Ao avaliar um projeto de investimento, o mais correto seria utilizar o custo de capital apropriado ao projeto tendo em vista o seu risco, e não utilizar o custo de capital da empresa. Porém, na prática o que se verifica é a utilização de uma taxa de desconto única no que é chamado de falácia do WACC.
No artigo
de Krüger, Landier e Thesmar publicado no Journal of Finance, os autores
procuraram examinar se as empresas americanas cometem esse erro e tentar
estimar o impacto econômico dessa medida. A consequência de usar a taxa de
desconto errada é superestimar o valor presente dos projetos mais arriscados e
subestimar o valor dos projetos menos arriscados, levando a erros na tomada de
decisões de investimento. Para examinar essa questão, os autores analisam como
empresas diversificadas alocam recursos entre as suas divisões, separando entre
o negócio nuclear e as divisões menores.
Os autores trabalham com dados relativos ao período
1992-2007 com empresas americanas, utilizando diversas bases de dados.
Consideram como conglomerados as empresas que atuam em mais de uma indústria
seguindo o critério de Fama
e French. Em seguida, definem uma divisão da empresa como núcleo se esta
tiver a maior participação nas vendas da empresa e em divisões as demais.
Para os testes empíricos, é calculado o beta médio
de cada indústria, que será utilizado em substituição a um beta específico para
cada empresa. Em seguida, esses betas são alocados para os núcleos e para as
divisões de acordo com o seu setor de atuação e a falácia do WACC é medido como
a diferença entre o beta da divisão e o beta do núcleo. A suposição aqui é que
a empresa utiliza o custo de capital do núcleo para avaliar os projetos das
divisões. Seria possível utilizar um beta médio, porém, os testes dos autores
indicam que que as empresas utilizam o custo de capital dos núcleos em suas
decisões de investimento. Além disso, o núcleo representa em média 73% das
vendas, de forma que o custo nuclear é próximo ao WACC, as duas variáveis sendo
ainda altamente correlacionadas, de forma que a aproximação utilizada é
precisa.
A variável dependente dos testes empíricos é o
investimento realizado pelas divisões. A principal variável de interesse é a
diferença entre o beta da divisão e do núcleo (aproximação para o WACC), que
irei chamar de spread. O ideal seria
que o coeficiente de regressão desse spread
fosse zero (indicando que a empresa utiliza a taxa de desconto apropriada para
os projetos das divisões) e para que a falácia do WACC se configure é
necessário que o coeficiente seja positivo. Isso indica que a empresa investe
mais nas divisões quando a empresa utiliza um custo de capital inferior para
avaliar projetos mais arriscados, fazendo com que o spread seja positivo.
Analisando apenas a relação entre spread e investimento, agrupando as
empresas em decis de acordo com o spread e
utilizando ou não ajustes industriais, nota-se que de forma geral o
investimento é uma função crescente do spread.
Uma regressão simples confirma esse resultado ao mostrar que o coeficiente de
regressão do spread é positivo e estatisticamente significativo e mesmo a
inclusão de controles não afeta esse resultado. Ao invés de utilizar o spread
na regressão, é possível utilizar os betas da divisão e do núcleo em separado.
O coeficiente de regressão da divisão é positivo e do núcleo é negativo (ambos
estatisticamente significativos), confirmando a relação já constada utilizando
o spread.
Quando à significância econômica, utilizando o
segundo modelo (spread mais
controles) e um spread igual a um desvio-padrão, o aumento no investimento é
equivalente a 10% do investimento médio.
Em testes adicionais, os autores examinam se o
crescimento tem algum impacto nos resultados. A falácia do WACC é mais danosa
em indústrias com maior crescimento, o valor presente dos projetos sendo mais
volátil nessa situação. Incluindo variáveis dummy
para indicar que a divisão está em um setor de médio e alto crescimento e mais
duas variáveis interagindo essas dummies
com o spread. Os resultados mostram que esse segundo conjunto de variáveis tem
coeficiente positivo e significativo, corroborando a ideia de que o
investimento é maior em indústrias de médio e alto crescimento por conta da
falácia do WACC.
Uma discussão interessante é sobre se esses
resultados se devem a gestores irracionais ou a mercados irracionais. Para
testar essa hipótese, os autores incluem variáveis relativas ao financiamento
externo de forma parecida com o teste explicado no parágrafo anterior. Pode
acontecer de o mercado ser irracional e utilizar o custo de capital do núcleo
para avaliar as divisões e os gestores racionais se valem desse fato ao captar
dinheiro mais barato para projetos mais arriscados. Os resultados mostram que a
interação entre o spread e a captação de recursos externos não é
estatisticamente significativa, refutando essa hipótese.
Os resultados se mantém realizando alterações nos
modelos, como excluir o setor financeiro, mudar a definição de beta e outros.
Em testes adicionais, os autores examinam a questão da integração vertical. Se
a divisão e o núcleo forem integrados, aumento nos investimentos nas divisões
podem se dar por conta dos aumentos nos investimentos do núcleo. No exemplo dos
autores, uma empresa pode aumentar o investimento na divisão de entregas para
responder à maior produção de sua atividade nuclear, a fabricação de
brinquedos. Utilizando um indicador do BEA de
integração vertical e o próximo investimento no núcleo como variáveis
adicionais não mudam o resultado a respeito da falácia do WACC, descartando
essa explicação alternativa.
A próxima questão a ser analisada é se a
racionalidade limitada desempenha alguma influência nessa situação. Se o
impacto provável da falácia do WACC for grande, é de se esperar que a tomada de
decisão seja mais racional e que os projetos sejam analisados pela taxa de
desconto adequada. O primeiro teste relacionado com a racionalidade limitada é
examinar se a falácia do WACC é reduzido ao longo do tempo, o que pode ser
atribuído ao maior nível educação dos diretores financeiros com a disseminação
dos cursos de MBA. Os resultados mostram que o impacto da falácia do WACC é
decrescente no tempo. Outros três testes examinam se a falácia do WACC é menor
quanto maior for a importância relativa das divisões, quanto maior for o
desvio-padrão dos betas das divisões e quanto maior for a participação
acionária do diretor-presidente, os resultados corroborando as três hipóteses.
Com isso, podemos concluir que a racionalidade limitada tem influência na
falácia do WACC, ou seja, a chance da taxa de desconto correta ser usada
aumenta quanto mais importante isso for.
Para medir a significância econômica dessa questão,
os autores analisam operações de fusão e aquisição, que também podem estar
sujeitas à falácia do WACC. Dessa vez, o spread
é medido pela diferença entre o beta do ofertante e o beta do alvo. Analisar
fusões e aquisições tem como vantagem o fato de conhecermos o valor investido
de maneira mais específica (ao invés de forma agregada nos gastos de capital) e
também de podermos examinar a reação do mercado ao anúncio da oferta. Outra
vantagem é podermos utilizar os betas de maneira mais precisa utilizando os
dados relativos às empresas envolvidas (exceto se a empresa tiver capital
fechado), e não aproximações para estimar o beta das divisões.
O primeiro teste é uma análise gráfica da reação do
mercado ao longo do tempo e o spread.
O resultado mostra que o retorno é maior quando o spread é positivo, ou seja, o
WACC do ofertante é superior ao do alvo. Nessa situação, o ofertante usa o seu
custo de capital superior para analisar o alvo, provavelmente subestimando o
valor da oferta.
Em modelos mais sofisticados, os autores realizam
regressões múltiplas tendo como variável dependente o retorno anormal na janela
de 7 dias após a oferta. Há a diferenciação entre o alvo ter ou não capital
aberto e para cada um são aplicados os mesmos testes. Os resultados confirmam a
falácia do WACC para ambas especificações, os retornos cumulativos sendo
maiores quando o beta do ofertante é maior do que do alvo. Usando o coeficiente
de regressão e o valor médio das ofertas, podemos estimar uma perda média de 8%
(9% quando os alvos são de capital aberto) de valor quando o ofertante usa uma
taxa de desconto inferior para avaliar o alvo.
Dessa forma, o artigo mostra como as empresas
americanas estão sujeitas ao que se denominou de falácia do WACC, situação na
qual a taxa de desconto utilizada para avaliar os projetos das divisões é o
WACC da empresa como um todo (ou a taxa de desconto da divisão principal),
quando o certo seria utilizar a taxa adequada ao projeto de acordo com o seu
risco.
Phillip
Krüger, Augustin Landier e David Thesmar
Journal
of Finance. Volume 70. Ed. 3. 2015
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