Capital de giro é a diferença entre o ativo circulante e o passivo circulante. Essa é a definição padrão para capital de giro, é uma conceituação correta, mas penso que é possível ir além na explicação, principalmente no seu uso em avaliação de empresas.
Para calcular o fluxo de caixa livre ao acionista,
partimos do lucro líquido, depois deduzimos os investimentos necessários, levando
ainda em conta os efeitos do financiamento com dívidas. Esses investimentos podem
ser em capital fixo (CAPEX) ou em capital de giro. Enquanto o primeiro é um
desembolso (um fluxo de caixa negativo), o segundo, como será mostrado, não é
exatamente uma saída de caixa.
Imagine uma empresa comercial que venda $ 1.000 em
produtos, ao custo de $ 500 e que ainda pague despesas de $ 200. Se toda a
produção fosse vendida e se as vendas fossem à vista assim como o pagamento das
despesas, então a geração de caixa seria igual ao lucro ($ 300, nesse caso).
Porém, na prática parte das vendas é realizada a
prazo, nem toda a produção é vendida e nem toda a despesa é paga imediatamente,
de forma que são criadas no balanço patrimonial as contas de Estoques e Contas
a Receber (lado do ativo) e Contas a Pagar (no passivo). Contas a Receber é
resultado das vendas a prazo, Estoques da não venda de todos os produtos (e
ainda a produção inacabada de mercadorias) e Contas a Pagar do diferimento do
pagamento de contas.
Imagine que um quarto das compras fosse recebido
apenas no próximo exercício, metade das despesas pagas também no próximo
exercício e que o estoque de produtos fosse de $ 80. Para simplificar o
argumento, os valores anteriores no balanço patrimonial eram nulos. Isso significa que a empresa recebeu $ 750,
pagou $ 580 no custo de mercadorias vendidas e das produzidas, mas não
vendidas, e ainda desembolsou $ 100 em despesas. Subtraindo custos e despesas desembolsados
da receita recebida sobra $ 70, ou seja, $
230 ficam “empatados” no capital de giro.
Esse é o valor da geração de caixa, que pode ser
usado para pagar dividendos aos acionistas ou investir em capital fixo.
Partindo do lucro líquido, tivemos lucro de $ 300 e investimento em capital de
giro de $ 230 resultando em fluxo de
caixa livre de $ 70. Em uma terceira visão, o capital de giro da empresa
aumentou em $ 250 no contas a receber, $ 80 nos estoques e reduziu em $ 100 no
contas a receber e totalizou aumento de $
230.
Dessa forma, o investimento em capital de giro é
uma espécie de investimento virtual, não algo que a empresa deve desembolsar, e
sim dinheiro que a empresa não tem como gastar a partir de sua geração de
resultados. O capital de giro reflete a parcela não-caixa do resultado do
exercício. Outra parcela não-caixa do resultado, depreciação e amortização, é
levado em conta no investimento em capital fixo, considerado por seu valor
líquidos (Investimentos – Depreciação – Amortização).
Para complementar, um breve exercício sobre como
uma melhor gestão do capital de giro pode aumentar o valor da empresa. Suponha
que a empresa pudesse fazer com que apenas 10% de suas receitas fosse recebida
a prazo sem que isso ocasionasse redução em vendas, que o estoque fosse de
apenas $ 40 (por uma melhor estimativa das vendas a serem realizadas, por
exemplo) e que 75% das despesas fosse paga apenas no próximo exercício. Sem
nenhuma mudança em receitas e custos, a empresa teria um fluxo de caixa livre
de $ 310, com um investimento em capital de giro negativo em $ 10. Essa
situação é um tanto extrema, mas ilustra o efeito da melhor gestão do capital
de giro, a liberação de caixa para poder ser investido em capital fixo
(ignorado nessa análise) ou distribuído para os acionistas.
No caso acima, o capital de giro é negativo e o
índice de liquidez circulante inferior a 1. Essa pode ou não ser uma situação
financeira perigosa, a depender de cada empresa. Indica que a empresa não
poderá pagar as contas que ficaram pendentes do exercício anterior apenas com o
que tem a receber de lançamentos efetuados no exercício anterior. Porém, se a
empresa consistentemente consegue adiar os seus pagamentos, essa situação pode
ser considerada normal e até positiva. Por outro lado, se adia os seus
pagamentos por conta da incapacidade de honrá-los em prazos menores, isso é indicativo
de problemas financeiros. Como mencionado, depende de empresa para empresa.
Essa é uma explicação mais intuitiva para o capital
de giro e, mais especificamente, para o investimento em capital de giro em avaliação
de empresas. Talvez não seja muito “ortodoxa” do ponto de vista da
Contabilidade, mas acredito que ajude a entender melhor esse conceito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário