segunda-feira, 20 de julho de 2015

Valor Justo de Propriedades para Investimento

Nesse texto, vou tratar do tema da contabilização a valor justo das propriedades para investimento, partindo do ponto de vista do usuário das informações contábeis.


Propriedades para Investimento é uma conta recente na Contabilidade brasileira, tendo sido introduzida pelo CPC 28. Tratam-se de propriedades mantidas para gerar renda e/ou para valorização para futura venda. Antigamente, eram contabilizadas como Imobilizado e depois de sua introdução passaram a fazer parte da conta Investimento e dentro desta em Propriedades para Investimento. Há duas formas de mensuração, pelo custo ou a valor justo.

O método do custo é o mais tradicional, registrando as propriedades ao valor de custo e aplicando a depreciação. Já no valor justo, o valor a ser registado no Balanço Patrimonial tem origem em uma avaliação econômica (geralmente, fluxo de caixa descontado) e periodicamente esse valor é ajustado. Esse ajuste tem como contrapartida uma receita (ou despesa, se for negativo) lançada na Demonstração de Resultado do Exercício.

Na quase totalidade dos casos, o método do valor justo resulta em valores maiores do que no custo. Na transição de um método para o outro, as Propriedades para Investimento são ajustadas a valor justo, contando ainda com a incorporação de parte do Imobilizado e do Intangível. A contrapartida no passivo se dá com o aumento no Patrimônio Líquido (na conta de Reserva de Retenção de Lucros, em muitos casos) e também na conta Tributos Diferidos. Essa segunda conta leva em consideração o pagamento de tributos no caso da venda das propriedades e é debitada apenas nessa situação.

Empresas de shopping centers passaram a ter seus principais ativos reclassificados de Imobilizado para Propriedades para Investimento e podem optar por qualquer dos dois métodos. Dentre as companhias de capital aberto, metade usa cada método, com Multiplan, Aliansce, Iguatemi e Cyrela Commercial Properties adotando o custo e BR Malls, Sonae Sierra, General Shopping e JHSF adotando o valor justo. Mesmo empresas que adotam o método do custo precisam realizar o cálculo do valor justo das propriedades e realizar a redução ao valor justo caso o custo superestime o valor das propriedades. Essa diferença de métodos dificulta a comparação entre elas, mas, mais importante, impossibilita a comparação com empresas de outros setores.

Um dos problemas da diferença de métodos é que impossibilita a comparação direta, já que tende a superestimar o lucro (considerando que normalmente o ajuste de valor justo é positivo) e o Patrimônio Líquido, o que afeta métricas como rentabilidade, Preço/Lucro e Preço/Valor Patrimonial.

Mas o maior problema do método do valor justo, na minha opinião, é que não adiciona nenhuma informação relevante para a análise e, na verdade, oculta informações. No método do custo, temos informações sobre o custo, inclusive dos terrenos (embora nem todas as empresas divulguem o valor dos terrenos), a depreciação acumulada e a depreciação do período que, na minha opinião, são muito úteis para a avaliação de empresas de shopping centers. Quando as propriedades são contabilizadas a valor justo, não temos nenhuma dessas informações, apenas o valor justo, as movimentações (adições, baixas, ajuste) e o valor das obras em andamento (que são contabilizadas ao custo). Com apenas essas informações fica mais difícil avaliar a empresa, no meu entender.

Outro problema é que qualquer análise por fluxo de caixa descontado é apenas uma opinião, por mais que seja uma avaliação objetiva e criteriosa. E, por ser uma opinião, o valor pode variar de avaliador por avaliador e ao se pesquisar as metodologias das diferentes empresas nota-se uma grande variabilidade de métodos e de premissas. Dessa forma, os usuários das informações são obrigados a formar a sua própria convicção em cima de outra opinião, e não de algo mais objetivo como o valor de custo, por mais que possam existir questionamentos a respeito da contabilização ao custo.

E ao ser obrigatório que as empresas também realizem o cálculo do valor justo mesmo que adotem o método do custo, utilizar exclusivamente o valor justo não adiciona informação, apenas reduz. Também há um aumento na dificuldade de entendimento dos demonstrativos contábeis, na medida em que esse método afeta os resultados e o balanço patrimonial sem que isso tenha muito significado econômico. Ao avaliar uma empresa que adota o valor justo, é necessário realizar uma série de modificações meramente para que a empresa fique nos moldes de uma que adote o custo e dessa forma se torne mais fácil de entender e modelar.

Dentre os ajustes a serem realizados, é necessário considerar que o ajuste a valor justo é uma receita (ou despesa) não-caixa e também é preciso estimar o quanto do Patrimônio Líquido se deve ao ajuste a valor justo. Normalmente, é uma conta de Reserva de Retenção de Lucros ou de Lucros a Realizar, o problema é que essas contas estão limitadas ao Capital Social, que é aumentado quando o valor da reserva se torna muito elevado. Então, seria necessário ver o histórico de movimentações do Patrimônio Líquido para determinar a parcela do PL que se refere ao valor justo.

E uma vez que o método do valor justo superestima o resultado e o patrimônio líquido, uma empresa poderia utilizar esse método para mostrar números mais positivos, muito embora qualquer um que analise a empresa de forma mais criteriosa não se deixaria iludir por isso, de forma que é duvidoso esse benefício.


A impressão que fica é que os ajustes a valor justo são meramente virtuais, somando um valor qualquer no Ativo e o mesmo valor no Passivo após transitar pelo resultado, sem que isso tenha maior significado econômico. Essa metodologia acaba por tornar menos transparente a demonstração contábil ao não acrescentar nenhuma informação, ao contrário, diminuindo, e tornando a comparabilidade direta impossível.

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