domingo, 31 de outubro de 2010

Conexões Políticas II

Texto com temática semelhante ao de outro sobre conexões políticas, abordando o efeito nos resultados das empresas conectadas.

Operações de salvamento
Faccio et. al. (2006) analisaram a relação entre conexões políticas e operações de resgate do governo (os famigerados bailouts). O estudo abrangeu o período entre 1997 e 2002 e incluiu 35 países. Uma empresa é considerada diretamente conectada quando tinha no começo de 1997 quando um dos principais executivos ou maiores acionistas da empresa são ou chefes de estado ou membros do parlamento. Outras conexões indiretas ocorrem quando as figuras mencionadas acima possuem um parente no poder, foram descritas pela imprensa como tendo amizades com os políticos ou nos casos citados em estudos anteriores. São 450 empresas conectadas e para cada uma foi escolhida uma empresa semelhante que esteja na mesma indústria e tenha tamanho semelhante. Dessas empresas, 71 foram resgatadas, 51 destas são conectadas politicamente e as demais não. Considerando apenas as empresas conectadas, ocorreram 37 resgates de empresas em países que receberam ajuda do FMI ou do Banco Mundial e 14 em outros países.

Análises multivariadas confirmam que há uma relação entre a probabilidade da firma receber resgate e o fato de ser conectada politicamente. A relação com o país ter recebido ajuda dos organismos internacionais também é confirmada. Há ainda relação positiva também com o tamanho da empresa (na maioria das análises), com a alavancagem e o desvio padrão do retorno das ações, e relação negativa com o colateral da dívida e o Retorno sobre Ativos. Ou seja, empresas mais arriscadas têm mais chance de serem resgatadas, justamente porque a chance de precisarem ser resgatadas é maior. Isso pode explicar porque empresas conectadas são maiores e mais alavancadas do que as nas não conectadas. Não há relação significativa entre ajuda governamental e corrupção, mas há relação negativa com o PIB per capita (quanto menor o PIB per capita, maior a chance de resgate). Empresas pertencentes ao governo não têm maior chance de serem ou de precisarem ser resgatadas, mas empresas recém privatizadas sim.

Em outra análise, os autores examinam a eficiência econômica das empresas que receberam ajuda do governo, antes e depois desse evento. Em uma janela dois anos antes e dois anos depois do resgate, o Retorno sobre Ativos (ROA) das empresas conectadas que receberam ajuda é menor do que o de empresas não conectadas que não receberam ajuda, diferença que cresce no ano de resgate e nos anos posteriores. Padrão semelhante ocorre com a alavancagem, maior para empresas conectadas que foram resgatadas do que para as empresas não conectadas e não resgatadas. Após o resgate, a alavancagem inclusive continua a aumentar para as empresas conectadas, enquanto que cai para as não conectadas. Uma possível explicação para o fato das empresas conectadas serem mais alavancadas é que os emprestadores de crédito assumem que exista uma garantia implícita por parte do governo, algo que se acentua quando o governo mostra que isso existe ao resgatar a empresa. Com isso, os padrões de aceitação de crédito e possivelmente o custo da dívida são reduzidos e as empresas se mostram mais propensas a se endividarem.

Operações de resgate, em geral, são ineficiente economicamente. Se uma empresa tem potencial para ser lucrativa, outras alternativas como ser adquirida ou receber capital de acionistas seriam melhores do que utilizar dinheiro dos impostos para salvar a empresa. Se a empresa não tiver um grande potencial, fruto de maus investimentos, possivelmente, essa empresa não deveria ser salva e é um desperdício para a economia que o governo faça o resgate. Isso fica pior considerando-se que as empresas conectadas têm mais chance de serem resgatadas e que essas empresas têm desempenho pior. Os autores concluem que, na medida em que prejudicam os mercados de capitais na alocação de recursos, os resgates governamentais podem influenciar negativamente o crescimento econômico, à parte questões sobre transparência e igualdade.

Conexões políticas como um investimento

Conexões políticas aumentam o valor das ações e aumentam a probabilidade de resgates governamentais. E quanto à atividade das empresas? É o que Cingano e Pinotti (2009) analisam a questão em empresas italianas no período 1985-1997. Duas hipóteses iniciais são feitas: a primeira que as conexões podem diminuir a burocracia, o que teria um efeito positivo no bem-estar social; a segunda que as conexões acabam por desviar recursos que seriam melhor utilizados em outro lugar para beneficiar as empresas com que estão conectados.
Os resultados das análises apontam para a segunda hipótese. Considerando-se apenas as conexões com políticos que ganham a eleição, um ano a mais que a empresa mantém a conexão política aumenta em 3,2% as receitas do período todo. Esse aumento é maior em setores mais dependentes do governo (maior parcela das vendas vai para o governo), em regiões do país com gastos públicos maiores e em regiões mais corruptas. O efeito se dá por conta do mercado doméstico, e não por aumento nas exportações (onde os políticos teriam pouco poder de influência). Quanto à participação de mercado, aumentar em um desvio padrão o tempo em que a empresa fica conectada a um político aumenta em 17% a participação. Não há efeitos da conexão política com a produtividade das empresas.

O EBITDA das empresas conectadas é 5% maior e o ROA é 0,7 pontos maior. Esse último resultado não entra em contradição com o do artigo anterior, já que o artigo de Faccio et. al. (2006) analisa um grupo específico (empresas que precisaram ser resgatadas) que possui menor ROA.

Se capitalismo, na concepção de Ludwig Von Mises e Ayn Rand, baseia-se na liberdade econômica e na proteção dos direitos individuais, e se a função do estado deveria ser o de proteção de direitos individuais (que não envolve em si aumentar o retorno das ações, resgatar empresas ou aumentar as vendas das empresas), esses textos sobre conexões políticas indicam que algo está errado.

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