Nas
demonstrações contábeis, as Notas Explicativas são a parte mais importante para
avaliação de ações, na minha opinião. Através delas, temos mais detalhes sobre
as diversas contas que precisam ser projetadas a fim de se chegar ao valor
justo da empresa.
Infelizmente,
os arquivos de divulgação, seja a Demonstração Financeira Padronizada (DFP) ou
o Informações Trimestrais (ITR), seja ao release
de resultados vez ou outra contém alguns problemas, em especial DFP/ITR. As
minhas principais frustrações ao planilhar as Notas Explicativas (já por volta
de 45) até agora foram:
* Problemas
no arquivo – Já vi diversas empresas com problemas em seus arquivos no formato
PDF, tais como PDF protegido para cópia ou formatado de uma maneira que é
difícil ou impossível copiar e colar as informações, o caso mais extremo sendo
colocando tudo na forma de imagem, algo raro e concentrado em divulgações bem
distante no passado (nem tão remoto, por volta de 2011). Outros problemas de
formatação incluem tabelas desniveladas, números com formato incorreto
(geralmente, ao tentar copiar e colar, o primeiro digito não é copiado), letras
e números em um padrão estranho (que geram uma série de símbolos estranhos ao
copiar e colar). PDF protegido ainda dá para “dar um jeito” de desproteger, mas
se o arquivo não é formatado da maneira correta, a única alternativa é
transportar as informações para uma planilha manualmente, o que não apenas é
mais trabalhoso, mas aumenta a chance de erros. Outro problema é a empresa
colocar o documento errado (no lugar do DFP de 2014, por exemplo, coloca outro
arquivo ou mesmo nenhum) ou disponibilizar o arquivo apenas em inglês (a língua não é o problema, e sim a troca de ponto por vírgula).
* Informar
variações, não valores – Algumas empresas mostram a predileção por informar a
variação de alguns números, seja em porcentual, seja em valores absolutos, não
como um complemento na informação, e sim como a própria informação. Ou seja, ao
invés de informar que as vendas foram de X no atual ano e Y no ano anterior,
informam que a variação foi de X – Y. Eu acho péssima essa forma de
comunicação. O usuário das demonstrações contábeis (supostamente) domina as
quatro operações matemáticas, então, não seria nem difícil nem trabalhoso
chegar a X – Y por conta própria, ao mesmo tempo em que precisa dos valores de
X e Y para fazer as suas análises. Não é muito comum, mas acontece.
* Informações
só no DFP – Algumas empresas divulgam alguns números apenas no DFP e omitem
esses dados nos ITRs. Não me agrada essa prática, já que muitas vezes as
análises são feitas com base nos trimestres, e não apenas com os dados anuais.
Mesmo que eventualmente a projeção seja anual, aumentar a freqüência dos dados
para fins de análise só tende a ser benéfico. E simplesmente não acredito que
haja informações que sejam relevantes apenas uma vez por ano.
* Mudança
nos termos – Consistência é uma virtude importante para as divulgações
contábeis e financeiras. Se for possível mudar para melhor, ou seja, para
apresentar mais informações, então é válido que se mude. O que prejudica é a
mudança de termos, ou seja, chamar de maneiras diferentes uma mesma conta. O
ideal seria que todas as empresas do setor usassem os mesmos termos, mas o
mínimo seria a mesma empresa sempre usar o mesmo termo. Em shopping centers, temos as chamadas luvas, que é o adiantamento de
aluguel dos lojistas. Vi uma série de termos diferentes para o mesmo conceito,
o mais básico (e mais correto) sendo Receita Diferida, mas temos ainda
Estruturas Técnicas, Luvas, Adiantamento de Clientes e por ai vai. Garantia
Física, um termo importante para as geradoras de energia elétrica, pode também
ser chamada de Energia Assegurada ou Energia Comercializável. O ponto negativo
de se mudar os termos é que você faz o Ctrl + F procurando o termo e depois
pensa que a empresa deixou de divulgar as informações, o que nos remete ao
próximo tópico...
* Parar
de informar – Algumas vezes, as empresas param de fornecer alguma informação
importante. Por exemplo, no passado poderia haver uma nota explicativa sobre “Imobilizado”
e depois de algum tempo essa nota deixar de ser informada. Quando é algo que
não é tão relevante, o problema não é tão grande assim, mas nunca se sabe para
quem essa informação é ou não “tão relevante”.
* Informar
na apresentação, não no release – Algumas
informações, principalmente de natureza gerencial, constam do release de resultados, mas não do
ITR/DFP. Geralmente, as empresas incluem o release
dentro do ITR/DFP e, mesmo que não seja o caso, basta consultar ambos os documentos
na hora da análise. Porém, algumas vezes há a divulgação de uma informação na
apresentação de resultados, um arquivo no formato Power Point (geralmente
convertido para PDF) utilizado nas teleconferências de resultado. O problema é
que na maior parte dos casos isso não acontece (só vi dois casos das mais ou
menos 45 empresas que planilhei as NEs), então, você acaba não percebendo
quando é esse o caso. Só depois de muita frustração por conta da empresas não
divulgar um dado importante no ITR/DFP ou no release que você vai consultar a
apresentação e descobre que a informação está lá.
* Ausência
de somas – Anteriormente, relembrei que o usuário das informações contábeis
sabe fazer as contas básicas. Mas agora vou reclamar da ausência de soma em
algumas ocasiões. Não tem problema a empresa divulgar em separado os dados do
Circulante e do Não-Circulante, desde que depois inclua a soma para facilitar o
trabalho do usuário. Com Empréstimos e Financiamentos, algumas vezes há a
divulgação em separado do principal, juros, encargos etc. Ótimo, mas ofereça um
somatório no final para quem não tem interesse em tantos detalhes. Tributos
Diferidos algumas vezes são separados em IR e CSLL. Apesar de não essencial, é
importante já que alguns resultados têm tributação apenas pelo IR ou apenas
pela CSLL e a separação pode ajudar a tornar isso mais claro. Porém, ajuda
quando há também o somatório. Claro, na hora de planilhar, é só somar no
próprio Excel, mas isso é um pouco mais demorado já que é necessário incluir o
= e tirar os pontos. Faça isso para umas 10 linhas por 36 demonstrativos
diferentes (supondo que você esteja planilhando trimestralmente desde 2011) e
isso ai custa um tempo razoável.
* Positivo
ou negativo – Na hora de divulgar custos e despesas, devemos usar valores
positivos ou negativos? O certo mesmo é que seja negativo, mas na verdade tanto
faz. Porém, seja lá qual for a escolha, seja consistente e deixe sempre
positivo ou sempre negativo. A inconsistência atrapalha na medida em que você
precisa restabelecer o padrão na sua planilha, o que envolve mudar os sinais.
Nada de tão complicado (se era sempre positivo, basta tirar os parênteses), mas
às vezes pode dar um nó na cabeça, principalmente quando se trata de um “custo
positivo”, ou seja, que no padrão mais correto é positivo, mas no invertido é
negativo, e depois você já nem sabe mais como que é.
* Trimestral
ou acumulado – Outra escolha é entre divulgar os números referentes ao
trimestre no ITR ou o acumulado do ano. As duas opções são válidas, mas eu
prefiro que os números fossem trimestrais (gostaria inclusive que assim fosse
no DFP) ou então ambos. Mesmo que eu sempre trabalhe com dados trimestres,
posso facilmente trimestralizar em um tratamento de dados antes da análise. Mas,
novamente, seja como for, seja consistente, e não fique mudando de um para o
outro entre um trimestre e outro. Isso sim atrapalha.
* Título
e nomes esquisito dos arquivos – Um ponto que muitas vezes as empresas ignoram
é o título do arquivo. Quando você abre o arquivo PDF no próprio browser, aparece não apenas o nome do
arquivo (“ITR1T2017.pdf”), mas também o título e nem sempre esse título faz
sentido. Pode constar o nome de uma pessoa (que talvez nem trabalhe mais na
empresa e talvez seja o nome da pessoa da empresa de RI terceirizada), o nome
de outra empresa, o endereço no computador (“C:/...”), ou algo mais bizarro (não
lembro de nenhum exemplo desse último caso, e espero não me deparar com nada
muito traumatizante, mas pode acontecer!). É possível também que isso ocorra no
próprio nome do arquivo, o que considero ainda pior. Não é nada de tão
problemático, mas prefiro que as empresas (ou suas consultoras de RI) tenham
cuidado com isso. E também tirem o nome dos funcionários no nome do autor e
coloque nesse campo o nome da empresa (ou mesmo não coloquem nada).
* Inconsistência
nos dados retrospectivos – No ITR/DFP, é necessário não apenas informar os
dados do atual trimestre/ano, mas sim de um período anterior. Acontece que nem
sempre o retrospectivo bate com o dado do trimestre/ano de quando foi divulgado
pela primeira vez. Há sempre uma razão contábil para que isso aconteça, mas algumas
vezes não me parece um motivo forte o suficiente, como a reclassificação de
contas (do Contas a Receber para o Outros Ativo Circulantes, por exemplo). Pior
ainda quando há uma mudança do Tributos Diferidos ativo para o passivo (ou
vice-versa), já que isso afeta o total do Ativo/Passivo. Em certas ocasiões (em
especial após drásticas mudanças nas normas contábeis como ocorridas em 2009 e
2012), isso não apenas é importante como inescapável, mas em outros casos (como
os exemplos citados) é totalmente irrelevante e só atrapalha.
São
esses os principais pontos da minha experiência de pouco mais de dois anos e mais
ou menos 45 demonstrativos planilhados. Infelizmente,essa lista é crescente e
posso voltar a escrever sobre isso no futuro (ou mesmo atualizar este texto).