segunda-feira, 21 de março de 2011

Crescimento econômico e retorno de ações

(Economic growth and equity returns)
Jay R. Ritter
Pacif-Basin Finance Journal. Volume 13. 2005

O artigo trata da relação entre o crescimento econômico e a valorização das ações. Este texto será um misto de resumo do artigo com considerações próprias. São duas análises a serem feitas sobre essa relação: como a taxa de crescimento de um país afeta o retorno das ações listadas no mesmo país (que será meu foco) e como taxas de crescimento médio de um conjunto de países se relaciona com os retornos médios das ações (o que o artigo trata).

Primeiros princípios primeiro: o crescimento econômico ocorre com o aumento na produtividade via aumento no investimento (e necessário aumento na poupança), aumento no uso de trabalho e mudanças tecnológicas. O valor de uma ação é o valor presente dos fluxos de caixa futuros e os retornos dessa ação dependem da taxa de desconto/custo de capital (que por sua vez depende do risco) e de mudanças nos fluxos de caixa esperados.

A correlação entre crescimento econômico e retornos não deveria ser idêntica nem teoricamente. Sob o modelo de fluxo de caixa descontado, se nada mudar nas expectativas, o retorno da ação será igual à taxa de desconto utilizada. Mas as expectativas mudam e é possível aumentar ou diminuir o fluxo de caixa distribuído pelas empresas. Para aumentar, a empresa deve investir em projetos com valor presente líquido (VPL), o que resultará (por definição) em menores fluxos de caixa no curto prazo, mas aumentará os fluxos futuros de forma que o valor presente do acréscimo seja maior do que o valor presente do decréscimo. Mas o valor presente dos projetos não é estático e o mercado pode não ter todas as informações relevantes (que seriam informações privadas), de forma que o VPL dos projetos da empresa muda com a divulgação de novas informações e com mudanças que afetam a rentabilidade do projeto (mudanças no comportamento do consumidor, variação no preço dos insumos etc.). E, naturalmente, informações sobre a economia podem influenciar o valor dos projetos das empresas, de forma que esse há uma ligação entre crescimento do PIB e retorno das ações. Porém, a atividade econômica de um país não é o único fator a influenciar as oportunidades de uma empresa, com a competição setorial, mudanças legais e outros fatores também impactando os resultados das empresas.

Há alguns problemas com essa possível correlação. O primeiro é de sincronia: se a análise é entre retornos passados e crescimento histórico do PIB, deixa de considerar mudanças de expectativas que afetam o retorno das ações. Logo, um retorno baixo em um ano de crescimento de PIB elevado pode apenas refletir expectativas de crescimento baixo de PIB. Outros serão tratados nos próximos parágrafos.

Segundo o autor (e, antes dele, Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton) a correlação entre crescimento real do PIB e retorno real das ações é de -0,37 com p-valor de 0,16 (ou seja, provavelmente a correlação na verdade seja nula). Porém, essa correlação diz respeito à comparação da taxa média de crescimento do PIB de diferentes países com o retorno médio no mesmo período. A questão deixa de ser a relação ao longo do tempo entre crescimento e retornos e passa a ser uma relação entre as taxas em diferentes países.

Ritter analisa no artigo algumas explicações. Parte substancial do crescimento econômico e do aumento de capital e de trabalho empregados pode ir para empresas novas, que não estejam na bolsa e muito menos no índice acionário que serve de referência. O autor argumenta ainda que mudanças tecnológicas beneficiam mais aos consumidores do que aos produtores (não tenho ideia se isso faz sentido), que o crescimento leva a maiores aumentos reais de salário e que aumentos de capital com emissão de dívida ou de ações beneficia os novos investidores/credores, não os investidores já existentes (com o que discordei indiretamente aqui), esses fatores de crescimento econômico não necessariamente contribuindo para aumento nos lucros na mesma proporção. Outro argumento é o de que as empresas de um país podem se beneficiar do crescimento de outros países direta ou indiretamente, o que diminuiria a relação com o desempenho do mercado doméstico. Práticas deletérias de governança (como transações com partes relacionadas suspeitas) podem resultar em retornos menores com a expropriação de acionistas minoritários pelos majoritários mesmo com alto crescimento econômico. Por fim, os principais modelos de precificação de ativos (CAPM, três fatores etc.) não utilizam como fator o crescimento econômico, o que indica não haver sequer uma relação teórica.

Nos últimos cinco anos (fev/06-fev/11) a valorização do SSE (índice acionário da bolsa da China) subiu 8,58% (não ao ano, no período), desempenho pífio comparado com a taxa de crescimento econômico que não raro ultrapassa esses 8,58% em um ano em termos reais. Muitos argumentos utilizados para as boas perspectivas do mercado acionário brasileiro se baseiam no desempenho chinês (e também brasileiro) e, a depender das causas desse desempenho da bolsa chinesa, e tendo em mente as observações deste texto, talvez seja prudente ter cautela. Afinal, se a economia chinesa não ajudou nem aos investidores chineses, pode não ajudar os brasileiros.

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