domingo, 3 de outubro de 2010

Conexões políticas e retorno de ações

Um conjunto de estudos analisa a relação entre conexões políticas e retorno anormal das ações (após ajustar por risco e considerar outros fatores que influenciariam o preço das ações). Como em outros textos, não li completamente os artigos, por isso posso estar sendo impreciso em alguns pontos.

Estados Unidos
Cooper et. al (2010) analisaram os retornos das ações com variáveis que indiquem a contribuição dos PACs das empresas a candidatos nas eleições para o senado e a câmara dos deputados nos Estados Unidos. As 9,49% das empresas da base de dados dos autores que contribuíram para campanhas são grandes, mais alavancadas e tiveram desempenho pior nos últimos 36 meses do que as empresas que não contribuem.

Foram utilizadas quatro variáveis tais como o número de candidatos apoiados (média de 73 apoiados com 53 vencedores), a força das relações entre os candidatos e as empresas (há quanto tempo existe a relação candidato-empresa), a habilidade dos candidatos em ajudar a empresa (se o candidato e a empresa estão no mesmo estado) e o poder dos candidatos (mensurado como o total arrecado pela campanha). Em oito regressões combinando essas variáveis encontrou-se evidências que as conexões políticas aumentam os retornos das ações, mesmo controlando por outras variáveis.

Apesar da maioria das empresas contribuir para os dois partidos, é relevante analisar se o retorno anormal é diferente para cada partido. Separando entre Democratas e Republicanos, os resultados indicam maior retorno para investimentos em candidatos democratas, apesar dos republicanos receberem mais contribuições das empresas consideradas. Análise semelhante separando candidatos à Câmara e ao Senado indica que é mais rentável investir em candidatos à Câmara.

Uma carteira com ações das empresas que contribuem para campanhas políticas ponderada pelo valor das quatro variáveis aludidas acima sempre geram retornos anormais positivos e estatisticamente significativos quando se utiliza o CAPM e o modelo de quatro fatores.

Goldman et. al. (2009) analisaram se o fato da empresa ter um membro do conselho de administração ligados ao partido Republicano ou ao partido Democrata afeta o retorno das ações após os resultados das eleições. Uma primeira análise comparou os retornos de ações de empresas com conselho com pelo menos um republicano e nenhum democrata com o de empresas na situação inversa (pelo menos um democrata, nenhum republicano). Analisando a eleição presidencial de 2000 (com vitória de republicanos) de oito maneiras diferentes (4 janelas de tempo e ponderação igual ou ponderada), os resultados mostram ganhos das carteiras de empresas com conexões com os republicanos e perda das carteiras democratas, com diferenças das duas carteiras superiores a 3%. Isso independe do que o membro do conselho havia feito no passado, já que mesmo aqueles que exerceram funções estatais em nada relacionadas com as atividades da empresa trouxeram ganhos para a empresa (ao menos na reação imediata do preço das ações), mesmo que o efeito seja mais modesto para os que “não relacionados”. Outras análises sem agregar as ações em carteiras, analisando individualmente, também mostra uma reação positiva no preço das ações com conselhos relacionados aos republicanos em detrimento das empresas com relações com os democratas. Essa última análise incluiu variáveis sobre doações para as campanhas políticas, encontrando relações estatisticamente significativas para essas variáveis.

Uma última análise abrangendo os anos de 1996 e 2000 tratou de relacionar a nomeação de um novo membro que tenha ligações políticas para o conselho de administração. O efeito nas ações é positivo independente da filiação partidária. O efeito nas ações é mais forte para as primeiras nomeações da pessoa, mas diminui conforme o ex-político vai entrando em mais conselhos (porém, continua havendo efeito positivo). Se o membro nomeado tem ligações com o partido do atual presidente o efeito é mais forte, mas nomeações do outro partido ainda têm efeito. Levando em conta se o político tem ligações com certas indústrias, o efeito é mais forte quando há relação, mas continua positivo e significativo quando não há.

Brasil
Foi feito um estudo de Claessens et al. (2008) referente ao Brasil nas eleições entre 1998 e 2005. Em uma janela de 20 dias antes e 20 dias depois, foi constatado retorno anormal das ações de empresas que contribuíram para campanhas de deputados, efeito mais forte para os casos em que o candidato vence, para os que já estavam no cargo, e para o caso do apoio ter sido dado aos deputados dos partidos da coalizão do presidente ou que viria a eleger o presidente (no caso dos anos com eleições presidenciais). No modelo mais simples, o retorno anormal é de 1,75% nessa janela de tempo. O efeito é negativo para os perdedores e para os que não estavam na coalizão do presidente, mas os resultados nem sempre são significativos. Para os candidatos a deputado para primeiro mandato e para candidatos de outros cargos fora deputado não houve relação significativa. Uma das possíveis explicações é que as contribuições políticas tenham levado a um acesso melhor a empréstimo, já que empresas que contribuíram tiveram aumento na alavancagem, mas não na rentabilidade.


IPOs
Francis et al. (2009) analisaram IPOs chinesas. Empresas com membros do conselho com conexões políticas, coordenadores com conexões e empresas estatais têm maior probabilidade de lançarem suas ações a um P/L mais elevado. A alta no primeiro dia (underpricing) é menor para essas empresas, indicando que foi deixado menos “dinheiro na mesa”, o que aumenta o montante captado. Os custos de emissão também são menores para as empresas com boas relações políticas.

Mundo
Um ambicioso estudo de Faccio (2006) analisou empresas de 47 países. 8% das empresas analisadas têm ligações políticas. Utilizando uma janela de tempo de dois dias antes e dois depois das eleições ou da nomeação para o conselho, as evidências são de retornos anormais de 1,43% quando do anúncio de uma nova conexão política, efeito mais forte quando ou acionistas ou executivos da empresa entram na política, ainda mais forte quando são eleitos, e em países mais corruptos.

Faccio e Parsley (2009) analisaram mortes súbitas de políticos e o retorno das ações de empresas ligadas geograficamente ao político. A hipótese é que haja uma ligação política entre o político e as empresas locais. Analisando 203 eventos em 36 países e utilizando uma janela de tempo de dez dias antes e depois do evento, as evidências são de uma queda média de 1,68% por conta da morte do político supostamente relacionado com a empresa. Em análises uni e multivariadas, esses efeitos são maiores para países mais corruptos, empresas familiares, quando o político tem ligações com a indústria da empresa e quando a relação P/VPA está acima da mediana. Ou seja, empresas familiares, que incorporam mais as ligações políticas no valor e que podem se beneficiar da ação do político falecido perdem mais valor. Analisando o efeito do falecimento do político nos resultados da empresa, adotando uma janela de um ano antes e um ano depois do falecimento, nota-se uma queda no crescimento das receitas e da alavancagem, indicando efeitos reais da perda da conexão política.

Em suma, existe farta evidência de que as empresas com conexões políticas se beneficiam do processo político. Se o papel do governo deveria ser o de protetor de direitos, claramente não está seguindo esse papel.

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