quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Diluição

Quando há uma subscrição de ações ou oferta subseqüente primária, os atuais acionistas têm que decidir se exercem seus direitos (caso a oferta primária dê direitos preferenciais na aquisição das novas ações). A sugestão geral é que o investidor deve exercer esses direitos para que a sua participação na empresa não seja diminuída, nem que seja de 0,000001% para 0,00000099%. Essa redução que ocorre após uma subscrição ou uma oferta primária sem que o investidor tenha contribuído com sua parcela é chamada de diluição.

O Motley Fool tem um artigo que trata desse tema. A diluição, segundo os autores, pode ser ruim, boa ou ambígua. A má diluição é aquela que aumenta a quantidade de ações sem aumentar os fluxos de caixa da empresa (esse complemento é meu). O exemplo é a emissão de ações para pagar stock options dos executivos. Olhando para frente, isso não adiciona valor, embora possa ter adicionado caso tenha incentivado os executivos a terem um desempenho melhor. Dessa forma, é como dividir a mesma torta com mais pessoas.

A boa diluição é aquela que aumenta a quantidade de ações e também aumenta o fluxo de caixa da empresa. Os autores não puseram a questão dessa maneira, mas nada mais é do que realizar um projeto de Valor Presente Líquido Positivo. O custo é o valor pago para aumentar a quantidade de ações, ou seja, o valor da oferta ou da subscrição. A empresa deve receber esse dinheiro e investir em bons projetos de forma que gere valor presente igual ou superior a esse custo. Se conseguir isso, mesmo que o acionista não participe dessa captação, será beneficiado. Equivale a ter uma proporção menor de uma torta maior. Se isso não ocorrer, mesmo que participe, haverá uma perda.

Os exemplos usados pelos autores são de fusões e aquisições. Se há uma fusão e a relação de troca leva em conta um preço superavaliado da empresa, então a diluição é benéfica, porque os atuais acionistas receberão mais ações da nova empresa do que deveriam, prejudicando os acionistas da outra empresa. Outra forma seria a emissão de ações para investir em um projeto, que pode ser uma aquisição. Se o preço de emissão for superior ao preço justo, então haverá a emissão de menos ações (ou o recebimento de mais dinheiro com o mesmo número de ações) e isso diluirá menos os atuais acionistas, o que acaba aumentando o valor das ações. É como comprar algo que vale R$ 30 com um cheque de R$ 30,00 que na verdade vale R$ 25,00. O prejudicado, nessa situação, são os novos acionistas.

Toda essa discussão tem bastante apelo intuitivo. Para melhorar o entendimento, preparei uma explicação baseada na avaliação por fluxo de caixa descontado. A implementação está nessa planilha, que explica os procedimentos. O principal ponto é avaliar o preço por ação tanto por meio dos fluxos de caixa total (dividendos totais, no caso) quanto por meio do dividendo por ação com uma quantidade variável de ações. O preço deve ser o mesmo, nos dois casos. A planilha também mostra cálculos de retornos do investidor.

Na planilha, a pasta “Cenário 0” contém a situação em que a empresa não faz nenhuma captação, constituindo um cenário base. O dividendo no ano 0 é $ 100,00, o crescimento é de 5% a.a. e o custo do capital próprio é de 9%. Logo, o valor da empresa é de $ 2.625 (105/0,04) no ano 0. Se existem 100 ações, o preço por ação é $ 26,25.

Na pasta “Cenário 1”, há uma capitalização de $500 no ano 5 e o crescimento do dividendo não é alterado. Isso leva à destruição de valor, com o valor da empresa na data 0 sendo $ 2.300. Se não houvesse a capitalização, o valor seria o mesmo do parágrafo anterior. Se não houvesse o conhecimento de uma futura capitalização e esse evento fosse anunciado, haveria uma perda de 12,38%.

Na pasta “Cenário 2”, há a mesma capitalização, mas o crescimento após esse evento passa para 6% a.a.. Isso levaria o valor da empresa para $ 3.053. Logo, a capitalização adiciona valor gerando dividendos adicionais de um valor presente superior ao valor da captação. O ganho após o anúncio seria de 16,30%.

O caso mais geral, no entanto, não é o de uma captação em uma data tão longe, e sim mais próxima. Em geral, as empresas anunciam que estão estudando fazer emissão de ações e o mercado reage a essa nova informação. Na pasta “Cenário 3”, há a capitalização na data 0, sem aumento no crescimento do dividendo. O valor da" empresa é o mesmo, $ 2.625, porém, o preço por ação após a capitalização passa para $ 21,25 por conta da diluição. Isso destrói valor, representando uma perda de 19,05% para o investidor que tinha a ação por $ 26,25, preço da ação antes da capitalização.

A pasta “Cenário 4“ mostra a mesma situação, mas com o crescimento indo para 6%. O preço por ação passa para $30,33, gerando um ganho de 15,54%. Caso o crescimento seja de 5,62% (pasta “Cenário 5”), o valor da empresa passa para $ 3.165 e o preço por ação $26,25, ou seja, não há ganho nem perda no preço da ação. Ao valor inicial de $2.625 foi acrescido $500 da capitalização e o resultado foi de $3.165.

Cumpre ressaltar que em todos esses casos o retorno do investidor ao longo do tempo que compra mais ações para manter sua participação ou que não faz isso é o mesmo (o custo de capital), apenas diferindo, obviamente, o valor investido. Só muda o ganho ou a perda que ocorre após o anúncio de uma capitalização, conforme informado caso a caso. Se o investidor já tinha a ação, perderá ou ganhará de acordo com a destinação dos recursos captados. Se comprar a ação depois do anúncio, seu retorno será igual ao custo de capital.

A pasta stock options mostra o resultado da diluição por emissão de ações para stock options. Não há fluxo de caixa negativo, só um aumento nas ações, levando à destruição de valor. Nesse caso, não há como o investidor evitar a diluição.

Nos demais exemplos, a suposição era que a emissão se dava pelo valor justo da ação. A pasta “Aquisição superavaliada” mostra o caso em que o preço de emissão não é o valor justo. No exemplo, o valor justo deveria ser de $26,25 (os dados são os mesmos do cenário 5), mas a emissão é feita por $ 30,00. O resultado é que o valor da ação passa para $26,79. Na prática, poderia acontecer da ação ir à $30,00 e depois cair para $26,79. Os atuais acionistas ganhariam 2,06% em relação à $26,25, mas os acionistas que entraram na capitalização perderiam 10,70%. Se a aquisição for por troca de ações, o resultado seria o mesmo, com os atuais acionistas tendo maior parcela da empresa do que deveriam.

Um último caso é o contrário da diluição, a recompra de ações que diminui o número de ações e aumenta o dividendo por ação. É a torta sendo dividida por menos pessoas. Como certamente não haverá mudança nos projetos da empresa, o valor total da empresa deveria permanecer o mesmo. Conforme a pasta “Recompra” mostra, é o que ocorre. A recompra diminui o número de ações, aumenta o dividendo por ação e o preço é mais elevado. Porém, o valor total permanece o mesmo, assim como a taxa de retorno, igual ao custo de capital. A relação Preço/Dividendo por ação permanece a mesma, em 26,25, logo, a relação Preço/Lucro permanece a mesma, seja lá qual for a razão de distribuição de dividendos dessa empresa.

Resumindo: Vale a pena subscrever ações ou entrar em ofertas subseqüentes primárias para manter a mesma participação porcentual do capital da empresa? Por si só, manter a mesma participação não tem efeito algum. O investidor irá ganhar mais entrando na capitalização do que não entrando se o preço de emissão for inferior ao valor justo da ação. E, embora o discurso seja de manutenção, há, na realidade, um aumento no valor investido. Logo, o acionista deve considerar se deseja aumentar seu investimento nessa empresa julgando o preço de emissão e como a captação irá afetar o valor da empresa.

Logo, no fim é uma questão de julgar o valor da empresa. Se o acionista deseja aumentar seus investimentos, participará da emissão de ações e pode comprar a quantidade certa para manter a mesma participação. Ou pode comprar mais, ou menos, tanto faz.

Toda essa discussão girou em torno do valor justo. A avaliação de se o preço é justo ou não depende muito dos investimentos que a empresa fará com o dinheiro captado com o aumento no número de ações. Se o preço de emissão for o preço justo, considerando-se a qualidade dos novos projetos, o investidor pode comprar a ação e ter como retorno o custo de capital da empresa, se tudo se mantiver constante no tempo. A diluição, por si só, não irá afetar esse retorno. Pode acontecer do preço de emissão não ser o preço justo. Na verdade, como esse valor é uma abstração, certamente o preço de emissão não será exatamente o justo. Mas a questão não é mais se a diluição é boa ou ruim, e sim se o investidor considera o preço de emissão barato ou caro na hora de decidir se faz ou não mais investimentos.

9 comentários:

  1. Ótimo blog! Tudo muito bem explicado.

    Estamos te seguindo...

    Abç

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  2. Olá,

    Voltei aqui e estive lendo este artigo. Gostaria de fazer uma correção: ao recomprar suas ações, o índice P/L diminui, pois o cálculo deste é calculado pelo lucro por ação. E caso a empresa mantenha as ações em tesouraria por muito tempo ou as cancele, por lei seu valor deve ser debitado do patrimônio da empresa, melhorando assim a rentabilidade da mesma. Portanto a empresa vale mais nesse caso.

    Continue com o trabalho. Abraços!

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  3. Olá.

    1) Me expressei muito mal. O P/L após a recompra de ações é de fato alterado, porém, não de maneira diferente do que ocorre com a distribuição de dividendos.
    2) O patrimônio líquido é reduzido com a recompra de ações, mas não de uma forma que a distribuição de dividendos também não faça.
    3) Em nenhum dos casos, redução no P/L ou no PL, a empresa vale mais com a recompra do que se tivesse distribuído dividendos ou usado o caixa para remunerar o acionista de outra forma.
    4) Escrevi um texto detalhando esses pontos e irei publicar no futuro. Sobre seus comentários, é basicamente isso, mas dá para comentar outras coisas junto.

    Abraço!

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  4. especificamente no caso OGX o que haverá é a conversão de dívidas em ações (mais de 13 bilhões de dívidas que serão convertidos em ações) -- isso é loucura, primeiro que não haverá aumento de capital, dinheiro vivo vai entrar o estritamente necessário para produção, empresa com valor patrimonial, a princípio, de pouco mais de 600 milhões, e de repente com mais de 25 ou 30 bilhões de ações no mercado, mais que uma petrobras que tem um VP de 400 bilhos, como fica isso a partir do momento que os credores que receberam essas ações fizerem seu lançamento no mercado, que vai virar isso? alguém comente?

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  5. Você pode comentar a fusão da Oi com a PT e porque a provável diluição tem derrubado os papéis?

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    1. A Oi, desde os tempos da Telemar, é notória por suas histórias confusas e não estou suficientemente a par dos detalhes para comentar. O que sei é que o entendimento da CVM foi a de que a operação irá diluir, se for esse o caso, todos os acionistas indiscriminadamente. http://www.cvm.gov.br/port/infos/Oi-PT%20-%20Extrato%20da%20RC%2025032014%20-%20Recursos%20Oi%20e%20Tempo%20Capital.pdf

      Tentarei ver essa questão mais a fundo para um comentário próprio.

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  6. Olá Roberto. Sou novo por aqui. Parabéns pelo trabalho. Estou lendo o artigo. mas não consegui baixar a planilha para acompanhar o texto e o raciocínio. Como posso baixar?
    Abraço

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    1. Olá, desculpe o atraso. Eu posso mandar a planilha por e-mail ou por mensagem direta no Linkedin, como preferir (pode colocar o e-mail no comentário que eu excluo na moderação de comentários).

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