Nesse texto, vou tratar do tema da contabilização a valor justo das propriedades para investimento, partindo do ponto de vista do usuário das informações contábeis.
Propriedades para Investimento é uma conta recente
na Contabilidade brasileira, tendo sido introduzida pelo CPC
28. Tratam-se de propriedades mantidas para gerar renda e/ou para
valorização para futura venda. Antigamente, eram contabilizadas como
Imobilizado e depois de sua introdução passaram a fazer parte da conta
Investimento e dentro desta em Propriedades para Investimento. Há duas formas
de mensuração, pelo custo ou a valor justo.
O método do custo é o mais tradicional, registrando
as propriedades ao valor de custo e aplicando a depreciação. Já no valor justo,
o valor a ser registado no Balanço Patrimonial tem origem em uma avaliação
econômica (geralmente, fluxo de caixa descontado) e periodicamente esse valor é
ajustado. Esse ajuste tem como contrapartida uma receita (ou despesa, se for
negativo) lançada na Demonstração de Resultado do Exercício.
Na quase totalidade dos casos, o método do valor
justo resulta em valores maiores do que no custo. Na transição de um método
para o outro, as Propriedades para Investimento são ajustadas a valor justo,
contando ainda com a incorporação de parte do Imobilizado e do Intangível. A contrapartida
no passivo se dá com o aumento no Patrimônio Líquido (na conta de Reserva de
Retenção de Lucros, em muitos casos) e também na conta Tributos Diferidos. Essa
segunda conta leva em consideração o pagamento de tributos no caso da venda das
propriedades e é debitada apenas nessa situação.
Empresas de shopping
centers passaram a ter seus principais ativos reclassificados de
Imobilizado para Propriedades para Investimento e podem optar por qualquer dos
dois métodos. Dentre as companhias de capital aberto, metade usa cada método,
com Multiplan, Aliansce, Iguatemi e Cyrela Commercial Properties adotando o
custo e BR Malls, Sonae Sierra, General Shopping e JHSF adotando o valor justo.
Mesmo empresas que adotam o método do custo precisam realizar o cálculo do
valor justo das propriedades e realizar a redução ao valor justo caso o custo
superestime o valor das propriedades. Essa diferença de métodos dificulta a
comparação entre elas, mas, mais importante, impossibilita a comparação com
empresas de outros setores.
Um dos problemas da diferença de métodos é que
impossibilita a comparação direta, já que tende a superestimar o lucro
(considerando que normalmente o ajuste de valor justo é positivo) e o
Patrimônio Líquido, o que afeta métricas como rentabilidade, Preço/Lucro e
Preço/Valor Patrimonial.
Mas o maior problema do método do valor justo, na
minha opinião, é que não adiciona nenhuma informação relevante para a análise
e, na verdade, oculta informações. No método do custo, temos informações sobre
o custo, inclusive dos terrenos (embora nem todas as empresas divulguem o valor
dos terrenos), a depreciação acumulada e a depreciação do período que, na minha
opinião, são muito úteis para a avaliação de empresas de shopping centers. Quando as propriedades são contabilizadas a valor
justo, não temos nenhuma dessas informações, apenas o valor justo, as
movimentações (adições, baixas, ajuste) e o valor das obras em andamento (que
são contabilizadas ao custo). Com apenas essas informações fica mais difícil
avaliar a empresa, no meu entender.
Outro problema é que qualquer análise por fluxo de
caixa descontado é apenas uma opinião, por mais que seja uma avaliação objetiva
e criteriosa. E, por ser uma opinião, o valor pode variar de avaliador por
avaliador e ao se pesquisar as metodologias das diferentes empresas nota-se uma
grande variabilidade de métodos e de premissas. Dessa forma, os usuários das
informações são obrigados a formar a sua própria convicção em cima de outra
opinião, e não de algo mais objetivo como o valor de custo, por mais que possam
existir questionamentos a respeito da contabilização ao custo.
E ao ser obrigatório que as empresas também
realizem o cálculo do valor justo mesmo que adotem o método do custo, utilizar
exclusivamente o valor justo não adiciona informação, apenas reduz. Também há
um aumento na dificuldade de entendimento dos demonstrativos contábeis, na
medida em que esse método afeta os resultados e o balanço patrimonial sem que
isso tenha muito significado econômico. Ao avaliar uma empresa que adota o
valor justo, é necessário realizar uma série de modificações meramente para que
a empresa fique nos moldes de uma que adote o custo e dessa forma se torne mais
fácil de entender e modelar.
Dentre os ajustes a serem realizados, é necessário
considerar que o ajuste a valor justo é uma receita (ou despesa) não-caixa e
também é preciso estimar o quanto do Patrimônio Líquido se deve ao ajuste a
valor justo. Normalmente, é uma conta de Reserva de Retenção de Lucros ou de
Lucros a Realizar, o problema é que essas contas estão limitadas ao Capital
Social, que é aumentado quando o valor da reserva se torna muito elevado.
Então, seria necessário ver o histórico de movimentações do Patrimônio Líquido
para determinar a parcela do PL que se refere ao valor justo.
E uma vez que o método do valor justo superestima o
resultado e o patrimônio líquido, uma empresa poderia utilizar esse método para
mostrar números mais positivos, muito embora qualquer um que analise a empresa
de forma mais criteriosa não se deixaria iludir por isso, de forma que é
duvidoso esse benefício.
A impressão que fica é que os ajustes a valor justo
são meramente virtuais, somando um valor qualquer no Ativo e o mesmo valor no
Passivo após transitar pelo resultado, sem que isso tenha maior significado
econômico. Essa metodologia acaba por tornar menos transparente a demonstração
contábil ao não acrescentar nenhuma informação, ao contrário, diminuindo, e
tornando a comparabilidade direta impossível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário