Diane Del Guercio e Jonathan Reuter
NBER Working Paper No. 17491
Outubro de 2011
Já escrevi anteriormente sobre o desempenho de
fundos em Desempenho
de fundos, Da
impossibilidade da eficiência informacional dos mercados, A busca pelo alfa
(parte 1
e 2),
Custos
e desempenho de fundos e A
aritmética da gestão ativa e também sobre a gestão ativa em O
custo da gestão ativa. A maioria dos trabalhos são empíricos e mostram que
o desempenho dos fundos ativos não compensa o risco incorrido (alfa negativo),
sendo preferível investir em fundos indexados. Esse é um comportamento anômalo,
já que, se os fundos não conseguem retornos superiores, por que os investidores
continuam demandando a gestão ativa?
O artigo de Guercio e Reuter mostra uma análise
diferente, separando os fundos em broker-sold
(vendido através de corretores), direct-sold
(vendidos diretamente) e fundos vendidos a clientes institucionais, havendo
uma adicional segregação entre fundos ativos e passivos. A diferença
fundamental entre fundos voltados para o varejo é que os vendidos diretamente
cobram e oferecem apenas a gestão de carteira, enquanto que fundos vendidos
através de corretores podem adicionar outros serviços como consultoria
financeira. Os fundos são voltados para públicos diferentes, os vendidos
diretamente sendo direcionados para investidores que querem tomar suas próprias
decisões, de forma que a competição nesse segmento pode ser mais concentrada em
desempenho do que no segmento de venda via intermediários.
Os autores analisaram fundos americanos no período
1992-2004 com dados da Financial Research Corporation (FRC) e CRSP. A definição
do segmento é com base na porcentagem das cotas vendidas através de um dos
canais mencionados acima, fazendo parte da base dos autores apenas os fundos
que se encaixam em uma dessas categorias. No período, o valor dos ativos sobe
de US$ 288,9 bilhões para US$ 2,042 trilhões. A participação de mercado da
venda direta cresceu, assim como a de fundos indexados, por conta do segmento
de venda direta e institucional, com poucos fundos vendidos via corretores
sendo de gestão passiva. A participação dos fundos voltados a institucionais é
baixa, por viés da base de dados utilizada pelos autores, mas o foco do artigo
é nos fundos para investidor de varejo, mas os autores atribuem como baixa a
probabilidade de fundos de venda direta serem confundidos com os vendidos por
corretores e vice-versa.
Observando-se as estatísticas descritivas dos
fundos individualmente, nota-se que há um menor número de fundos indexados, mas
esses são maiores na média, com exceção dos fundos no segmento de venda por
meio de corretores. O custo dos fundos vendidos diretamente é menor do que do
outro segmento e o retorno dos fundos ativos vendidos diretamente é maior até
do que o retorno dos fundos indexados, mas maiores inferências só podem ser
feitas através de análises mais aprofundadas, tema da próxima parte do artigo.
Os autores passam a analisar o alfa do modelo de
quatro fatores dos fundos, adicionando outras variáveis de controle. Primeiro,
comparam fundos indexados e fundos ativos, independente da categoria em que se
encontrem. Coerente com os estudos anteriores, os fundos indexados possuem
melhor desempenho do que os ativos. A inovação do artigo é desagregar os fundos
separando nos três segmentos de mercado mencionados. No segmento de venda
direta, não há diferenças significativas entre fundos ativos e indexados, mas
há no segmento de venda por corretores em favor dos fundos indexados. Comparando
fundos ativos ou indexados em diferentes setores, os fundos ativos vendidos
diretamente geram retornos superiores ao dos fundos dos demais segmentos, maior
principalmente do que os vendidos por corretores. Controlando por outras
características dos fundos, os autores encontram relação negativa com as
despesas do fundo e com o tamanho (fundos maiores geram menores retornos).
A próxima questão é analisar as razões desses
resultados. Tomando a base inteira, afetam positivamente os aportes líquidos em
um mês os aportes no mês anterior e os retornos líquidos e ajustados ao risco.
Até ai, nada de novo, mas os autores voltam a separar os fundos em três
segmentos. Nessa análise, o fluxo para fundos do segmento de venda por
corretores e para institucionais são mais sensíveis a retornos líquidos,
enquanto que o segmento de venda direta é mais sensível a retornos ajustados ao
risco. Analisando o fluxo nos fundos de melhor e de pior desempenho (na
comparação com fundos com mesma política de investimentos), nota-se que o fluxo
para fundos vendidos diretamente são mais sensíveis ao desempenho extremo do
que fundos dos demais segmentos. Análises que levam em consideração apenas
fundos ativos confirmam esses resultados. Considerando apenas fundos de small-caps, nenhum dos segmentos
voltados a pessoas físicas conseguem alfa positivo, mas o desempenho dos fundos
de venda direta é superior ao da venda por meio de corretores. O beta dos
fundos vendidos diretamente é menor do que o dos fundos vendidos por meio de corretores,
o que pode levar a maiores retornos não ajustados ao risco, mas não
necessariamente à geração de valor. Dessa forma, talvez o desempenho seja menos
uma questão de habilidade e mais de incentivos, alguns fundos podendo ter
desempenho ajustado ao risco menor, mas retorno absoluto maior, porque isso
atrai investidores e aumenta a remuneração do gestor.
Outra análise relevante é sobre o grau de gestão
ativa na comparação com outros segmentos. Os autores utilizam duas variáveis. A
primeira é a “diferença de retorno” (return
gap), criada por Kacperczyk
et. al. (2008), que mede a diferença entre o retorno reportado e aquele
implícito na análise da composição da carteira em um período anterior. Essa
medida é maior em fundos vendidos diretamente, tanto na amostra total, quanto
restringindo a small-caps. A segunda variável,
criada por Cremers
e Petajisto (2009), é a “Fração Ativa”, a porcentagem da carteira que deve
ser negociada de forma a se tornar um fundo que siga o seu índice de
referência. E, de fato, os fundos vendidos diretamente são mais ativos do que
fundos dos demais segmentos, ainda mais considerando apenas fundos de small-caps.
Um passo adiante na procura das razões dos
resultados encontrados é analisar os gestores dos fundos. Embora os fundos
vendidos diretamente não tenham maior propensão a contratar gestores das
melhores faculdades americanas do que fundos vendidos por corretores, são mais
propensos a contratar gestores com melhores notas de matemática no teste SAT. Ainda, há maior propensão a
contratar gestores com PhD ou JD em fundos vendidos diretamente e menos de
contratar gestores com MBA, que, como estudos anteriores indicaram, são mais
propensos a assumir risco sistemático e aumentar os retornos brutos.
Estudos anteriores mostram deseconomias de escopo
com relação ao tamanho da família de fundos, ou seja, um mesmo gestor
oferecendo diversos tipos diferentes de fundos obtendo retornos menores. Os
autores não analisaram a relação entre tamanho da família e retornos, mas sim
como essas variáveis são diferentes entre os diversos segmentos. Os fundos
vendidos diretamente possuem maior parcela máxima investida em um único estilo
de acordo com a classificação da Morningstar e seguem uma quantidade menor de
estilos de gestão.
Os gestores podem gerenciar carteiras em contas
separadas para fundos de pensão ou outros tipos de investidores institucionais.
Talvez gestores que vendam mais através de corretores tenham melhor desempenho
quando gerenciam recursos de outros tipos de investidores que podem se preocupar
mais com retornos ajustados ao risco. Analisando apenas as contas separadas, o
desempenho dos gestores que focam em venda direta é estatisticamente igual ao
dos gestores que não oferecem fundos mútuos, superior ao dos gestores de venda
por corretores (embora a diferença estatística não seja grande), e as maiores
evidências de desempenho superior vem dos gestores que focam em investidores
institucionais. Separando esses fundos em fundos patrocinados por bancos (não
saberia dizer qual a figura equivalente ao sponsor na administração dos fundos
brasileiros) e os outros, os autores determinam que boa parte desse desempenho
inferior vem dos fundos patrocinados por bancos.
Em suma, os autores analisaram o desempenho de
fundos ativos, primeiro encontrando resultados semelhantes a estudos
anteriores, e depois separando os fundos em três segmentos de acordo com o
principal público do fundo. No segmento de venda direta, sem outros serviços
adicionais como consultoria paga, não há evidências de que os fundos ativos
tenham desempenho diferente dos fundos indexados. Não sei como esses segmentos
seriam no mercado brasileiro, mas o mais importante do artigo é mostrar que
alguns tipos de fundos podem ir melhor do que outros de acordo com o incentivo
de conseguir maiores retornos ajustados ao risco, e não apenas com a habilidade
em cumprir essa tarefa. Os demais segmentos possuem fluxo mais sensível a retornos
brutos, o que é um incentivo para perseguir esse tipo de ganho, o que se vê
também no maior risco sistemático que assumem. Ou seja, alfa negativo médio dos
fundos pode ser mais uma questão de incentivos do que de habilidade.
Nota: Esse artigo foi publicado depois no Journal of Finance, na edição 4 de 2014.
Nota: Esse artigo foi publicado depois no Journal of Finance, na edição 4 de 2014.