de um político posar de pai dos pobres e ter ganhos econômicos simultaneamente). Melhor seria oferecer algum complemento de renda, dependendo do caso.
Também há a tentação de pagar preços acima dos preços de mercado para ajudar os produtores pobres (ou de países pobres) em uma espécie de precificação caritativa. Um exemplo analisado no livro é o do Fair Trade Coffee, onde as empresas compravam café diretamente dos consumidores a preços maiores. Como é possível imaginar, isso levou a um excesso de produção. Foi enviada uma mensagem ao mercado/aos produtores de que havia demanda e simplesmente não havia, resultando em toneladas de café sem consumidores e que acabaram sendo destruídas. Isso poderia parecer inconseqüente não fosse o fato de isso desviar terra e trabalho da produção de outras culturas que poderiam ser cultivadas para melhor proveito das pessoas.
A busca psicopata pelo lucro: Comentarei em maiores detalhes esse capítulo em outro texto, sob o marcador “Objetivo das Empresas”.
O capitalismo está condenado: O fim do capitalismo está próximo. Os sinais são visíveis e estão em toda a parte. As pessoas sequer terão que sujar as mãos para se livrar do sistema: o capitalismo irá se implodir. Pelo menos, é o que alguns imaginam. Porém, a verdade não é bem essa. A crise financeira iniciada em 2007 não foi a primeira e nem será a última crise econômica, capitalista ou não. As crises são freqüentes, mas estão ocorrendo menos freqüentemente comparado a tempos passados.
Mas o que é uma crise, quais as suas causas e como resolvê-las? Keynes é uma parte importante para a resposta a essas três perguntas e esse capítulo é praticamente dedicada a Keynes. A terceira pergunta é mais associada a Keynes (aumentar gasto público) e a mais lembrada pelos governantes. Isso é apenas uma parte da teoria da preferência por liquidez.
A teoria de que as crises (1929 em especial) são causadas por falta de demanda ou por excesso de produção é uma falácia. A economia não pára porque há excesso de produtos. Se fosse esse o único problema, preços menores resolveriam isso de forma simples. O excesso de poupança também não é necessariamente problemático, já que parte do que uma pessoa poupa depositando no banco pode ser emprestado para que outra pessoa ou uma empresa gaste.
O ponto principal da teoria da preferência por liquidez é que a demanda excessiva por um certo produto chamado dinheiro, menos por seu valor de troca, mais por ser reserva de valor. O problema não é que os produtos estejam caros: as pessoas simplesmente não querem abrir mão do dinheiro por outra coisa.
A primeira solução para isso é baixar a taxa de juros e fornecer (por meio de venda de títulos) o dinheiro que as pessoas desejem. A solução de política monetária tem limites (armadilha de liquidez) e pode ser necessário contar com a política fiscal para resolver o problema, ou seja, aumentando gastos (a parte favorita de muita gente). Com o que se gasta esse dinheiro é o de menos.
Igualdade Salarial: Muita da discussão remete à primeira falácia da esquerda, já que salário nada mais é do que o preço do trabalho. Os salários não são definidos pelo “reconhecimento social” de uma profissão, pela utilidade do trabalho, pelo grau de esforço requerido ou por um senso de “justiça” social ou econômica. A produtividade do trabalhador e o crescimento da economia também não são suficientes para explicar as diferenças salariais. O principal determinante do salário é a facilidade com que um empregado pode ser substituído ou com que um empregado pode trocar de emprego. Quanto mais substituível for o empregado, menos deveria ganhar; quanto mais fácil for o empregado trocar de emprego, maior deve ser o salário para mantê-lo. A escassez relativa de trabalhadores e os custos de troca entre profissões determinam essa facilidade maior ou menor.
Isso explica uma série de fatos. Profissionais de serviços pessoais (diaristas e eletricistas, por exemplo) ganham muito mais, em termos relativos, em países ricos do que em países pobres. Não houve um significativo aumento de produtividade no setor de serviços (ao menos, para os dois serviços citados acima). Mas, mesmo assim, há uma transferência de ganhos de produtividade da indústria para os serviços já que há uma grande mobilidade entre as profissões (o eletricista poderia ter outra profissão, por isso deve receber um salário relativamente alto para continuar a ser eletricista). Pela mesma lógica, músicos de orquestras fazem o mesmo trabalho há séculos, mas nem por isso recebem o mesmo salário que receberiam séculos atrás porque poderiam estar fazendo outra coisa. Chineses ganham menos do que americanos ou canadenses porque a China tem um PIB per capita muito menor do que esses países; é mais fácil convencer um chinês a fazer qualquer coisa do que convencer trabalhadores de outros países.
Repartindo a riqueza: Um dos grandes problemas da distribuição de renda no sistema capitalista não é o capitalismo em si, mas o fato de tão poucas pessoas desejarem ser capitalistas. Isso envolve, necessariamente, abrir mão de consumo presente para gerar mais consumo futuro, seja poupando seja investindo (dois conceitos ligeiramente diferentes). Um dos motivos que leva as pessoas a continuarem pobres (ou se tornarem) é o desconto hiperbólico, ou seja, valorizar muito mais o consumo presente do que o consumo futuro, gastando toda a renda (ou quase toda) e ainda trazendo consumo futuro para o presente (se endividando).
Que as pessoas sejam naturalmente assim é um problema sem solução fácil. Educação é uma sugestão (aliás, sugestão para tudo), porém, educação faz parte da mesma lógica: para se educarem, as pessoas precisam renunciar a fazer algo mais agradável no presente para obter benefícios futuros. Também, simplesmente dar dinheiro às pessoas pode redundar, em muitos casos, em um imenso gasto presente sem nenhuma poupança ou investimento futuro e a pessoa continuaria na mesma situação.
Nivelando por baixo: Por fim, é discutida a questão da igualdade e da eficiência, encarada muitas vezes como um conflito, embora não seja necessário abrir mão de um para obter o outro. Arranjos econômicos que melhorem o bem-estar de uma pessoa sem prejudicar o de outra são possíveis, nem sempre fáceis de serem planejados e executados. O governo pode ajudar nessa área. O autor fala de boa distribuição e má distribuição. A má distribuição apenas tira dinheiro de uma pessoa para a outra (como um professor meu ilustrou: tira dinheiro de um bolso da calça para colocar no outro). O resultado é uma perda de eficiência, já que há custos envolvidos na coleta de tributos, que financiam essa distribuição.
Mas há a boa distribuição. O governo pode melhora a eficiência da sociedade gastando os impostos em bens públicos destinados a corrigir falhas de mercado. Gastar em “seguros sociais” também podem melhorar a situação da sociedade, como exposto na sexta falácia da direita (“Responsabilidade Pessoal”). Os impostos de Pigou sobre produtos ou serviços que geram alguma externalidade negativa podem melhorar a eficiência justamente tornando esses mercados ineficientes (exemplos: combustíveis, bebidas, cigarros etc.). Uma vez gerados esses impostos, o gasto em qualquer coisa que não distorça os incentivos, pelos argumentos expostos na falácia “O capitalismo está condenado”, também podem aumentar a eficiência.
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