segunda-feira, 13 de julho de 2015

Pode uma empresa valer menos do que seu caixa?

Em um texto dos primórdios deste blog, escrevi sobre a possibilidade de uma empresa valer menos do que seu Patrimônio Líquido. Mas e quanto a uma situação ainda mais drástica, valer menos do que o caixa?

De início, parece uma situação absurda o valor de mercado de uma empresa ser inferior ao valor do dinheiro em caixa e essa situação poderia indicar uma barganha irresistível. Uma possibilidade seria a empresa distribuir todo o caixa em dividendos e isso já seria suficiente para que ela devesse valer mais. Além disso, é uma prática comum na avaliação de empresas somar o valor do caixa ao valor presente dos fluxos de caixa futuros. Esse segundo componente não deveria ter valor negativo, ao menos não no agregado, então, por esse raciocínio, não seria possível a empresa valer menos do que o caixa.

Na prática, é muito difícil encontrar uma empresa nessa situação, porém, existe. Para dar um exemplo, a General Shopping (GSHP3) vale R$ 226 milhões à cotação de R$ 4,48 e seu caixa no primeiro trimestre de 2015 era de R$ 228 milhões, sendo que a empresa já chegou, em um histórico recente, a valer R$ 200 milhões.

Eu fiz a avaliação da General Shopping. A grande questão é o elevado endividamento da empresa, com dívida bruta de R$ 2,2 bilhões e gerando resultado antes do resultado financeiro e dos tributos de por volta R$ 40 milhões. Ou seja, uma situação financeira nada invejável e precisando desalavancar, o que não será fácil pela baixa geração de caixa com relação ao imenso serviço da dívida. Não vou entrar em detalhes sobre a avaliação, mas basicamente todo o valor da empresa virá da perpetuidade em uma data bastante distante quando a dívida da empresa terá convergido para um patamar mais razoável. É por esse motivo que a empresa vale tão pouco, muito menos do que empresas com resultados operacionais um pouco superiores, como a Sonae Sierra (SSBR), que vale por volta de R$ 1,4 bilhão.

Quanto à soma do valor do caixa ao valor da empresa, eu não acho que essa seja uma prática sensata. O que faço em minhas avaliações é projetar explicitamente o caixa da empresa de acordo com os seus resultados, com os efeitos dos ativos e passivos e os projetos futuros. É necessário ter em mente que caixa nem sempre é dinheiro ocioso e que a empresa irá precisar do atual caixa para investir ou para realizar pagamentos. Somar o valor do caixa seria igualar a um dividendo na data 0 e essa é uma situação absurda.

Alguém poderia perguntar se não seria possível a empresa pagar um elevado dividendo quando seu valor de mercado está tão baixo assim. A questão é que provavelmente a empresa não tem condições financeiras para isso (a General Shopping, por exemplo, não tem lucros acumulados para tal) e pode ser impedida legalmente de fazer isso ou mesmo ter os seus administradores processados caso isso venha a ocorrer. Então, essa possibilidade também está descartada.


Dessa forma, o valor do caixa não é referência para patamar mínimo para seu valor de mercado e há casos em que a empresa pode ter valor inferior ao seu caixa e essa situação ser plenamente justificável.

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