domingo, 31 de março de 2019

Curso de Python da Let's Code



Aprender linguagem de programação se tornou praticamente vital em diversas áreas, inclusive Finanças, e potencialmente pode se tornar um pré-requisito ao invés de diferencial. Pensando nisso, procurei por um curso de programação em Python e me decidi pela Let’s Code.


O curso básico tem duração de dois meses e o objetivo é ensinar Python do zero. O aluno não precisa ter nenhum conhecimento prévio dessa ou de outra linguagem de programação. Você pode chegar no primeiro dia de aula sem nem ter o programa instalado em seu notebook que não tem problema (o melhor é levar seu próprio notebook, mas a escola deixa a disposição alguns caso o aluno precise). Sendo assim, o curso é bem gradual, com poucos tópicos novos por aula e muitos exercícios de aplicação para serem feitos em aula com correção dos mesmos na aula seguinte. Isso tem aspectos positivos e negativos e vai depender de cada um. Se você já tem uma base de Python ou conhece outra linguagem de programação e precisa de algo rápido, esse pode não ser o curso para você. Caso precise realmente partir da base zero, como era meu caso, então é bastante indicado.

O curso é dividido em duas partes e ao final de cada uma há o desenvolvimento de um projeto em aula. Essa é uma metodologia interessante porque uma coisa é escrever programas simples que fazem uma coisa só, por mais complexa que possa ser. Outra é integrar uma série de programas e funções em um projeto coeso. O projeto do curso que participei já era meio que pré-definido, mas os alunos podem dar sugestões de projeto. Eu cheguei a desenvolver boa parte de um projeto de modelo de valuation nos últimos dias do curso e acho que é uma base razoável para um programa mais sofisticado. Uma dica importante para esse curso: vá tendo em mente aplicações para o seu trabalho ou área de interesse.

As aulas são presenciais com turmas pequenas. Na que participei, eram sete alunos e a escola diz que as turmas são de no máximo doze alunos. Sempre prefiro turmas menores em cursos extensivos porque dá para conhecer melhor seus colegas, o que é mais difícil em uma turma de vinte, quarenta alunos. Além do curso básico, a escola oferece cursos mais específicos de Python, inclusive para Finanças.

Informações:
Tamanho da turma: Sete no que participei, doze no máximo.
Dias da semana: Terça/Quinta no que participei, com opção de Segunda/Quarta.
Investimento: por volta de R$ 2.000,00
Material: Não há exatamente um material, mas o professor pode passar os programas desenvolvidos durante a aula.
Carga Horária: 2 meses

segunda-feira, 25 de março de 2019

Bootcamp Turnarounders


Eu não sou consultor empresarial, mas tive a oportunidade de participar da avaliação de uma empresa de capital fechado em um processo quase de reestruturação. Na mesma época, tomei conhecimento do bootcamp Turnarounders e decidi participar.


Ministrado por Pedro Guizzo, Estevão Seccatto e Anna Muller, profissionais com larga experiência na área, o objetivo do curso é ensinar um conjunto de técnicas para utilização em processos de reestruturação de empresas. A maior parte do que se ensina em administração é sobre as melhores práticas em empresas que estejam em um grau mínimo de organização e viabilidade. Mesmo que seja uma empresa nascente ou pequena, uma coisa é administrar a empresa tendo capital de giro e sem credores te ligando todos os dias. Outra é gerenciar uma empresa com graves problemas financeiros e operacionais que precisa basicamente lutar todos os dias para estar viva no próximo. É uma situação totalmente diferente que requer um modo de pensar e agir diferentes e até heterodoxos. Dessa forma, o curso preenche uma lacuna importante ao examinar a empresa em seu estágio mais crítico e fornecer técnicas variadas para serem utilizadas nessa situação.

O mais interessante do bootcamp é a visão holística do processo de reestruturação de empresas. Não foca apenas nos aspectos jurídicos ou financeiros, que são importantíssimos e têm a sua vez ao longo do curso. Nesses pontos, foram explicados em detalhes o processo de Recuperação Judicial e também cálculos de necessidade de capital de giro de uma empresa, por exemplo. Mas o curso vai além e trata dos aspectos gerenciais, comportamentais, de liderança e de marca, entre outros. O curso explica sobre as decisões que o reestruturador deve tomar, mas trata também de diversos aspectos comportamentais e de organização pessoal como, por exemplo, comunicação com os colaboradores da empresa e a alocação de tempo e energia do reestruturador.

Junto com as explicações de ordem teórica, os instrutores vão acrescentando detalhes práticos de suas experiências profissionais que não constam da apresentação, e é sempre um ponto importante que um curso agregue mais do que a simples leitura das apresentações proporcionaria. Por exemplo, Pedro Guizzo falou em certo momento que é comum passar um terço do tempo falando com o diretor presidente da empresa porque o sucesso do processo de reestruturação irá depender muito da participação dele ou dela.

Nos diversos cursos que participei, fui uma espécie de peixe fora d’água em várias ocasiões. Eu procuro aprimorar meus conhecimentos de análise de ações não estudando análise de ações ou valuation, tópicos que já estudei bastante, e sim outros campos do conhecimento ou aprofundando conhecimentos específicos de contabilidade ou de um setor da economia. Como dito anteriormente, uma empresa em problemas financeiros opera de uma maneira totalmente diferente de uma empresa “estável” e o meu objetivo inicial era entender melhor tais empresas uma vez que já tive que analisar empresas nessa situação (PDG, Rossi, BR Pharma). Me convenci em definitivo a participar após receber a oportunidade de participar da avaliação de uma empresa de capital fechado que tinha como principal problema o capital de giro e acho que o que aprendi no curso me ajudou nessa situação. Mesmo que nunca venha a me tornar consultor ou reestruturador, a minha avaliação é que consegui obter conhecimentos que poderão me ser úteis na avaliação de empresas.

O curso conta com diversas atividades em grupo para a realização de exercícios, que ajudam bastante para fixar os conhecimentos. Como é um curso longo que dura o dia inteiro, é bom quebrar um pouco o ritmo das explanações dos instrutores com resolução de exercícios.

Uma medida da qualidade do curso é a qualidade dos seus participantes. Como ocorre em outros cursos com uma temática bem específica, os alunos em sua maioria já trabalham com o que é discutido no curso. Mesmo já sendo profissionais da área, tenho certeza que conseguiram aprender muito e isso é medido pela participação em aula com contribuições e dúvidas. Além do mais, essa é uma ótima oportunidade de networking uma vez que há uma parte específica apenas para isso na forma de um coquetel ao final do dia. Todos os cursos são uma oportunidade de networking e inclusive fiz alguns contatos nos que participei, mas tendo uma parte só para isso aumenta os contatos de alguns poucos que você tem mais interesse para um número bem maior.

Para quem trabalha com reestruturação de empresas, esse bootcamp é um “no-brainer”: é sem sombra de dúvida uma excelente oportunidade de aprender mais sobre a atividade e tenho certeza que agregará muito. Para quem não trabalha diretamente com essa área, também é possível aprender bastante, como foi o meu caso, mas isso não se aplica a todo mundo. Quem estiver em dúvida pode procurar os professores no LinkedIn e conversar sobre o bootcamp.

Informações:
Professores: Pedro Guizzo, Estevão Seccatto e Anna Muller.
Número de participantes: Por volta de 20
Material: Digital e físico
Investimento: +R$ 1.000,00
Carga horária: 12 horas (contando intervalos) em apenas um dia.

quarta-feira, 20 de março de 2019

Storytelling para Negócios


Todo mundo já viu uma apresentação que depois de algum tempo desejaria estar fazendo praticamente qualquer outra coisa do que continuar assistindo. Muitos provavelmente vocês participaram de uma apresentação assim. Mas e se fosse possível prender a atenção do espectador como um filme ou uma série conseguem fazer?

Essa é a proposta de uma técnica conhecida como Storytelling, que procura aplicar técnicas utilizadas para contar boas histórias em outros contextos como apresentações corporativas. Estrutura de Três Atos, Viagem do Herói, construção de personagens, arquétipos... todas essas teorias e técnicas podem ser aplicadas para encadear ideias e raciocínios de uma forma melhor do que simplesmente ir amontoando fatos e números. Isso cria um contexto que as pessoas conseguem entender melhor e naturalmente prestarem mais atenção. Por mais que os espectadores de uma apresentação corporativa devessem naturalmente prestar atenção ao assunto (principalmente se é o cliente), isso não ocorre e pode prejudicar o receptor e o emissor da mensagem.

Eu participei de um curso chamado “Storytelling para Negócios”, ministrado por Bruno Scartozzoni e oferecido pela Fiap, que procurou ensinar essas técnicas. As aplicações são múltiplas, o que se vê na composição da turma, com participantes trabalhando com vendas, RH, RP, educação e outras áreas, além de um médico, um humorista e um analista de investimentos (eu). É possível aplicar Storytelling para melhorar sua abordagem de venda, a apresentação institucional de uma empresa, apresentação de resultados de um projeto e por aí em diante. Essa já é uma técnica muito utilizada em propagandas e o curso apresenta diversos casos envolvendo anúncios em audiovisual. Mostra inclusive casos em que a empresa tentou incluir uma história em uma propaganda, mas como não era uma boa história o efeito não foi muito bom. Não basta apenas contar uma história para prender a atenção, a história obviamente tem que ser boa.

O curso procura apresentar o máximo de técnicas possíveis para que o participante possa posteriormente aplicar de acordo com o seu contexto específico. Nem todas serão úteis ou poderão ser usadas ao mesmo tempo, mas é uma boa aprender diversas abordagens de Storytelling. Ao final do curso, com carga horária de 12 horas espalhadas em uma sexta à noite e manhã e tarde de sábado, há uma espécie de projeto final a ser feito em sala e apresentado por voluntários. Nem sempre tenho tanta proatividade, principalmente quando envolve apresentação em público, mas fui e apresentei algo totalmente relacionado com meu trabalho.

Agora, onde análise de investimento entra nisso? Talvez desviando um pouco do tópico principal (resenha do curso), uma ideia emergente em avaliação de empresas é que ela deve envolver uma narrativa. Basicamente, e conforme meu próprio pensamento, uma boa avaliação deve contar a história da empresa. Se você apenas jogou um monte de números e não consegue transformar em uma história que faça sentido, então a sua avaliação está incorreta mesmo que do ponto de vista dos números tenha sido feito de maneira tecnicamente correta. Narrativa é o antídoto para o “Excel aceita tudo (menos referência circular)” e os números na planilha são o antídoto para o “Power Point aceita tudo”. Logo, Storytelling pode ajudar a melhorar o próprio conteúdo de uma avaliação.

Embora talvez menos enfatizado, é possível usar Storytelling em relatórios escritos, portanto, a técnica pode ser usada para melhorar a forma dos relatórios também. Na área de investimentos é nítido que os participantes estão usando essas técnicas no mínimo em suas propagandas, incluindo certas empresas usando Storytelling possivelmente para o mal. Então, faz todo sentido usar a técnica para criar relatórios mais interessantes.

Portanto, aprender Storytelling pode ser muito útil para todo tipo de profissional e o curso que participei é bem sucedido em apresentar a técnica e estimular o uso prático dela. Uma dica importante para participar deste ou de qualquer curso de Storytelling é já ir com problemas práticos de seu trabalho para serem resolvidos e assistir o curso pensando em como resolvê-los. É o que fiz e já tenho ideias para aplicar no futuro próximo.

Informações:
Professor: Bruno Scartozzoni
Número de participantes: Por volta de 30
Material: Digital
Investimento: R$ 920
Carga Horária: 12 horas, sexta à noite, sábado manhã e tarde (pode mudar em outras versões)

terça-feira, 19 de março de 2019

A primeira vez que o Ibovespa chegou a 100 mil pontos



No dia 18 de março de 2019, o Ibovespa cruzou a barreira dos 100 mil pontos, apesar de não ter fechado acima dessa marca. Esse é sem dúvida o topo histórico do índice, mas será que o Ibovespa não chegou em algum outro momento a 100 mil pontos?


Uma informação importante sobre o Ibovespa é que ele sofreu vários ajustes ao longo de sua história. A base do índice é 100 em 29/12/67. Depois disso, passaria por alguns “desdobramentos” periódicos, o primeiro em outubro de 83 e o último em março de 97 (a Wikipédia tem todos os ajustes). Coloquei “desdobramento” em aspas porque não houve exatamente uma multiplicação por 10 ou 100 no número de ações com divisão pelo mesmo valor no preço, mas o efeito prático é o mesmo, reduzir o valor do índice. Por isso que o histórico de cotações ajustadas do Ibovespa mostra o valor de 0,0000000001 em 29/12/67, ou seja, 10 elevado a menos 12 porque foram 10 ajustes por 10 e 1 por 100.

Logo, uma coisa que poderia acontecer é o índice ultrapassar 100 mil pontos e depois sofrer um desdobramento para 10 mil pontos. Porém, o fato é que isso nunca aconteceu. Não sei por que ou se isso era uma prática formal, mas sempre que o Ibovespa chegava perto de 100 mil pontos sofria um ajuste. É como se agora lá pelo começo deste ano a B3 decidisse dividir por 10 o Ibovespa só porque estava próximo de 100 mil. O mais próximo que o índice tinha chego era 97.299 pontos em 26/08/93, um dia antes de sofrer novo ajuste. Não há nada de especial nem nessa data nem nessa pontuação, mas por um acaso foi o máximo que o Ibovespa tinha alcançado em termos de pontos nominais.

Também não há nada de especial em chegar a 100 mil pontos, mas as pessoas gostaram de ficar comentando e especulando quando chegaria lá. No futuro, depois que o Ibovespa sofrer um novo ajuste (se isso ocorrer) e o índice chegar novamente a 100 mil pontos (o que equivaleria a 1 milhão de pontos agora), quem se perguntar se essa é foi a primeira vez encontrará a resposta aqui: não foi, e sim no dia 18/03/2019.

domingo, 17 de março de 2019

Qual foi a primeira empresa brasileira a valer USD 1 bi?


Fui perguntado se eu sabia qual era a primeira empresa brasileira a valer US$ 1 bilhão em bolsa. A inspiração foi esse artigo que afirma que a U.S. Steel foi a primeira empresa americana a chegar nessa marca no começo dos anos 1900s. Não sabia qual era, mas fui pesquisar e encontrei a resposta.


Para calcular o valor de mercado de uma empresa em dólares, você precisa de três coisas: quantidade de ações, cotações e taxa de câmbio. Essas informações referentes a hoje podem ser facilmente encontradas na internet. Se você quiser voltar ao passado, até 1994 não é tão difícil assim já que quantidade de ações e cotações estão disponíveis nos sistemas da CVM e da B3. Voltar além disso ao passado se torna cada vez mais difícil e aqui iremos precisar voltar 50 anos ao passado.

Na biblioteca da FEA-USP estão disponíveis para consulta na seção de periódicos as revistas da Bovespa e da Bolsa do Rio. Lá é possível encontrar uma série de informações, mas curiosamente cotações e outros dados não constam necessariamente dessas publicações. No que parece ser uma edição especial da “Revista da Bôlsa de Valôres de São Paulo” chamada “Retrospecto do 1º Semestre/70” eu consegui encontrar informações como cotações, índice P/L, valor patrimonial e quantidade de ações. Com isso, é possível calcular o valor de mercado, mas não sabia se isso seria suficiente. Teria que ser, já que a única informação anterior a 1970 é 1952 em outra publicação, de difícil consulta.

Primeiro de tudo, é necessário descobrir o que é US$ 1 bilhão na moeda da época. Eu procurei duas referências já que não sabia inicialmente se o preço se referia a 1969 como as informações contábeis ou a 30/06/1970. No artigo “A utilização da cotação do dólar para eliminar efeitos da inflação” de Roberto Carvalho Cardoso publicada em 1971 há uma série de cotações antes de 1970 e nesse site eu encontrei cotações para o período anterior. Em 1969 a cotação Cr$/US$ era de 4,153 ao longo de todo ano e em junho de 1970 era 4,560. É uma grande variação em apenas seis meses, mas me parece que ambas informações estão corretas. Também irei usar as cotações oficiais do mesmo jornal em que encontrei a cotação e os resultados independem de qual cotação usar.

Logo, uma empresa precisaria valer Cr$ 4,56 bilhões para chegar a US$ 1 bilhão em 30/06/70. Nessa primeira parte, irei considerar apenas o “Retrospecto” de 1970 com cotações referentes a 30/06/70, e não cotações de jornal. Meu receio inicial era que eu encontraria várias empresas nessa situação, mas não foi esse caso. O Banco do Brasil tinha 240.000.000 ações e a cotação era de Cr$ 25,22, logo, valia Cr$ 6.052.800.000,00, ou US$ 1,3 bilhão. Petrobras é um caso complicado porque eu só tinha o total de ações sem separar entre ON e PN e há uma grande diferença nas cotações. O total era de 2.456.400.000 ações; a ON valia Cr$ 0,86 e a PN Cr$ 2,10. Felizmente, outra referência, o “Anuário da Bolsa Oficial de Valores de São Paulo” de 1970 traria uma informação chave, embora referente ao final de 1970. Lá constava que a quantidade de ações ordinárias da Petrobras era de 2.847.688.917 contra 100.011.083 preferenciais. Embora os valores não batam por se referirem a datas diferentes e entre uma e outra deve ter havido um aumento de capital, fica claro que havia muitíssimo mais ações ordinárias do que preferenciais. Fixando o número de preferenciais e mudando o de ordinárias, chegaríamos ao valor de mercado de Cr$ 2.672.107.737,86.

A Vale do Rio Doce era avaliada em Cr$ 3,281 bilhões com 403.650.000 ações cotadas a Cr$ 8,13. A quarta maior empresa era a Light com Cr$ 1,170 bilhão e a última a passar a marca bilionária na moeda da época. Dentre os bancos, o segundo maior (me parece) era o Banespa com Cr$ 993 milhões e o Bradesco era o terceiro com Cr$ 150 milhões. Itaú (América) era apenas o sexto maior banco com Cr$ 84 milhões.

Logo, em 30/06/70 tínhamos uma empresa com valor de mercado superior a US$ 1 bilhão, o Banco do Brasil. Mas teria sido a primeira? Acessando o acervo do Estadão, é possível examinar o histórico de cotações em 1969 e usar como referência as quantidades de ações em 30/06/70. A questão é saber se as quantidades de ações em 1970 são válidas para 1969. Examinando as cotações no ano anterior, é fácil perceber que houve um aumento de capital tanto no Banco do Brasil quanto na Petrobras em 1969 porque elas chegam a ser negociadas “ES” ou “ex subsc”, ou seja, ex-subscrição.

Seria necessário então obter mais informações sobre tais subscrições. Pesquisando no próprio acervo do Estadão, é possível encontrar algumas pistas. Em fevereiro de 1969, eu encontrei edital de convocação de AGE para aprovar o aumento de capital do Banco do Brasil, porém, sem maiores informações de quanto era a quantidade de ações e para quanto iria depois. O que sei é que em julho de 1970 seria anunciado o aumento de capital de Cr$ 240 milhões para Cr$ 720 milhões. Logo, sem ter havido nenhuma outra subscrição entre fevereiro de 1969 e julho de 1970, a quantidade de ações após fevereiro de 1969 era de 240 milhões.

Quanto à Petrobras, houve dois aumentos de capital importantes. O primeiro ocorrido em abril de 1969 levaria o capital da petroleira de NCr$ 1,932 milhões para NCr$ 2,456 milhões, logo, batendo com a informação que tínhamos anteriormente. Em junho de 1970, ocorreria novo aumento para Cr$ 2,947 milhões, agora batendo com a informação de final de 1970 do “Anuário”. Mas se o aumento ocorreu em junho de 70, por que isso não afetou a quantidade em 30/06/70 segundo o “Retrospecto”? Ocorre que a subscrição efetiva só iria ocorrer em uma data futura após junho. Os bônus de subscrição foram distribuídos, por algum motivo primeiro na Bovespa e depois na BVRJ, e a cotação cairia. Duas forças iriam levar a essa cotação menor: o reajuste por subscrição que deveria levar o preço teórico da ação “ex” para [preço anterior – cotação do Bônus] e também desvalorização. Em tese, a empresa deveria ser negociada a partir do patamar mencionado para calcular o preço “ex”, mas, como mencionei no meu texto sobre Diluição, se a expectativa for de que a empresa irá pegar esse dinheiro e investir em projetos com VPL negativo, o correto é que haja desvalorização. Nesse caso, ou o mercado interpretou errado o aumento de capital e a direção espera que o VPL seja positivo ou a empresa arrecadou mais recursos para perseguir “outros objetivos”. Sendo uma empresa estatal em uma época em que não se discutia muito os direitos das “minorias acionárias”, como os minoritários eram chamados, a segunda hipótese é plausível.

Logo, podemos usar 240 milhões como quantidade de ações para o Banco do Brasil e 2,456 bilhões para a Petrobras em 1969. Eu examinei muito rapidamente e não encontrei cotações que justificassem valor de US$ 1 bilhão antes do aumento de capital. Sem pegar todo o histórico de cotações é impossível afirmar categoricamente, mas não me parece que Petrobras ou Banco do Brasil tenham chego a US$ 1 bilhão com menos capital. Examinando as cotações dia a dia, vi que Banco do Brasil não chegou a US$ 1 bilhão antes do aumento de capital da Petrobras. Portanto, após esse evento começaria uma corrida entre os dois.

Acompanhando as cotações de abril para frente, fui procurando a cotação de NCr$ 17,31 que levaria o Banco do Brasil a atingir US$ 1 bilhão e um valor próximo de NCr$ 1,60 para as ações ordinárias da Petrobras. E aqui uma curiosidade: ao longo dessa pesquisa, estava pronto para dizer que Banco do Brasil foi a primeira empresa a chegar à marca bilionária e teria alcançado esse valor em 15/07/1969. Depois fui fazer as contas e percebi que a Petrobras teria chego lá antes em junho de 69 se tivesse 50/50 de ações ON e PN. Após descobrir que as ações preferenciais representavam muito pouco, a corrida ficaria restrita a meados de junho de 1969 e 15/07/69.

Consultando apenas o acervo do Estadão, seria impossível descobrir a data exata já que as primeiras edições de julho de 1969 foram escaneadas com uma qualidade inferior que impede ler as cotações. Felizmente, o acervo d’O Globo permite ler melhor as cotações, embora a qualidade seja um pouco abaixo do necessário para obter total nitidez. Fazendo isso, no dia anterior, 14/07/69, as cotações na BVRJ eram de NCr$ 18,85 para Banco do Brasil e NCr$ 1,69 e NCr$ 3,95 para Petrobras. No Estadão, é fornecida a cotação do dia anterior, mas apenas para as cotações da Bovespa e (acho) apenas para as cotações das ações negociadas no dia. No dia 14/07, o Banco do Brasil era cotado a NCr$ 17,22, logo, abaixo de US$ 1 bilhão. Mas no jornal do dia 16/07, não havia informações sobre a cotação da ação ordinária da Petrobras, logo, não havia a cotação do dia 14/07. O jornal do dia 15/07 tinha essa cotação, mas era um borrão que pode ser muitas coisas, inclusive o que era necessário para chegar a US$ 1 bilhão.

O câmbio que estou usando é NCr$ 4,153/USD. O câmbio “livre” nos dias 14 e 15 oscilou entre NCr$ 4,075 e NCr$ 4,10, logo, os resultados independem das taxas de câmbio exceto se outra fonte fornecer um valor “verdadeiro” para o câmbio que talvez estivesse sendo definido de forma artificial.

Logo, a melhor conclusão é que Banco do Brasil e Petrobras chegaram a US$ 1 bilhão ao mesmo tempo no dia 14/07/1969 na Bolsa do Rio de Janeiro e no dia seguinte na Bovespa. Pode ser que no mesmo dia 14/07 a Petrobras tenha chego a US$ 1 bilhão na Bovespa e o Banco do Brasil não, mas acho que isso não mudaria a conclusão.

Outra empresa poderia ter chego lá antes? Não cheguei a examinar o histórico completo em 1968, mas pelo pouco que vi nem Petrobras e Banco do Brasil teriam conseguido (ainda mais com menos capital), nem Vale ou Light. Não tenho os dados de quantidade de ações de empresas negociadas apenas na BVRJ, mas não me parece que uma CSN ou White Martins valesse mais do que Petrobras ou Banco do Brasil. Não dá para descartar completamente, mas acho provável que a minha conclusão esteja correta.

Não sei se será possível aprimorar essa pesquisa, porque 1970 com informações até 1969 é o máximo que consigo voltar no tempo com o que tem na biblioteca da FEA-USP. Tem o “Anuário Oficial da Bôlsa de Valôres de São Paulo”, mas dificilmente alguém teria chegado a US$ 1 bilhão em uma época em que sequer existia Petrobras. Além do mais, esse Anuário é de consulta extremamente difícil porque é uma grande lista de fichas de empresas, sem nenhum tipo de tabela resumo.

terça-feira, 12 de março de 2019

Depreciação Fiscal x Contábil

Neste texto, vou comentar sobre o tributo diferido que é gerado a partir da diferença entre depreciação para fins fiscais.


O artigo 320 do Decreto 9.580/18, a norma mais atualizada do IR e da CSLL, estabelece que a taxa de depreciação deve ser estabelecida de acordo com a expectativa de vida útil do bem imobilizado. No § 1º diz que a Secretaria da Receita Federal publicará taxas de depreciação admissíveis, facultando ao contribuinte adotar outra taxa mais adequada caso prove tal adequação. Por fim, no artigo 321, permite a exclusão da diferença do Livro de Apuração do Lucro Real (Lalur).

A tabela abaixo mostra um exemplo fictício. A taxa de depreciação fiscal é de 10% a.a., mas a empresa espera que o ativo tenha uma vida útil de 30 anos ao invés de 10. 


Adotar uma taxa de depreciação mais longa, quando cabível, melhora a demonstração contábil ao retratar mais fielmente a realidade econômica da empresa. Porém, do ponto de vista fiscal, é uma péssima ideia desacelerar a depreciação. Pensando meramente no pagamento de impostos, quanto mais rápido você reconhece despesas de depreciação (dedutíveis de IR e CSLL), melhor é para o resultado sem qualquer outra consequência no caixa. O que a regra fiscal estabelece é a possibilidade de depreciar fiscalmente a uma taxa (estabelecida pela Receita Federal) e contabilmente a outra.

Nas demonstrações financeiras, a conta de tributos diferidos é a diferença entre depreciações fiscais e contábeis acumuladas, multiplicada pela taxa de IR e CSLL.


Projeção
O que sempre me confundiu um pouco na projeção dessa conta é focar demais no tributo diferido. Se você dividir o saldo da conta por 0,34, chegará ao valor da diferença entre as depreciações acumuladas. Mas o mais importante não é a diferença, e sim qual é então a depreciação fiscal. Sabendo qual é o saldo de depreciação fiscal, basta projetar tal saldo da mesma forma que se faz com a depreciação contábil. Para saber qual é a depreciação fiscal, basta somar Diferido/0,34 ao saldo contábil supondo alíquota de IR e CSLL de 34%.

Por que isso é importante?
Diferido sobre diferença entre depreciação fiscal e contábil é uma conta que tem natureza muito parecida com investimento imobilizado, porque deriva dela (quando há tal diferença). Se o imobilizado for estritamente crescente, como será na perpetuidade, então o diferido deve ser crescente também. A prática comum é subtrair o valor do diferido no valor da empresa. Como escrevi anteriormente, isso faz com que se inverta o impacto no valor da empresa. Sendo o adiamento de um pagamento, isso aumenta o valor da empresa. Subtrair o valor contábil teria o efeito oposto. Além do mais, seria supor não apenas que a empresa irá voluntariamente aceitar adotar uma depreciação menor para fins fiscais, aumentando seu lucro tributável, mas também irá pagar hoje toda a diferença de tributação acumulada até então. Se ainda fosse alguma espécie de incentivo fiscal, subsídio ou coisa do tipo, você poderia supor que um dia o sistema político tomaria vergonha na cara e pararia com tais privilégios, mas não é isso que ocorre. O diferimento só faz com que a empresa não pague mais impostos do que deveria, não que pague menos do que é sua obrigação.

Logo, projetar da maneira correta esse tributo diferido reconhece apropriadamente ao menos o impacto positivo dessa conta e também faz sentido do ponto de vista lógico.