Nessa seção, vou resumir todas as discussões a
respeito do desempenho de fundos de investimento de uma maneira organizada e
unificada. Ao invés de consultar vários textos sobre o assunto, essa página
terá tudo que já escrevi sobre o tema. Alguns dos segmentos abaixo é mera cópia
do texto original, com algumas adaptações necessárias.
Introdução
A análise de desempenho de fundos é um subproduto
das teorias sobre retornos de ativos e da discussão de mercados eficientes. O
primeiro conjunto de teorias criou o referencial necessário para podermos
examinar os retornos de uma maneira mais rigorosa. Ao longo do tempo,
aprendemos que não basta olhar os retornos brutos e que devemos considerar o
risco do investimento e o retorno de aplicações alternativas. O desenvolvimento
de modelos de precificação de ativos permitiram controlar os retornos pelo
nível de retorno e com o tempo os economistas imaginariam que isso poderia ser
aplicado a uma carteira de ativos. A hipótese de mercados eficientes, outro
subproduto da teoria de retorno de ativos, gerou o questionamento sobre se os
gestores de fundos são capazes de obter retornos superiores.
Desempenho
de fundos e CAPM
Em 1968, Michael Jensen publicaria o principal
trabalho a respeito de desempenho de fundos com base nos modelos de
precificação de ativos (Jensen
(1968)). No começo do artigo, anunciaria que a análise era difícil no
passado pela falta de um modelo que trabalhasse com a relação entre o risco e o
retorno, o que seria resolvido com o advento do CAPM poucos anos antes. Segundo
Jensen, trabalhos anteriores buscavam determinar o desempenho de um fundo em
relação a outro, mas o que era necessário é a análise do retorno absoluto.
Jensen partiria do CAPM, mas não seria uma
abordagem sem uma dose de originalidade. A medida do desempenho relevante seria
o alfa da regressão do CAPM, que depois seria conhecido como Alfa de Jensen.
Analisando 115 fundos entre 1945 e 1964, Jensen encontrou um alfa médio de
-1,1% a.a., com 76 fundos com alfa negativo e 39 positivo sem considerar a
significância estatística. Se formos considerar a significância estatística,
apenas 3 fundos mostraram alfa positivo, quando seria de se esperar que entre 5
e 6 fundos mostrassem alfa significativamente positivo pelo acaso.
A conclusão de Jensen é que não há evidências de
habilidades de seleção de ativos por parte dos gestores de fundos nem na média
nem individualmente.
Contra-argumento
de Ippolito
Mais de duas décadas após o trabalho de Jensen, Ippolito (1989) replicaria a análise de Jensen para o
período 1965-1984, com resultados diferentes. Dos 143 fundos analisados e utilizando retornos líquidos
de despesas (exceto taxa de carregamento), os alfas foram nulos para 127,
positivos para 12 e negativos apenas para 4 (levando-se em conta a
significância estatística), com alfa médio de +0,81. Há mais fundos com alfa
positivo do que deveria ter por mera chance (que seriam 7 ou 8) e o alfa médio
agora é positivo (0,81), indicando que os gestores teriam habilidades de
seleção na média.
Retomando ideias de Grossman e Stiglitz (1980), o autor analisou se fundos mais caros (com taxas de carregamento, de administração e despesas maiores) e que giram mais a carteira obtém retornos superiores (ajustados pelo risco), o que deveria ocorrer se Grossman e Stiglitz estiverem certos. Isso é testado por meio de uma regressão linear com uma equação parecida com a do alfa de Jensen, sem o alfa e com variáveis para estudar cada uma das variáveis mencionadas no começo do parágrafo. O efeito das despesas e do giro no retorno em excesso é nulo, o que acaba indicando que os gestores dos fundos conseguem retornos que pelo menos compensam os custos do fundo e que o giro da carteira pode não melhorar o desempenho, mas também não piora. O único fator que teve um efeito positivo nos retornos foi a taxa de carregamento que, pelas contas do autor, são compensadas por maiores retornos no período de 5 ou 6 anos. Isso corroboraria a visão de Grossman e Stiglitz sobre eficiência de mercado ao mostrar que o custo de se obter informações é compensado por retornos superiores de forma que ao menos compensem os custos.
Análise
multifatores
Porém, na discussão sobre mercados eficientes, há a
questão da hipótese conjunta entre o modelo de precificação de ativos e a
eficiência de mercado. Então, pode ser que os gestores realmente consigam
retornos superiores, ou que o modelo de análise utilizado estava errado.
Elton et. al. (1993) reexaminaria os resultados obtidos por
Hipólito, fazendo correções que achavam necessárias. O principal erro foi não considerar o efeito de ações que não fazem
parte do S&P 500 ou títulos de renda fixa. Se a comparação for feita com o
S&P 500, um fundo poderia obter retornos superiores investindo em ações que
não fazem parte do índice, empresas de menor tamanho em geral, sem ter nenhuma
habilidade superior. O risco dessas outras ações não seria captado pela
regressão com o S&P 500, dando a entender que a relação risco-retorno foi
boa. Analisando todas as ações listadas na NYSE (com a base de dados CRSP),
dividindo por tamanho, as ações de empresas menores teriam retorno maior no
período 1965-1984. Ou seja, mesmo sem qualquer habilidade superior de seleção
de ações, alguém que só investisse em ações de pequeno porte ou que não
fizessem parte do S&P 500 teria um desempenho superior nesse período. Como
o objetivo é analisar as habilidades superiores dos gestores por meio do alfa,
fica claro ser necessário um ajuste para ativos que não fazem parte do S&P
500.
Para resolver esse problema, os autores fizeram um modelo de três
índices. A análise é feita imaginando que um fundo é como se fosse composto por
três carteiras: uma composta por ações do S&P 500, outra por ações fora
desse índice e uma terceira com títulos de renda fixa. Cada “subcarteira” é
comparada com o índice passivo relevante por meio de análises de regressões
múltiplas. Se o fundo tem desempenho superior, o alfa da regressão deve ser
positivo (e estatisticamente significativo). O índice para ações do S&P 500
é o próprio índice, para as outras ações são utilizados dois índices (índice de
small-caps e índice com todas as
ações da NYSE menos as que estão no S&P 500) e para renda fixa foi
utilizado um índice composto por 80% de títulos governamentais e 20% de títulos
corporativos de longo-prazo (deveria ter sido utilizado o índice Shearson
Lehman, porém, o histórico não cobria anos anteriores a 1973).
A análise de 143 fundos nos Estados Unidos mostrou que o alfa médio é
negativo e que por volta de 2/3 dos fundos possui alfa negativo (-0,88%),
havendo apenas um fundo com alfa positivo ao nível de significância de 5%.
Fazendo separações em termos do Beta em relação ao S&P 500, pela
porcentagem de ações na carteira e por estilos, o alfa negativo persiste em
todas essas classificações.
Separando os fundos pelos graus de despesas e de giro das carteiras, e usando o mesmo modelo, o alfa médio não só é negativo como é mais negativo para os fundos que mais giram e têm maiores despesas. Ou seja, os resultados não indicam tal recompensa pela busca por informação prevista por Grossman e Stiglitz. Fundos que cobram taxa de carregamento não só não geram alfa positivo que cubra o carregamento como geram alfas mais negativos do que os fundos que não cobram. Não há evidências de que fundos cobram mais por desempenho passado já que a maior mudança porcentual positiva nas despesas se dá entre os fundos de pior desempenho.
Separando os fundos pelos graus de despesas e de giro das carteiras, e usando o mesmo modelo, o alfa médio não só é negativo como é mais negativo para os fundos que mais giram e têm maiores despesas. Ou seja, os resultados não indicam tal recompensa pela busca por informação prevista por Grossman e Stiglitz. Fundos que cobram taxa de carregamento não só não geram alfa positivo que cubra o carregamento como geram alfas mais negativos do que os fundos que não cobram. Não há evidências de que fundos cobram mais por desempenho passado já que a maior mudança porcentual positiva nas despesas se dá entre os fundos de pior desempenho.
Modelo de
Três Fatores
Elton et.al. (1993) utilizariam uma abordagem
semelhante ao modelo de três fatores apresentado em Fama
e French (1993), mas desenvolvido independentemente. Após a publicação do
artigo sobre o modelo em 1993 e a sua disseminação entre os economistas
financeiros, o modelo se tornaria padrão para a análise de retornos e poderia
facilmente ser utilizado para analisar o desempenho de fundos.
Carhart
(1997) estudou a persistência
de desempenho dos fundos (se antigos vencedores continuam vencedores). Carhart
acrescentou um novo fator ao modelo
de Fama e French (PR1YR, carteira
formada pelas ações de melhor desempenho nos últimos 12 meses menos as ações de
pior desempenho), separou os fundos em decis em relação ao seu desempenho
passado e encontrou alfas negativos (ou não distinguíveis de zero) em todos os
decis. Maiores despesas e taxas, giro e taxas de carregamento pioram os
resultados dos fundos.
Fama e French (2010) analisaram o desempenho de fundos no período 1984-2006. Em regressões utilizando o CAPM, o modelo de três fatores e o de quatro fatores (o mesmo usado por Carhart), calculando os retornos médios dos fundos com média simples ou ponderada por valor, o alfa dessas seis análises é negativo e estatisticamente significativo e o r-quadrado variando entre 96% e 99%.
Fama e French (2010) analisaram o desempenho de fundos no período 1984-2006. Em regressões utilizando o CAPM, o modelo de três fatores e o de quatro fatores (o mesmo usado por Carhart), calculando os retornos médios dos fundos com média simples ou ponderada por valor, o alfa dessas seis análises é negativo e estatisticamente significativo e o r-quadrado variando entre 96% e 99%.
Aritmética
da Gestão Ativa
Em 1991, William Sharpe publicaria um artigo com um
argumento bem simples, mas bastante revelador. Através de raciocínio matemático
básico, sendo necessário apenas conhecer as quatro operações, o autor argumenta
em Sharpe
(1991) que:
1) Antes
de custos, gestão passiva e gestão ativa produzem em média o mesmo retorno
2) Depois
de custos, a gestão ativa perde para a gestão passiva
Na média, os investidores que utilizam gestão ativa
conseguirão retornos médios antes de custos. Se assim for, então,
consequentemente os investidores ativos irão obter retornos médios também.
Porém, os custos da gestão ativa são maiores, de forma que, depois dos custos,
o retorno médio da gestão ativa é inferior.
O autor faz algumas observações sobre esse raciocínio e sobre os
retornos serem “devidamente calculados”. A primeira é que nem todos os fundos
indexados são verdadeiramente passivos, podendo tentar utilizar uma amostra do
mercado ao invés de comprar todos os ativos (segundo o autor, o fundo só seria
realmente indexado se possuísse todos os ativos em seus respectivos pesos, o
que não é muito factível). As análises geralmente só levam em conta os
investidores institucionais e os fundos possuem sempre outros ativos em
carteira além de ações (principalmente caixa para fazer frente aos resgates).
Por fim, alguns cálculos de média deixam de considerar o tamanho de cada fundo
e as comparações de retornos de fundos ativos deveriam ser feitas com base em
fundos passivos, não em outros fundos ativos.
Dessa forma, não é de se estranhar que pesquisas, como as mencionadas
anteriormente, mostrem que o retorno dos fundos ativos seja inferior. O autor
não mostra nenhuma evidência de que isso ocorra, mas é uma expectativa bastante
intuitiva. Porém, o autor não descarta que alguns investidores ou mesmo tipo de
investidores (fundos de pensão, no exemplo do autor) possam obter um retorno
superior, mas nota que esses devem ser uma minoria. Assim, nesse simples
artigo o autor não fala que o desempenho considerando-se o risco dos fundos
ativos será inferior (o autor nada fala de seu famoso índice de retorno por
variabilidade ou “Índice de Sharpe”) e nem que seria possível vencer o mercado
de forma persistente escolhendo o melhor gestor (ou sendo o melhor gestor).
Mas, em termos de retornos médios, o raciocínio faz todo sentido.
Dessa forma, o apelo em favor dos fundos de gestão
passiva e a inabilidade dos gestores ativos em selecionar ativos subavaliados
independem da Hipótese de Mercados Eficientes. O raciocínio de Sharpe não
precisa em momento algum que o mercado seja eficiente para ser considerado
válido. John Bogle enunciaria a Hipótese de que Custos Importam, apontando como
um dos problemas para a rentabilidade ao investidor os custos incorridos pelos
fundos e repassados aos investidores.
Custos e
desempenho de fundos
Em dois artigos, John Bogle trata da relação entre os custos
dos fundos de investimento e seu desempenho. Em Bogle
(1998), analisa os fundos com base na classificação da Morningstar em uma
matriz 3 x 3 com estilos na coluna (valor, crescimento e misto) e tamanho (das
empresas) nas linhas no que faz Bogle lembrar do jogo da velha (Tic-Tac-Toe). O
período de análise é curto, cinco anos entre 1992 e 1996.
Inicialmente, o autor descreve o retorno (sempre líquido de
custos e impostos), o risco e o índice de Sharpe típico em cada uma das células
da matriz. Analisando individualmente cada grupo classificando os fundos em
quartis de acordo com seu retorno, o risco não varia muito dentro de cada
quartil, de forma que o índice de Sharpe é determinado especialmente pelo
retorno. Seria desejável, então, tentar estimar o que levaria a um maior
retorno e a hipótese do autor é que os custos do fundo possam jogar alguma luz
na questão.
Analisando cada categoria individualmente, agora
classificando em quartis de custos, os retornos são maiores para os fundos de
menor risco, o risco é praticamente constante em cada quartil e, com isso, o
índice de Sharpe é maior para os fundos de menor custo. Esses resultados são
confirmados em regressões simples entre o retorno (variável dependente) e o
custo. Analisando as categorias na matriz 3 x 3, os fundos de menor custo
tiveram retornos acima da média enquanto os fundos de maior custo tiveram
retornos abaixo da média em quase todos os grupos. A conclusão é: para
desempenho de fundos, custo importa e, como o autor viria a afirmar em um livro
escrito anos depois, o Dose Certa, os
investidores pagam por aquilo que não recebem.
Fundos indexados são de baixo custo, e o autor passa a
analisar o desempenho desses fundos em comparação com os demais. Na matriz,
fundos passivos de seis grupos possuem retornos superiores, dois muito próximos
da média (pouco a mais, ou pouco a menos) e apenas um (small cap-growth) gera retornos inferiores. Porém, em todas as nove
categorias o risco dos fundos passivos é menor, de forma que apenas o grupo de
pior desempenho citado anteriormente possui índice de Sharpe pior. Isso também
serve para mostrar que a indexação funciona para outros tipos de ações além
daquelas de grandes empresas. O autor termina com uma comparação entre o jogo
da velha e a gestão ativa, os dois sendo uma competição que praticamente
independe da habilidade.
Minor (2001) faria algumas observações a respeito
desse artigo, se propondo a contar “o resto da história”. O autor refaz a
análise com outra janela de tempo (1990-1994), chegando aos resultados opostos.
A conclusão é a de que os resultados são sensíveis à janela de tempo escolhida
e que não é possível fazer uma generalização tão forte quanto a que Bogle fez.
Em resposta, Bogle publicou outro artigo
(Bogle (2002)) publicado na mesma
revista. O nome do artigo de Minor era Beware
of índex fund fundamentalists e Bogle aparentemente gostou da alcunha, seu
artigo se chamando An índex fund
fundamentalist e viria a se reafirmar como fundamentalista da indexação em
seu livro. O período de tempo foi aumentado para 10 anos terminados em junho de
2001. Nessa nova janela, os resultados se mantém parecidos, o retorno sendo
maior para os fundos de menor custo, mas com o risco sendo também menor (e não
parecido) e consequentemente o retorno ajustado ao risco maior. Analisando os
fundos indexados, a vantagem ainda existe, mas diminui em relação ao período
anterior, se tornando quase nula comparando com os fundos de baixo custo, mas
não indexados.
O que o autor não havia mencionado anteriormente é que os
retornos de fundos ativos são superestimados. Sem procurar quantificar a
questão, ele cita o viés de sobrevivência (apenas os fundos que sobrevivem,
aqueles de melhor desempenho, entram nas contas), o retorno inicial de IPOs que
não são recorrentes e impactam especialmente os fundos menores e custos de vendas
(taxa de carregamento, imagino). Após levar em conta esses fatores, é possível
que a vantagem mencionada seja ainda maior em favor dos fundos passivos.
Bogle é o fundador da Vanguard, que introduziu os fundos
indexados no mercado. As conclusões são bastante convenientes para ele, mas os
resultados só deveriam ser desconsiderados se for provado que os números estão
incorretos. Porém, não é difícil argumentar que os custos importam e que,
seguindo a simples aritmética, como visto anteriormente, fundos indexados irão
ter desempenho melhor após os custos do que fundos ativos. O investidor, então,
deveria procurar focar em minimizar os custos dos seus investimentos, não só em
fundos, mas em aplicações diretas também. No mercado financeiro, frequentemente
paga-se por aquilo que não se recebe.
Aritmética
do “Tudo Incluso”
Três artigos publicados na Financial Analysts
Journal discutem a relação entre custos e desempenho de fundos. O primeiro é um editorial da revista
escrito por Charles Ellis, publicado na edição de 2012 (maio/junho). Ellis
(2012) analisa a opinião geral de que os custos são baixos. De fato,
observando-se a forma como é expressa, uma modesta porcentagem de 1% ao ano ou
até menos, pode parecer baixa. Porém, é necessário observar que essa
porcentagem incide sobre todo o principal, não sobre o lucro. Calculando a taxa
de administração sobre o lucro, e não sobre o ativo, pode fazer com que esse
custo pareça maior, como de fato é. Em uma conta simples (e imprecisa), se o
retorno é de 10% e a taxa de administração é de 1%, o investidor pagou 10% de
seu lucro em taxa de administração, o que já não parece mais tão baixo. Para
fundos de gestão ativa, com taxas de administração maiores, seria necessário
calcular a taxa como um acréscimo em relação a fundos de gestão passiva (que,
segundo Ellis, podem chegar a cobrar taxas de 0,20% para investidores pessoa
física, o que nem fundos DI cobram do público geral no Brasil). Nessa
perspectiva, Ellis estima que os custos incrementais podem representar até 50%
dos ganhos incrementais. Pior, ganhos acima do mercado são raros. Agora o custo dos fundos
definitivamente não parece baixo.
Partindo
desse editorial, Sharpe
(2013) estende o artigo clássico do autor sobre a aritmética da gestão
ativa procurando calcular de maneira mais exata os seus argumentos. Mais
especificamente, calcula a diferença do patrimônio final entre fundos com
custos menores e maiores (TWR). Considerando que o retorno bruto dos dois
fundos seja o mesmo, essa razão depende da diferença entre os custos e o
horizonte de tempo. Comparando um investimento único em um fundo de ações com
taxa de 0,06% (um fundo da Vanguard) e outro de 1,12% (que é a taxa média), em
10 anos essa razão é de 1,1125, ou seja, o investidor de baixo custo obteve
11,25% a mais do que o de alto custo. Em 30 anos, a diferença é de 38%. Note
que esse cálculo independente de estarmos utilizando retornos reais ou nominais
e independe da inflação.
O
cálculo muda se formos considerar vários aportes ao invés de um único no começo
do período e agora o ideal é utilizar fluxos de caixa e taxas de retorno reais.
Nessa situação, quanto maior a taxa de retorno, maior será a TWR, porque quanto
maior a taxa de retorno, maior a contribuição dos primeiros aportes com menores
taxas de despesas. Comparando o investimento único com múltiplos aportes, o TWR
será menor para o segundo caso, tudo o mais constante. Para 30 anos e as mesmas
taxas, a TWR varia de 1,175 e 1,26 dependendo do retorno real.
Para
adicionar realismo, o autor realiza simulações de Monte Carlo baseada em
parâmetros históricos. O retorno do fundo de maior taxa é igual ao retorno do
fundo de menor taxa mais um erro com valor médio igual a zero e um
desvio-padrão que depende do grau de risco do fundo (para fins de simulação,
serão utilizados vários valores para o desvio-padrão). Para um investimento
único, o TWR será maior do que 1 em 99% dos casos com desvio-padrão de 0,025
para o erro e em 90% para desvio de 0,05. Em todos os casos, a chance do TWR
ser superior a 1,38 é de 50%. Os resultados são semelhantes para o caso de
múltiplos investimentos.
John
Bogle recria o argumento incluindo agora todos os fatores que afetam a
rentabilidade do fundo além dos custos. Em Bogle
(2014), considerando esses fatores, os resultados do artigo de Sharpe
subestimam o impacto dos custos totais. Essas outras despesas incluem a
corretagem paga pelos fundos, taxas de carregamento, custo de oportunidade de
investimento em caixa e impostos. Ou seja, giro da carteira, posições em caixa
e impostos podem impor ainda mais penalidades para o investidor além da taxa de
administração.
Essas
questões não foram muito analisadas anteriormente e não é à toa, devido à
dificuldade em estimar esses fatores com precisão. Reconhecendo a imprecisão, Bogle
faz as suas estimativas, tentando ser o mais conservador possível. Para fundos
ativos, os custos de transação foram estimados em 50 pontos-base e para fundos
indexados zero. Para a parcela deixada em caixa, usando a estimativa de 5% de
caixa e prêmio de risco de 6%, Bogle estimou o custo em 30 pontos-base para
fundos ativos, cortando pela metade para levar em conta possíveis posições em
futuros que possam ser utilizadas para aplicar esse caixa. Para taxa de
carregamento, o autor estimou um custo médio de 50 pontos-base para fundos
ativos.
Colocando
tudo junto, o fundo de 1,12% de taxa de administração passa a ter 2,27% de
custos totais, contra 0,06% de um fundo indexado. No primeiro caso, os custos
consomem um terço dos retornos, enquanto no segundo apenas 1%. Isso significa
que em 30 anos, usando os mesmos dados de Sharpe, a diferença entre os dois
fundos será de 44% e de 65% em 40 anos. Considerando os impostos, fundos ativos
mais caros sendo mais tributados do que fundos passivos baratos, essa diferença
pode chegar a 175%. Considerando a inflação, a diferença do valor terminal é de
177%. Se o viés de sobrevivência dos dados relativos a retornos for considerado,
esse cenário fica ainda pior.
Esses
resultados são impressionantes e, apesar de talvez serem imprecisos, mostra uma
realidade: os custos dos investimentos importam, e muito.
Custo da
Gestão Ativa
Em French (2008), Kenneth French procurou calcular qual é o custo
financeiro da gestão ativa em relação ao valor de mercado das ações. Trata-se
de uma estimativa dos custos incorridos pelos investidores subtraindo-se os
custos que existiriam caso todos os investidores praticassem a gestão passiva.
O estudo é feito nos Estados Unidos com dados do período entre 1980 e 2006
(algumas estatísticas incluem 2007).
O autor começa com estatísticas descritivas sobre a
participação de cada tipo de investidor do valor total das ações. A
participação direta dos investidores pessoa física cai de 47,9% para 21,5%,
enquanto que a de fundos abertos sobe de 4,6% para 32,4%. Segundo os autores, essa
não é uma mudança negativa, tendo em vista que investidores pessoa física são pouco diversificados e que são “confiável fonte de ganhos”
para outros tipos de investidores, talvez por serem mais propensos a vieses comportamentais.
O custo dos investidores pessoa física é apenas o custo de
transação, não sendo incluídas outras despesas como o tempo gasto no
gerenciamento de carteiras ou o gasto com busca por informações. Para ações
recebidas como forma de remuneração, assume-se que não há custos. Para fundos,
o autor utiliza o relatório das próprias instituições, que divulgam a razão de
despesas em relação ao patrimônio e a taxa de carregamento. O total das
despesas cai de 215 pontos base para apenas 100, basicamente a quase extinção
da taxa de carregamento (de 149 pontos em 1980 para apenas 15 em 2006). Essa redução
provavelmente se dá com a competição com fundos passivos e ETFs (que, em sua
maioria, são passivos).
Os próximos são os investidores institucionais, como fundos
de pensão e outras fundações. O padrão é parecido com aquele observado para
fundos de investimento, com os custos caindo e a participação da gestão ativa
subindo. Com os dados é possível analisar os custos da gestão passiva e ativa,
mas apenas para instituições que oferecem planos de benefício definido e entre
1991 e 2006. Os custos em ambos caíram, mas indo de 40 pontos base para 36 no
caso da gestão ativa e de 7,9 para 2,9 para a gestão passiva. Em seguida, são
analisados os hedge funds,
o que não é tão simples pela baixa transparência desses fundos e pela grande
heterogeneidade. As estimativas do autor levando em conta apenas as taxas
cobradas é de 4,26% (426 pontos base) para o período 1996-2007. É mais difícil
analisar se as taxas caíram ou subiram porque a taxa de desempenho é uma grande
parcela do total e varia muito com o mercado.
Por fim, é estimado o custo de transação que estava ausente
nos dados anteriores. Esse custo é subestimado, já que gastos com juros em
contas margem não está presente na base de dados utilizada pelo autor e poucas
corretoras oferecem essa informação diretamente. Primeiro, o autor analisa o
giro das ações e corrobora os resultados obtidos por Griffin et. al.
(2007).
O interessante desse gráfico é mostrar como o giro despenca
com a crise de 1929, chegando a ficar abaixo de 20% em 1938. Hoje em dia, está
em 215%, o que significa que cada ação em circulação troca de mãos mais de duas
vezes por ano em média. Esse número aumenta para 284% se forem incluídos os
ETFs. Os custos de transação considerando-se o volume cai de 146 pontos base em
1980 para 11 pontos em 2006. O custo total até sobe no período, mas caiu entre
o topo em 2000 (50,7 bilhões) para 32,1 bilhões.
Note-se que a queda nos custos observada em várias das
estatísticas fornecidas não significa que o custo da gestão ativa caiu, já que
reflete o custo tanto da gestão passiva quanto da ativa e um dos motivos da
queda pode se dar pelo maior papel da gestão passiva (conforme também foi visto
nas estatísticas anteriores). O primeiro passo é somar os custos e verificar
quanto eles representam em relação ao valor de mercado das ações. Somando todos
os custos analisados, há uma queda indo de 82 pontos base em 1980 para 75 em
2006 com média de 79 pontos base em relação ao valor de mercado das ações. Ou
seja, os investidores gastaram por volta de 0,79% do patrimônio investido em
ações em custos. Um elemento da queda é a redução nos custos de transação, que
é contrabalanceada pelo aumento nos custos pelos fundos já que, apesar de terem
reduzido suas despesas, aumentaram a sua participação de mercado. Hedge funds, apesar de
representarem pouco do mercado (2,2% em 2006), representam 17% dos custos
segundo a análise do autor. O custo desses investidores e seus menos de US$ 500
bilhões em gestão é equivalente ao gasto do resto do mercado para US$ 6,18
trilhões (em 2006, a capitalização do mercado era de US$ 15 trilhões).
O segundo passo é calcular o custo caso todos seguissem
estratégias passivas. Para fundos, o autor usa a maior razão de despesas da
família “Vanguard Total Stock Market Index Fund Investor Shares”. Como o
primeiro fundo dessa família foi criado em 1992, é utilizado a razão desse ano
para os anteriores. A base para os investidores institucionais é o custo de
gestão passiva dos planos de Benefício Definido, controlando-se pelas
diferenças com os outros investidores institucionais. Os hedge funds são
abolidos e seus investimentos distribuídos igualmente entre participação
direta, fundos e investidores institucionais. Por fim, o giro de ações é
definido em 10% ao ano. O custo nessas estimativas vai de 18 pontos base no
começo do período para 8,9 em 2006 caso todos os investidores seguissem
estratégias passivas. Dessa forma, o custo da gestão passiva é estimado em 67
pontos base em média. O custo é estável no tempo, variando entre 61 e 74 pontos
base na maior parte do tempo. Em valores monetários, isso significa mais de US$
100 bilhões em 2006, US$ 330 per capita.
Supondo que os investidores continuem gastando esse valor e
assumindo retorno real de 6,7% a.a., o custo capitalizado da gestão ativa é de
10% do valor de mercado atual. Como talvez o retorno real seja até inferior a
isso (6,7% é conveniente para ser utilizado junto com 67 pontos base) e como o
custo vai aumentar junto com a capitalização de mercado, 10% é uma estimativa
bastante conservadora.
Por fim, o autor discute uma premissa fundamental nessas
análises, que é a suposição de que não há transferência de riqueza dos
investidores passivos para os investidores ativos e que o desempenho daqueles é
o retorno de mercado subtraído dos custos de administração. Analisando fundos
passivos da Vanguard e da Fidelity, considerando as despesas, o caixa e
receitas com empréstimo de ativos, o autor chega à conclusão de que os fundos
passivos possuem retornos muito próximos ao esperado, indicando que a premissa
é válida e que os investidores aumentariam seus retornos em média em 67 pontos
base trocando de estratégia.
Essas estimativas estão em linha com o que Sharpe e Bogle escreveram anteriormente. Juntando
todas essas ideias, o mais sensato é se preocupar menos com a busca pelo Graal do retorno superior e aceitar os
retornos de mercado mesmo, alocando uma porcentagem do patrimônio em ações de
acordo com a disposição a correr riscos. Custa menos, é mais fácil e bastante
eficaz.
Conclusão –
O caso a favor da gestão passiva
Do que foi mostrado até agora, a conclusão óbvia é
a favor da gestão passiva de investimentos, dada a incapacidade teórica e
empírica dos gestores ativos obterem retornos anormais, ou seja, alfa positivo.
A questão não se encerra ai e há uma série de
outras considerações a serem feitas para o processo de investimento e não quer
dizer que fundos não sejam úteis. Ao contrário, podem fornecer um grau de
diversificação que os investidores pessoa física teriam dificuldade de obter e
o fariam a um custo mais elevado. Mas saber que a gestão passiva é melhor é
insuficiente para aprender a investir melhor.
Na seção abaixo, outros comentários sobre fundos de
investimento fora da linha principal de raciocínio desenvolvida até agora. Por
enquanto, ficam apenas os links.
Bibliografia
BOGLE, John C. The
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