quinta-feira, 10 de maio de 2012

QI e desempenho dos investidores

(IQ, trading behavior and performance)
Mark Grinblatt, Matti Keloharju e Juhani T. Linnainmaa
Journal of Financial Economics. Volume 104. Ed. 2.

O efeito do QI no comportamento dos investidores já foi discutido anteriormente no blog com artigo também de autoria de Mark Grinblatt (ver aqui). Na ocasião, a questão era sobre a decisão de participar do mercado. Agora, a pesquisa é sobre o desempenho dos investidores em função do QI, também na Finlândia e com a mesma base de dados da câmara de compensação do país utilizada em outro artigo (ver aqui) publicado na mesma edição da edição especial do JFE algumas páginas depois. Estatísticas sobre QI veem de testes realizados para alistamento militar. O período da análise é entre 1995 e2002.

Os autores procuraram analisar como investidores com alto e baixo QI diferem em relação a vieses comportamentais e Analisando as estatísticas descritivas, os resultados de pesquisas anteriores sobre o efeito do QI na decisão de entrar no mercado fazem sentido, com o QI médio dos investidores sendo maior do que o QI médio da base inteira. Além disso, na separação em nove grupos, os quatro de menores QIs representam 41% da base total, mas apenas 24% da base de investidores. Criando carteiras com base em grupos de QI, não há diferenças significativas na exposição a fatores de risco. O desempenho de um mês dos investidores de maior QI é marginalmente menor do que o desempenho dos de menor QI, porém, calculando retornos de um mês os resultados são inversos e mais significativos. Um número maior de investidores de alto QI compra ações na mínima do mês e vendem na máxima do que investidores de baixo QI. A tendência de “seguir a manada”, medido pela razão entre as ações compradas dividido pelo número de ações compradas ou vendidas na semana passada, é menor para investidores de maior QI.

As estatísticas descritivas afirmam que os investidores com maiores capacidades cognitivas são menos suscetíveis a vieses comportamentais e conseguem maiores retornos, mas são necessárias análises mais profundas para se chegar a alguma com conclusão mais concreta. A primeira análise multivariada é a respeito da tendência dos investidores em vender ou manter ações já compradas. Os autores usam como principal variável independente o QI, que tem como valor -1 o grupo com menor QI e +1 o com maior QI (0 sendo o grupo mediano). Sem relacionar com QI, os autores notam que as ações com retornos negativos (sem incluir dezembro) são menos prováveis de serem vendidas, enquanto que as ações em alta têm maior probabilidade de serem vendidas. Na parte negativa, há uma relação monotônica, as ações com pior desempenho tendo maior chance de serem vendidas do que as com desempenho menos ruim. Isso não acontece no caso das altas, as ações com altas mais modestas tendo maior chance de serem vendidas. Os resultados confirmam que investidores pessoa física sofrem do efeito disposição, a propensão a não se desfazer de maus investimentos. Porém, controlando conjuntamente por QI, os autores notam que investidores com maior QI são mais propensos a venderem ações perdedoras e os com menor QI menor propensão.

Outra questão é a venda para fins de compensação tributária. De forma geral, os investidores são mais propensos a venderem ações perdedoras em dezembro e menos propensos a venderem ações ganhadoras. Interagindo o retorno com o QI, nota-se que investidores com maior QI valem-se mais do gerenciamento tributário. Dessa forma, o investidor mediano está sujeito ao efeito disposição na maior parte do ano, mas busca benefícios tributários em dezembro.

Investidores com maior QI têm maior tendência de comprar as ações na mínima do mês e vender na máxima do mês do que os com menor QI. Isso se configura na adoção de estratégias contrárias, e a utilização desse esquema de investimentos pode se dar por maior habilidade ou por viés comportamental. Se estudos anteriores sobre estratégias contrárias estiverem corretos, é provável que maior habilidade seja a melhor explicação. Os autores analisaram o efeito manada através do indicador mencionado acima, mas relativos apenas para vendas (número de ações vendidas por outros investidores / número de ações vendidas e mantidas por outros investidores). Os resultados mostram que esse indicador está positivamente relacionado com a propensão individual para vender, confirmando o efeito manada. Porém, interagindo esse indicador com a variável de QI, perde-se a significância estatística, o que indica que investidores de alto QI não são suscetíveis ao efeito manada.

Estudando agora as compras também, os autores analisam a propensão dos investidores de agirem junto com investidores de QI semelhante. Tanto na compra quanto na venda, o comportamento dos investidores de menor QI (grupos 1-4) é mais correlacionado com o comportamento de investidores com QI semelhante (grupos 5 e 6) do que com os com maior QI. Analisando agora os investidores com maiores habilidades cognitivas, não há muita relação significativa com as compras ou vendas dos investidores com outros níveis de QI, mas a diferença é maior com o grupo de menor QI. Em suma, os investidores tendem a agir de forma parecida com investidores com níveis significativos de inteligência.

Após investigar o comportamento dos investidores, os autores passam a analisar o desempenho. Considerando toda a base, os investidores de maior QI (grupo 9) conseguem retorno maior do que os de menor QI (grupo 1-4). Controlando por patrimônio, a tendência é que os resultados se mantenham, mas muitos testes não passam na significância estatística. Os autores também ponderam os retornos pela taxa de participação, notando que as diferenças entre os grupos de QI aumenta, indicando que investidores de menor QI possuem piores habilidades de market timing.  Isso também se percebe em um gráfico que mostra que a taxa de entrada dos investidores de maior QI é maior no começo do período, mas reverte durante a bolha pontocom (que aparentemente também ocorreu na Finlândia, embora em menor escala do que nos EUA). Ou seja, há diferenças entre os investidores de diferentes níveis de inteligência também em relação à taxa de entrada no mercado.

Esses resultados podem se dar por outros fatores não considerados, de forma que o próximo passo natural é realizar análises multivariadas controlando por uma série de fatores dos ativos e dos investidores (incluindo patrimônio). Em diversas janelas de tempo, a principal sendo [0,0] (ou seja, day trades), as ações compradas pelos investidores de menor QI tiveram um desempenho pior do que as compradas por investidores dos grupos de maior QI, com a diferença crescendo com a inteligência. Os resultados são mais significativos para prazos menores do que 22 dias. Considerando as vendas, os resultados são bem menos significativos, de forma que não é possível afirmar que haja influência da inteligência nas operações compradas. Experiência, medida pelo número de operações realizadas, não está relacionada com o desempenho exceto no curto prazo.

Por fim, os autores analisam a questão dos custos de transação, mais especificamente, a diferença entre a melhor ordem de compra e a melhor oferta de venda. Esse é um custo de transação na medida em que o investidor deve pagar um preço superior ou aceitar um preço menor para operar imediatamente (ou seja, sacrifica um pouco de retorno por maior liquidez de curtíssimo prazo). Isso afeta principalmente as ordens a preços de mercado, de forma que escolher o momento certo de utilizar esse tipo de ordem é crucial para os retornos, principalmente de curto prazo. Os autores possuem os preços e os tipos de ordens dos investidores, porém, por um período de tempo menor (três anos). Examinando apenas as ordens a mercado, por enquanto, a análise dos retornos considerando variáveis de controle indica que os investidores de maior QI conseguiram um maior retorno, agora definido como a diferença entre o ponto médio entre a melhor oferta de compra e a de venda e o preço de compra/venda. Isso indica que esses investidores escolheram os momentos em que a diferença entre os preços era menor. A diferença entre o preço de compra e o ponto médio costuma ser negativa e menos negativa quando a diferença entre as ofertas de compra e de venda são menores, e o melhor desempenho dos investidores de maior QI indica que eles enviaram ordens a mercado em momentos em que a diferença é menor.

Realizando o mesmo tipo de análise para ordens limitadas, os autores também encontram evidências de que os investidores de maior QI conseguem maiores retornos, embora a significância dos resultados seja menor do que no primeiro teste. A principal referência agora foi a diferença entre o preço de compra/venda e o de fechamento, e o maior resultado indica que os investidores mais inteligentes colocaram ordens limitadas em momentos de menor risco de negociar com um investidor mais bem informado. Análises adicionais mostram que investidores mais experientes colocam ordens a mercado ou limitadas nos momentos mais propícios e que investidores com maior patrimônio conseguem maiores retornos analisando apenas as ordens a mercado (os resultados não foram significativos para ordens limitadas).

Juntando os resultados do desempenho, a conclusão é que os custos de transação estão relacionados com o QI, com a experiência e a riqueza, esses últimos dois fatores não tendo relação com o desempenho, de forma que QI deve estar relacionado com habilidade.

Em resumo, investidores com habilidades cognitivas superiores são menos propensos a vieses comportamentais, realizam maior compensação tributária, conseguem menores custos de transação e isso resulta em maiores retornos. Há de se observar que esses resultados são relativos a investidores de menor QI, e não foi feita uma análise em termos absolutos. Falta ainda, segundo os próprios autores, descobrir o mecanismo através do qual investidores de maior QI conseguem retornos superiores (melhor interpretação de informações públicas, acesso a informações privadas ou internas...?). 

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