Se a minha vida fosse uma série de TV, esse capítulo de hoje seria daqueles em que três situações se desenvolvem em paralelo, aparentemente sem conexão alguma, mas que no fundo se mostram unidas por um tema em comum.
O primeiro arco desta história é sobre o meu velho
computador, montado em 2014. Fiscalmente, computadores depreciam a 20% ao ano,
ou seja em 5 anos estariam 100% depreciados à taxa de 20% ao ano.
Contabilmente, no entanto, o ativo pode ter uma vida útil diferente e portanto
seria depreciado a uma taxa diferente daquela exigida pelo Fisco. Fiscalmente,
o computador já está 85% depreciado. Em meados do ano passado, quando a
depreciação acumulada seria de 75%, eu tenderia a discordar da estimativa de
vida útil porque não achava que o computador funcionava a 75% de quando eu o
comprei.
Na internet, há a expressão “Life comes at you fast”
e no meu caso foi: “Depreciation came at me fast” e já desde os últimos meses
do ano passado o computador passou a apresentar uma série de problemas, tela
azul, congelamento e reiniciações indesejadas se revezando. Está em um ponto em
que eu me questiono se o valor justo dele não seria 0% e não seria melhor jogar
fora e comprar um novo. Teimo em tomar qualquer decisão mais drástica, estou
tentando remediar, mas a situação parece só complicar, inclusive por ação
minha. Em particular, a memória RAM parece ser o problema. O programa de
diagnóstico do Windows não detecta nada, mas o Memtest sim e inclusive trava o
computador após algum tempo de análise. A melhor decisão seria trocar logo a
maldita memória RAM, mas são 4 pentes de 8 GB, não tenho muita condição de
trocar todos e teimo em não admitir usar apenas 8 GB. Pensava que o problema
poderia ser de software ou outro problema de hardware, o programa que analisa
tela azul diz que “é um típico erro de software” e eu teimo em não tentar nada
que me custe dinheiro. Outros problemas foram surgindo e agora estou com um
computador que trava do nada, o Chrome não funciona, outras coisas não funcionam
e está pior do que quando comecei a minha mais recente tentativa de
consertá-lo.
O segundo arco deste capítulo não me diz respeito
pessoalmente, mas é uma “treta” de internet que estou acompanhando. Trata-se de
uma Youtuber brasileira pega copiando o roteiro de canais estrangeiros. Não é
simplesmente falar do mesmo tema ou tendo as mesmas ideias, e sim falar as
mesmas coisas, na mesma ordem, repetindo incluindo piadas e comparações
estranhas. Tudo começou com um (1) caso de plágio, mas a situação foi se mostrando
mais complicada e agora já são 6 casos e contando, incluindo um vídeo
questionando se a criatividade na internet tinha acabado e um vídeo de anos
atrás. Dessa forma, é de se questionar se a pessoa fez algum conteúdo original.
Acompanho esse caso desde seu início e a situação
poderia ter sido resolvida logo de início com a Youtuber reconhecendo o seu erro
assim que confrontada pelo primeiro plagiado que descobriu o mau feito,
deletando o vídeo mencionado (e todos os outros que foram fruto de plágio) e
deixando a história morrer. Já me adiantando, o tema deste capítulo é
impairment, mas poderia ser gerenciamento de crises e sobre como é incrível que
a pessoa confrontada com a escolha de fazer a coisa certa, a menos errada, a
errada e a pior coisa possível, escolheu consistentemente a quarta opção. Se
fossemos fazer um diagrama de árvore de decisões e a quarta escolha abrisse um
ramo descendente, esse gráfico já estaria transbordando a parte de baixo da
folha. Não apenas a pessoa se recusou a admitir o que fez, mas está negando a
despeito de toda a evidência contra ela, evidência que qualquer pessoa com conhecimento
de português e inglês além de cérebro e ouvidos funcionais reconheceria como
irrefutável. Não apenas isso, está ameaçando pessoas que a criticam e tenta se
fazer de vítima, dizendo que está sofrendo ataques. De fato, muitas pessoas a
estão questionando, com maior ou menor grau de agressividade, mas tudo por
conta do fato de até agora não admitir os plágios cometidos. Aquele que
primeiro foi notificado que foi plagiado fez um vídeo contando sobre esse caso
e mostrando comparações que não deixam dúvida de que se trata de plágio. Agora
a bola está com a plagiadora, que pode enviar uma notificação de direitos
autorais para derrubar esse vídeo, o que me parece que seria uma péssima
decisão e poderia ter conseqüências drásticas que talvez ela nem calcule. Pelo
padrão visto até o momento, as chances de a pessoa se decidir nesse sentido são
bem grandes.
O terceiro arco da história é a única parte fictícia,
mas tomo a liberdade poética. Imagine que eu estivesse analisando uma empresa
com suspeitas de corrupção que requerem o impairment de ativos. Empresas que
estiveram em uma situação parecida são as estatais Petrobras e Eletrobras, que
realizaram elevadas baixas contábeis frutos da corrupção. Mas imagine nesse meu
capítulo fictício que a empresa resistisse a tomar essa decisão. Se tivesse
cortado o problema desde o início, nunca chegaríamos a tal crise, mas as baixas
não ocorreram logo de início e agora (ficticiamente) a empresa está em
confronto direto com o mercado. Se recusa a prosseguir com as baixas contábeis,
insiste que os demonstrativos contábeis refletem fielmente a realidade econômico-financeira
da empresa, passa a ameaçar jornalistas e analistas que tocam no assunto e se
diz vítima de perseguição. A essa altura, ninguém leva a sério os
demonstrativos contábeis da empresa e os analistas passam a se perguntar qual é
a real dimensão das baixas contábeis necessárias já que a própria empresa não
traz essa informação e passam a desconfiar de que tudo pode estar contaminado.
Neste ponto, o tema em comum já parece ficar claro
para o “telespectador”. Se quiser adicionar mais um elemento nesse já complexo
roteiro, imagine como pano de fundo o presidente da república sendo pego em uma
gravação admitindo, no mínimo, ser conivente com o pagamento de suborno e,
apesar da incontestável evidência, nega tudo. Em séries de tom mais otimista, o
final do capítulo é o desfecho positivo, mas no segundo e no terceiro caso tal
desfecho vem com um preço. A Youtuber e a empresa estão em uma situação de
descrédito total, ninguém em sã consciência acredita em nenhuma das duas e
questionamento são naturais. Depois de descobertos os maus feitos, a vida não
tem como seguir normalmente até que se reconheça os erros passados. A solução
para ambos os casos é o impairment: a Youtuber reconhece o seu erro, apaga
todos os vídeos afetados e promete não fazer mais isso; a empresa reconhece os
maus investimentos do passado, faz a baixa contábil transparentemente e segue
com a vida. Nos dois exemplos que eu dei, tanto a Petrobras quanto a Eletrobras
vinham cercadas de desconfianças e, entre outras coisas, deram baixas contábeis
em maus investimentos de forma a mostrar balanços mais condizentes com a
realidade. A melhora que as duas empresas tiveram não foi fruto apenas disso,
mas deve ser revigorante deixar para trás o passado vergonhoso e seguir em
frente para um futuro melhor. Tanto Petrobras quanto Eletrobras estão diante de
um horizonte muito mais róseo pela sua frente, e com as decisões certas a Youtuber
pode também deixar a sua atual situação e olhar para frente com mais confiança.
E o meu computador, do arco 1? Bom, ainda não estou
certo de que a melhor decisão é dar uma baixa contábil completa, mas, diferente
dos demais casos, ainda acredito que o ativo é recuperável. Espero não estar
passando pelo mesmo auto-engano da Youtuber e da empresa fictícia do arco 3.
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