Esse será um texto diferente dos demais.
Geralmente, procuro algum artigo interessante e escrevo um resumo de suas
ideias. Neste daqui, vou resumir um pouco das minhas ideias desenvolvidas ao
longo dos meus anos de estudo e trabalho. Uma diferença notável é que será um
texto completamente em primeira pessoa, diferente do modo como costumo
escrever.
A hipótese de mercados eficientes é um tema
recorrente deste blog. Criei uma subpágina
do blog para esse tema e para alguns outros, onde eu pretendia resumir tudo que
já escrevi sobre o tema em uma espécie de “o que sei até o momento”. Como
escrevi em algum dos textos sobre o assunto, a HME é uma teoria incômoda. Do
lado positivo, gerou um debate que muito contribuiu para o avanço do
conhecimento sobre o mercado financeiro. Por outro lado, questiona a própria
existência de uma série de instituições e profissões e mexe com egos e com
bolsos.
Não poderia ser diferente comigo. Eu sou um
investidor pessoa física e cuido de minhas próprias aplicações. Já fui trader, já comprei ações com base em
análise fundamentalista, participei de IPOs (escrevi
TCC sobre isso), abri conta em gestores independentes etc. Se minha
experiência profissional não é vasta, já fiz praticamente de tudo como
investidor individual. Se essas operações não me tornaram rico, ao menos me
fizeram entender melhor como o mercado funciona da ponta do cliente.
E em dado momento, conforme ia estudando Finanças,
inclusive HME e desempenho
de fundos, comecei a ter “crises de identidade”, por assim dizer, que julgo
serem comuns para quem estuda a sério esses temas. Será que eu, justamente eu,
sou capaz de gerar
alfa? Se não, para que investir, para que estudar sobre Investimentos? Por
que não colocar o dinheiro em um ETF de Ibovespa e em um fundo DI, rebalancear
a carteira periodicamente e fazer outra coisa da vida?
A resposta que encontrei estava nos meus estudos
sobre retorno de ativos: eu não preciso
procurar o alfa. E também não preciso seguir uma gestão
de carteiras completamente passiva. Aliás, acho que não sou só eu que
procurou responder intelectualmente o desafio da HME e profissionalmente o da
gestão passiva. (Na verdade, não procuro responder profissionalmente
propriamente dito, mas na minha própria gestão de carteiras). Duas dessas
respostas, que são temas em voga, são o smart
beta e a gestão
núcleo-satélite (ainda não escrevi sobre esses temas), que procuram
conciliar gestão passiva e gestão ativa.
Eu ainda não li o livro sobre gestão
núcleo-satélite, mas achei interessante a ideia de separar uma parte da
carteira para investimentos “nucleares” e investimentos “satélite”. Alguns
investimentos eu mantenho para longíssimo prazo, enquanto que outros não
necessariamente. Ainda não configurei a minha carteira assim, mas penso que
seria interessante manter uma parcela (70%, digamos) em investimentos de longo
prazo procurando correr exclusivamente
risco de mercado. Nessa parte, uma porcentagem vai para ações em fundos
indexados ou ETFs e outra parte iria para renda fixa. Na parcela de renda fixa,
atualmente mantenho NTN-B Principal longíssimas, mas não tenho certeza se essa
é a melhor abordagem, pois corro risco de mais tipos do que se investisse em um
pós-fixado em juros. Quando lançarem o ETF de Renda Fixa posso rever essa parte
da carteira.
Até aqui, tudo de acordo com a gestão passiva. Na
parte periférica da carteira, penso em investir de maneira mais ativa. Porém, e
aqui está a minha tese pessoal desse texto, não irei em busca de alfa, de um
erro de precificação. Aqui a minha ideia é
correr os riscos que pareçam estar sendo melhor recompensados no momento.
Sobre precificação de ativos, entendo que é muito difícil distinguir um erro de
precificação de uma taxa de desconto que incorpora riscos que você não está levando
em consideração. Quando o mercado está no pico, como ocorreu em 2007-2008,
não dá para saber ao certo se as perspectivas dos fluxos de caixa futuros estão
justificadamente boas, se o mercado está estimando errado os fluxos de caixa,
se o mercado está estimando errado a taxa de desconto, se os investidores estão
menos avessos ao risco, se a liquidez está elevada etc. O que alguém poderia
dizer é que o risco não está sendo compensado como até alguns anos atrás era.
Dizer que o mercado está caro pode significar justamente isso: que não compensa
assumir risco de mercado com o atual retorno esperado. Não sei se o mercado
está mal precificado ou quando vai corrigir caso esteja. O que alguém pode
imaginar é que o risco não compensa o retorno.
O que quero dizer é que é possível obter retornos
superiores correndo riscos quando as pessoas estão fugindo dele, independente
do risco estar sendo bem ou mal precificado. Isso não gera necessariamente
alfa, já que todo o retorno que você conseguir dessa maneira pode ser explicado
pelo risco incorrido, mas talvez no final das contas você possa olhar para o
seu retorno e dizer que valeu a pena.
Warren Buffett tem uma frase famosa que diz que
você deve ser corajoso quando todo mundo está com medo e receoso quando todo mundo
está corajoso. É basicamente isso que argumentei anteriormente: você deve assumir risco quando o preço do
risco estiver baixo. Quando falo aqui em “preço do risco” baixo, estou
querendo dizer que ninguém quer assumir esse risco e todo mundo que o tem quer
se livrar dele. Não é um conceito existente, só uma maneira que encontrei para
expressar o que penso. Comprar ações em um mercado de baixa é trocar liquidez
por risco de mercado, quando a liquidez é mais valorizada e quando o preço (ou
apreço) do risco de mercado está mais depreciado.
Nesse referencial, julgo mais importante conhecer
sobre risco e saber identifica-lo do que analisar se um ativo está precificado
de maneira correta. Talvez seja só uma mudança de perspectiva, mas acho que
essa é uma boa maneira de ver o mercado.
Por exemplo: você faz uma análise fundamentalista
por múltiplos bem simples e vê que uma ação está sendo negociada a uma relação
Preço/Valor Patrimonial abaixo dos seus pares. Isso pode significar que a ação
está sendo precificada incorretamente, ou que você deixou de considerar algum
risco. Talvez seja o risco de liquidez (uma vez, comprei CGAS5 com base em uma
análise desse tipo, ignorando que a ação tinha baixa liquidez). Talvez seja
risco político, como no caso de Banco do Brasil, que (ao menos da última vez
que vi) sempre era negociada abaixo dos outros bancos. O que sei é que a taxa
de desconto utilizada pelo mercado incorpora uma série de riscos que até hoje
não foram muito bem entendidos e quantificados.
Uma maneira de enquadrar o que estou querendo dizer
é imaginando que o mercado financeiro é um grande cardápio de riscos. A qualidade desses riscos varia no tempo, mas
mantém características básicas. Risco de crédito é a possibilidade de um
emissor se tornar inadimplente. O risco de liquidez é a possibilidade de não
conseguir liquidar um investimento ou ter que fazê-lo com grande desconto.
Risco de duração é a variação do preço em função das taxas de juros. Risco
político é a possibilidade do governo tomar alguma decisão contrária a uma
empresa. Esses e uma infinidade de outros riscos existem, afetam de maneira
diferente cada ativo e a sua recompensa varia no tempo.
Retomando o início do texto, a parte núcleo da
carteira basicamente assume risco de mercado e nada mais (se possível),
enquanto que na parte satélite o investidor pode abrir o cardápio e escolher
qual risco quer correr. Não gosta de risco de crédito, não suportaria ver um
investimento perdendo todo seu valor? Ignore esse risco. Tem liquidez e o mercado
está em baixa, mas não consegue comprar ações agora? Ignore essa oportunidade. Não
se importa que um título de renda fixa tenha desvalorizações no curto prazo e
quer uma taxa elevada? Compre títulos longos. E por ai vai.
Desse ponto de vista, que é bem pessoal, a análise deveria
estar mais voltada para a identificação de riscos que estejam fornecendo bons
retornos em relação ao risco e que podem ser aproveitados caso o investidor
aceite correr esse risco. Assuma que o mercado precifica corretamente o ativo e
veja se ele fornece um retorno que você
considera bom a um risco que você pode assumir. Aqui, o retorno é o
produto, o risco o seu preço. Como todo produto, veja se ele vale o seu preço
e, se for o caso, vá em frente e compre.
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