Em um texto dos primórdios deste blog, escrevi sobre a possibilidade de uma empresa valer menos do que seu Patrimônio Líquido. Mas e quanto a uma situação ainda mais drástica, valer menos do que o caixa?
De início, parece uma situação absurda o valor de
mercado de uma empresa ser inferior ao valor do dinheiro em caixa e essa
situação poderia indicar uma barganha irresistível. Uma possibilidade seria a
empresa distribuir todo o caixa em dividendos e isso já seria suficiente para
que ela devesse valer mais. Além disso, é uma prática comum na avaliação de
empresas somar o valor do caixa ao valor presente dos fluxos de caixa futuros.
Esse segundo componente não deveria ter valor negativo, ao menos não no
agregado, então, por esse raciocínio, não seria possível a empresa valer menos
do que o caixa.
Na prática, é muito difícil encontrar uma empresa
nessa situação, porém, existe. Para dar um exemplo, a General Shopping (GSHP3)
vale R$ 226 milhões à cotação de R$ 4,48 e seu caixa no primeiro trimestre de
2015 era de R$ 228 milhões, sendo que a empresa já chegou, em um histórico
recente, a valer R$ 200 milhões.
Eu fiz a avaliação da General Shopping. A grande
questão é o elevado endividamento da empresa, com dívida bruta de R$ 2,2
bilhões e gerando resultado antes do resultado financeiro e dos tributos de por
volta R$ 40 milhões. Ou seja, uma situação financeira nada invejável e
precisando desalavancar, o que não será fácil pela baixa geração de caixa com
relação ao imenso serviço da dívida. Não vou entrar em detalhes sobre a
avaliação, mas basicamente todo o valor da empresa virá da perpetuidade em uma
data bastante distante quando a dívida da empresa terá convergido para um
patamar mais razoável. É por esse motivo que a empresa vale tão pouco, muito
menos do que empresas com resultados operacionais um pouco superiores, como a Sonae Sierra (SSBR), que vale por
volta de R$ 1,4 bilhão.
Quanto à soma do valor do caixa ao valor da
empresa, eu não acho que essa seja uma prática sensata. O que faço em minhas
avaliações é projetar explicitamente o caixa da empresa de acordo com os seus
resultados, com os efeitos dos ativos e passivos e os projetos futuros. É
necessário ter em mente que caixa nem sempre é dinheiro ocioso e que a empresa
irá precisar do atual caixa para investir ou para realizar pagamentos. Somar o
valor do caixa seria igualar a um dividendo na data 0 e essa é uma situação
absurda.
Alguém poderia perguntar se não seria possível a
empresa pagar um elevado dividendo quando seu valor de mercado está tão baixo
assim. A questão é que provavelmente a empresa não tem condições financeiras
para isso (a General Shopping, por exemplo, não tem lucros acumulados para tal)
e pode ser impedida legalmente de fazer isso ou mesmo ter os seus
administradores processados caso isso venha a ocorrer. Então, essa
possibilidade também está descartada.
Dessa forma, o valor do caixa não é referência para
patamar mínimo para seu valor de mercado e há casos em que a empresa pode ter
valor inferior ao seu caixa e essa situação ser plenamente justificável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário