quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Subversificação por pessoas físicas

William N. Goetzmann e Alok Kumar
Review of Finance. Volume 12. Edição 3. 2008

Já havia tratado anteriormente do tema da subdiversificação, a manutenção de carteiras menos diversificadas do que a maximização média-variância sugeriria. Uma das referências foi esse artigo de Goetzmann e Kumar e a base de dados foi a mesma nos dois estudos, quase 78 mil investidores pessoa física nos Estados Unidos no período entre 1991 e 1996. No artigo, os autores examinam o grau de diversificação dos investidores e quais os fatores que determinam essa decisão.

São utilizadas três medidas de diversificação: 1) Variância normalizada (variância da carteira de um investidor dividido pela variância média das ações da carteira); 2) Soma do quadrado dos pesos porcentuais; 3) Simplesmente o número de ações na carteira. O investidor médio possui quatro ações (3 na mediana), com valor médio de US$ 35,6 mil (e mediano de 13,9 mil). Quase 50% dos investidores possuem apenas uma ou duas ações e, não surpreendentemente, a variância da carteira cai com o aumento no número de ações. A correlação média entre os ativos que compõem a carteira não varia muito com o número de ações, de forma que o nível de correlação varia, mas não a habilidade nessa prática (os investidores não escolhem ações pouco correlacionadas entre si, o que aumentaria o poder da diversificação).

Os autores comparam o desempenho da carteira dos investidores com outras referências. A primeira comparação é feita com a carteira de mercado (S&P 500) através da Capital Market Line (CML). Uma minoria dos investidores consegue desempenho que os situe acima da CML, ou seja, obtêm retornos que mais do que compensem o risco assumido. Isso se deve muito à pobre diversificação (que é o tema do artigo, não tanto o retorno da carteira), as carteiras dos investidores tendo maior risco (maior variância normalizada) do que uma carteira com mesmo número de ações construída aleatoriamente, e a diferença sendo maior para carteiras com mais ações (indicando baixa habilidade em diversificar).

A próxima análise é a mudança do comportamento dos investidores ao longo do tempo. O número médio de ações aumenta e a variância da carteira cai no espaço de 5 anos. Porém, isso se deve mais à queda generalizada da variância dos preços e nas correlações do que em um aumento na habilidade dos investidores, de forma que as duas variáveis caem menos do que seria de se esperar, conforme os cálculos dos autores. A variância da carteira dos investidores fica ainda maior em 1996 do que era em 1991 na comparação com o mercado como um todo. A correlação média até que fica menor na comparação com o mercado, mas continua muito elevada. Ou seja, o comportamento dos investidores muda, mas não há um aumento na habilidade. A subdiversificação é maior para contas de aposentadoria (IRA ou Keogh), que representam por volta de 42% da amostra, o número médio de ações sendo menor e a variância maior.

Uma crítica que poderia ser feita é que as contas analisadas são de “play money”, recursos que alguns investidores depositam para investir em ações “só para brincar”. Segundo os autores, isso é improvável porque um grande número das contas é para fins de aposentadoria (como apontado) e porque os recursos dessas contas representam boa parte da renda e do patrimônio dos investidores.

Com isso, estabelece-se que os investidores analisados além de pouco diversificados não sabem como selecionar ações para potencializar a redução no risco. Os autores passam a examinar quais fatores determinam o grau de diversificação dos investidores. O tamanho da carteira não parece ser um fator relevante, já que investidores com carteiras muito pequenas (menor de US$ 5.830) e de tamanho médio (entre US$ 5.830 e US$ 10.560) mantêm em carteira por volta de cinco ações. Investidores menos diversificados operam com grande frequência, de forma que custos de transação elevados não são um impeditivo para a diversificação (se fosse, esses investidores não transacionariam tanto).

Outros resultados: Investidores mais velhos e com maior renda são mais diversificados. Investidores que ocupam cargos técnicos ou gerenciais são mais diversificados do que trabalhadores de outros tipos, mas menos do que aposentados. O próximo grupo de variáveis diz respeito à sofisticação dos investidores, definidos como aqueles que realizam vendas a descoberto e operam opções, a diversificação desses investidores sendo maior. Investidores que compram ações de empresas estrangeiras e investem em fundos de investimento (ou seja, diversificam mais) possuem carteiras de ações mais diversificadas. Por fim, o grau de diversificação aumenta com a experiência. Voltando um pouco para a questão da habilidade, o efeito da diversificação é maior para os investidores que aplicam em ativos estrangeiros, enquanto que é menor para os investidores que concentram os investimentos em empresas do mesmo setor. Ou seja, aqueles que entendem melhor os benefícios diversificam mais, ao contrário daqueles que não parecem compreender muito bem como a diversificação funciona.

É possível que a diversificação seja influenciada por fatores comportamentais. Investidores mais confiantes (aqueles que mais giram a carteira), com mais viés local (investindo mais em ações de empresas com sede próximas do investidor) e que seguem mais a tendência do mercado são menos diversificados. Os investidores menos propensos a realizar perdas (ou seja, que sofrem mais do “efeito disposição”) são mais diversificados, provavelmente os investidores realizando investimento em outras ações enquanto que esperam os investimentos perdedores se recuperarem (se for assim, os investidores não tentam recuperar o investimento abaixando o custo médio).

Após isso, a próxima etapa é examinar as características das ações que os investidores mais e menos diversificados compram através de regressões Fama-Macbeth (1973). Examinando apenas as relações significativas, os investidores menos diversificados compram ações com maior obliquidade (o que se examinaria com mais detalhes no futuro) e mais arriscadas, tanto em termos de volatilidade quanto de beta. Ademais, as ações são de empresas menores, de preços baixos e de maior relação Preço/Valor Patrimonial. É menos provável que essas ações sejam de empresas que paguem dividendos e o giro mensal das ações é maior.

Foi estabelecido que os investidores pessoa física são pouco diversificados e foram identificados alguns detalhes desse comportamento. Os autores terminam o artigo examinando quais os custos econômicos disso em termos de retornos relativos ao mercado e de Índice de Sharpe. Separando os investidores em decis de grau de diversificação (em termos de variância normalizada), tanto os retornos quanto o Índice aumentam junto com a diversificação. Como era se esperar, dentre os investidores menos diversificados, há desempenhos extremos para um grupo pequeno de investidores, a diferença entre os 10% piores e os 10% melhores sendo maior entre os investidores menos diversificados. O mais interessante é que os 10% de melhor desempenho dentre os menos diversificados são os que obtêm o melhor desempenho dentre todos os grupos.

É possível aprofundar essa questão analisando o desempenho dos investidores qualificados em termos de diversificação e também de características do investidor como idade, renda, emprego e giro da carteira. A variável de interesse é o diferencial entre os investidores mais e menos diversificados em cada classificação, definidos como o quintil superior e inferior de variância normalizada. Separando por idade, a diferença de desempenho é estatisticamente nula para menores de 45, baixa e marginalmente significativa entre 45 e 65 e maior e significativa para investidores mais velhos. Renda não parece ser um critério muito significativo, mas dentre os investidores de menor renda os mais diversificados obtiveram desempenho um pouco maior. O resultado mais interessante surge quando os investidores são classificados em termos de giro da carteira. O diferencial de desempenho é maior dentre os que operam menos ou medianamente, os mais diversificados obtendo melhores resultados. Porém, dentre os investidores com maior giro ocorre o contrário, os investidores mais ativos e menos diversificados superando o desempenho dos mais ativos e mais diversificados.

Em resumo, os investidores pessoa física são pouco diversificados e não sabem diversificar muito bem. Investidores mais velhos, com maior renda e que realizam outras operações além da compra e venda de ações são mais diversificados. Investidores menos diversificados preferem ações mais arriscadas. Esse comportamento possui um custo econômico, os investidores menos diversificados obtendo desempenho pior.

Isso tudo depõe a favor da diversificação. Um resultado da pesquisa destoa um pouco, uma minoria dos que menos diversificam obtendo um desempenho excepcional e os que mais giram a carteira e são menos diversificados superando os que mais giram e são mais diversificados. Se o investidor acredita que possui alguma habilidade para ganhar dinheiro no mercado, a diversificação pode ser prejudicial. Não faz sentido realizar alguns investimentos quando há outros que parecem ser melhores; o lado negativo é que é muito difícil distinguir um investimento bom de um ruim, como evidenciado em vários estudos, como aqueles sobre desempenho de fundos, e um número muito grande de investidores pensa ter habilidade superior.

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